Uma das obras mais famosas sobre a Guerra do Paraguai - Wikimedia Commons
Colunas

Guerra do Paraguai: Da senzala ao front de batalha

Decreto aprovado em caráter emergencial permitia a alforria de escravos em troca de serviço militar

M.R. Terci Publicado em 01/01/2020, às 08h00

Na história do mundo sempre existiram guerras. Fosse por territórios, ideais ou diferenças intelectuais, o homem constantemente lançou mão de recursos bélicos para fazer valer suas ambições. Dizem que guerra é inferno. Não sei especular sobre o inferno, mas, sem dúvida, a guerra é o que mais nos aproxima dele.

Para o ser humano, nenhum outro anseio é maior do que o desejo pela liberdade. Ninguém nasce para o grilhão ou o confinamento. Ser livre é desejo comum de todos e, talvez por isso, o direito de expressar qualquer opinião, agir, se relacionar, ter independência ou licença para ir e vir, permanecer ou ficar, seja uma das maiores motivações para calar fundo a baioneta no campo de batalha.

Eis então o problema. Não se faz guerra sem o mais precioso dos recursos: vidas humanas. Não se peleja, jamais se ganha território, não se esclarece a diferença, nem se chega ao prêmio sem soldados.

Em 1866, durante a Guerra do Paraguai, esse era o dilema do Império do Brasil.
Fora um ano particularmente difícil para os soldados no front. Quase dois anos haviam se passado, a situação das forças militares brasileiras era caótica. A invasão do desconhecido território paraguaio expôs nossas fraquezas. Terrenos pantanosos, tocaias constantes e alagamentos súbitos. Deslocar tropas era demorado, acima de tudo, custoso. Perderam-se milhares de vidas e o Exército brasileiro estava desfalcado e terrivelmente desarticulado.

Assim, para dar conta das baixas e fortalecer as linhas que ameaçavam desmoronar, o imperador propôs uma audaciosa, porém polêmica solução, que tocava no nervo mais vulnerável e sensível da época: a escravidão. Dom Pedro II sugeriu, então, uma lei que permitia a alforria de escravos em troca de serviço militar.

Apesar do grande receio dos conselheiros reais, que diziam ao imperador que as alforrias incentivariam a movimentação de escravos pelo país, fomentando fugas e sublevações pela abolição, e de todos os obstáculos colocados pelos senhores de escravos e fazendeiros, que argumentavam que tal libertação traria sérios transtornos para a agricultura nacional, o decreto número 3725/1866 foi aprovado em caráter emergencial, com a ressalva de se pagar indenização aos proprietários. Trocando em miúdos, os senhores vendiam seus escravos para o governo fazer guerra.

Nas senzalas e nas lavouras, cartas de alforria e uniformes começaram a chegar endereçados a homens que, repentinamente, se viram no dever de defender a pátria que até então lhes negava condição de gente. Em janeiro de 1867, os primeiros libertos da guerra foram encaminhados para o Exército e a Marinha do Brasil.

Forros e engajados como soldados, eles lutaram em pelo menos três dos quatro exércitos dos países envolvidos. O Corpo dos Zuavos da Bahia era um dos muitos batalhões formados exclusivamente por negros. O consenso entre muitos dos comandantes dos Aliados era de que aqueles homens de mãos calejadas e costas marcadas lutavam mais bravamente e com maior entusiasmo que os soldados brancos, porque lutavam por liberdade.


M.R. Terci é escritor e roteirista; criador de “Imperiais de Gran Abuelo” (2018), romance finalista no Prêmio Cubo de Ouro, que tem como cenário a Guerra Paraguai, e “Bairro da Cripta” (2019), ambientado na Belle Époque brasileira, ambos publicados pela Editora Pandorga.


+Saiba mais sobre a Guerra do Paraguai através de grandes obras

A batalha do Avaí, de Lilia Katri Moritz Schwarcz (2013) - https://amzn.to/3589Ru5

A Guerra do paraguai, Luiz Octavio De Lima (2016) - https://amzn.to/2REl15K

Guerra do Paraguai: Como Construímos o Conflito, de Alfredo da Mota Menezes - https://amzn.to/2RBa30Y

Vale lembrar que os preços e a quantidade disponível dos produtos condizem com os da data da publicação deste post. Além disso, assinantes Amazon Prime recebem os produtos com mais rapidez e frete grátis, e a revista Aventuras na História pode ganhar uma parcela das vendas ou outro tipo de compensação pelos links nesta página.

escravos História exército guerra História do Brasil Guerra do Paraguai dom Pedro II serviço militar alforria

Leia também

Bebê Rena: Veja 5 diferenças entre a série e a história real


O Caso Asunta: O que aconteceu com os pais de Asunta Basterra Porto


O Caso Asunta: Entenda o final da série da Netlix baseada em um caso real


Linha Direta: relembre o familicídio da família Gonçalves, tema de novo episódio


Adeus, Ayrton: Os detalhes emocionantes da morte de Senna


Quatro Dias com Ela: Veja a história real por trás do filme