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Os reis persas criaram a primeira grande potência global da Antiguidade

Texto Vinícius Cherobino Publicado em 01/06/2012, às 19h30 - Atualizado em 23/10/2017, às 16h36

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Relembre a história do Império Persa - Arquivo Aventuras
Relembre a história do Império Persa - Arquivo Aventuras

Um pequeno reino lutava para se livrar de seus opressores, os medos, onde hoje fica o Irã. Poucas décadas depois, seus habitantes, os aquemênidas, dariam início ao maior império conhecido até então, com um ritmo de expansão tão vigoroso que nenhum outro conseguiu se equiparar em toda a Antiguidade. Nada menos do que 8 milhões de km2 de extensão, controlando o Oriente Médio, a Turquia, o Cazaquistão e parte da Índia - o coração da humanidade à época.

Não, não se fala aqui dos romanos. O império de Júlio César, Trajano e tantos outros chegou a "apenas" 6 milhões de km2 de extensão. Os verdadeiros donos do mundo antigo, entre 550 e 336 a.C., foram os persas - e só não se tornaram ainda maiores porque foram barrados pelos gregos quando chegaram à Europa. O segredo do sucesso foi a combinação de excelência militar, grandes inovações de engenharia, descobertas tecnológicas e genialidade na administração pública e na diplomacia. E fazendo tudo, ou quase tudo, de maneira bastante diferente do que faziam os antigos conquistadores: no lugar da política de terra arrasada, os persas cooptavam as elites locais e respeitavam as crenças e os costumes dos povos conquistados..

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O surgimento do império

Depois do fim do Império Assírio, a região que vai da Ásia Central ao o norte da África e parte da Europa permaneceu dividida em pequenos reinos. Antigas potências, como o Egito e a Babilônia, não tinham força, paz interna ou interesse para retomar a expansão, situação semelhante a monarquias menores, como os lídios, os urartianos e os medos. Os próprios persas, vivendo perto do planalto da Mesopotâmia, não tinham muita possibilidade de crescer. Pior, viviam controlados com mão de ferro pelos medos, seus vizinhos do norte, que exigiam impostos exorbitantes e os dominavam com violência, segundo conta o historiador clássico grego Heródoto.

Até o surgimento de Ciro 2º, em 590 a.C., o monarca assumiu a liderança dos persas e preparou o contra-ataque. A revolta foi bem-sucedida e Astíages, o rei dos medos, foi derrotado (há uma lenda de que seu exército desertou ao ver o futuro imperador, neto do rei destronado). Ciro logo deu início ao plano de criar um império. Poupou Astíages e o deixou em sua corte como administrador. A decisão mostrava um rei diferente - Ciro 2º não matava indiscriminadamente e também não escravizava os conquistados. Seu modo de governar mantinha as elites locais. Esse modelo, que respeitava as diferenças culturais dos povos conquistados, transformou a Pérsia no primeiro império multicultural da História. A prática foi seguida pelos sucessores de Ciro. E, mais tarde, até pelos inimigos dos persas, como Alexandre, o Grande.

Guarda real persa: Respeito aos costumes dos povos conquistados

Ciro 2º passou a acumular campanhas bem-sucedidas, como a conquista da Lídia, no leste da atual Turquia, e de cidades-estado gregas na Jônia. O ponto alto foi a vitória sobre a Babilônia: Ciro tornou-se um dos raros monarcas estrangeiros a ter seu nome citado na Bíblia de forma positiva. "Foi de Ciro 2º a decisão de libertar os judeus na Palestina depois do exílio na Babilônia. É por isso que os escritores do Velho Testamento se referem ao rei persa como uma ferramenta de Javé", diz Josef Wiesehöfer, da Universidade de Kiel, na Alemanha, autor de Ancient Persia (Pérsia Antiga). Para comemorar a glória do império, Ciro 2º deu início à construção da capital, Pasárgada, mas, ao enfrentar nômades perto do atual Cazaquistão, morreu em batalha. O Império Persa poderia ter acabado aí.

O filho e sucessor de Ciro, Cambises 2º, manteve o que já havia sido anexado e foi além ao realizar o sonho do pai: a conquista do Egito. "A capacidade de absorver o conhecimento dos conquistados ajudou, mas, no final, o fator mais importante para a criação do império foi a liderança de Ciro 2º e de Cambises", diz John W. I. Lee, da Universidade da Califórnia. O traço mais importante do império está na maneira pela qual povos conquistados eram tratados. Ciro e Cambises, claro, poderiam cometer atrocidades como os antigos monarcas - assassinatos em massa ou desmembramentos de rivais faziam parte das conquistas. Heródoto conta que Ciro 2º assassinou Croesus, o rei da Lídia (o segundo grande reino conquistado pelos persas). Pactias, um líder rebelde de lá que se revoltou, foi enviado à Pérsia para ser morto após sofrer uma série de torturas.

O império consolidado

A sucessão familiar garantiu estabilidade, mas teve um efeito colateral nefasto: jogou irmão contra irmão. Depois da vitória no Egito, Cambises descobriu que seu irmão caçula, Bardiya (ou alguém se passando por ele), tinha liderado uma revolta na Pérsia. Voltando da África em disparada, morreu em circunstâncias misteriosas. Bardiya assumiu o trono em 521 a.C., mas mal esquentou o lugar. Foi emboscado por nobres e morto no mesmo ano.

Um dos assassinos, Dario, que pertencia à família real, ascendeu ao trono. No poder, assumiu um perfil diferente dos seus predecessores - em vez de conquistas em série, a consolidação do império. A primeira tarefa era militar: o esmagamento de rebeliões e o controle da imensa fronteira. A segunda era bem mais complexa: aperfeiçoar o sistema político para evitar as revoltas, abrir espaço para novas expansões e mostrar a grandeza dos persas. Nesse papel, ninguém teve tanto sucesso na arte de governar quanto Dario. Construiu duas novas capitais - Persépolis e Susa -, ambas descritas como maravilhas arquitetônicas.

"Susa e Persépolis funcionam como prova da grandeza imperial, como se o rei estivesse dizendo que era capaz de mobilizar trabalhadores, materiais e artistas de todo o mundo para dar expressão arquitetônica, iconográfica e textual à ideia da grandeza persa", afirma Joaquín Muñoz, da Universidade Internacional de La Rioja, na Espanha.

As construções de Dario não são apenas simbólicas. É durante seu reino que se espalha a rota imperial - estradas de pedra com entrepostos com alimentação e hospedagem a cada 29 km, com 2,5 mil km de extensão. A logística que acompanhou a criação das estradas foi revolucionária. Sem contar os benefícios do comércio e para o transporte de cargas e pessoas, a rota imperial auxiliava a comunicação - uma mensagem que antes levava meses passou a circular em dias de uma ponta a outra do gigantesco império. As rotas criaram uma arma militar: tornaram possível a realização de ataques simultâneos em vários fronts.

Dario estabeleceu sátrapas, governadores dos reinos conquistados, nas 23 unidades do império e criou um imposto oficial. Com tais passos, manteve contentes as elites locais com cargos e poder. Esse era um dos motivos pelo qual ele se denominava rei dos reis - epíteto que demonstra tanto a sua grandeza quanto a importância que os persas davam a quem haviam subjugado.

Uma das maiores sacadas de Dario foi se aproveitar das religiões espalhadas pelo império. A estratégia vinculava reis persas com deuses locais. Além de manter os templos intocados e de aceitar títulos religiosos locais, Dario espalhava relevos pelo império. Neles, havia a descrição de batalhas e a história pessoal de Dario em várias línguas - além de um agradecimento à divindade local. Algo como: "Venci essa batalha com ajuda do deus fulano". Quem poderia se revoltar contra um rei que agradecia o mesmo deus que o seu? E ainda recebia bênçãos dele? "Os persas foram muito bem-sucedidos em transformar uma dominação forte em algo tolerável", afirma Josef Wiesehöfer. "Os postos militares mais altos estavam nas mãos dos persas, mas eles facilitaram a colaboração com as elites dos países subjugados, dando uma boa dose de autonomia e vinculando os reis persas aos vários deuses locais."

O reinado de Dario durou 35 anos. Antes de deixar o trono, tentou conquistar a Europa depois de se dirigir à Grécia para acabar com a revolta jônica, apoiada por Atenas e Esparta. Irritado com os gregos, Dario decidiu atacar Atenas. Para cruzar o estreito de Bósforo com seu exército e cavalaria, ordenou um uso heterodoxo para a frota persa - uma ponte de barcos. De acordo com Heródoto, foram emparelhados centenas deles, que suportaram a passagem de 70 mil homens. Dario conquistou a Macedônia, mas não avançou pelo continente. Os gregos venceram aproveitando a armadura mais forte, o escudo e as lanças de bronze dos hoplitas. Depois da derrota, Dario bateu em retirada, mas não chegou a Persépolis. Morreu no trajeto. A morte de Dario abriu caminho para seu filho Xerxes. Diferentemente do que crê a imaginação popular (com a ajuda de Hollywood), Xerxes foi um grande líder militar. E ele não era gigante nem se parecia com Rodrigo Santoro. A Batalha de Termópilas, contra o rei de Esparta, Leônidas, e seus 300 soldados, esteve longe de marcar o fim dos persas. "Do ponto de vista persa, Termópilas foi um gigantesco sucesso militar", diz Amélie Kuhrt, do University College de Londres. "Xerxes foi um rei muito bem- sucedido e o Império Persa continuou a existir com muita saúde por mais 150 anos."

O que garantiu a independência da Grécia foi a batalha naval de Salamina, em que a poderosa frota persa foi derrotada por velozes navios gregos. Pela primeira vez, os planos de expansão dos persas chegaram a um beco sem saída. Nem Xerxes e nenhum outro dos 8 imperadores seguintes conseguiram dominar a Europa. Os gregos ficaram com a fama de terem barrado o avanço e impedido que a civilização ocidental, ainda no berço, tivesse um fim prematuro. O golpe de misericórdia veio em 336 a.C. Alexandre, o Grande, da Macedônia, que havia conquistado as outras cidades-estado gregas, chegou às portas do Império Persa. Cinco anos depois, Persépolis foi incendiada. Mas Alexandre conhecia o relato dos historiadores sobre os reis persas e ampliou suas conquistas absorvendo conhecimentos locais e construindo estruturas de governo apoiadas nas elites derrotadas. Foi o legado dos persas ao Ocidente.

A nação fechada dos aiatolás iranianos

Aregião da Pérsia, berço do primeiro império multicultural da humanidade, abriga hoje o Irã, um dos países mais fechados do mundo. A região, depois dos reis aquemênidas, foi invadida por macedônios, turcos e mongóis, converteu-se ao islamismo, pelo ramo xiita, e foi dominada pelos britânicos, já no século 20. Eles apoiavam o xá (soberano) Reza Pahlevi, que chegou ao poder na 2ª Guerra. O xá tornou-se ditador e perseguiu a oposição e o clero xiita - até ser derrubado por uma revolução em 1979, que juntou esquerdistas, liberais e religiosos, sob o comando do aitolá Ruhollah Khomeini, então exilado em Paris. Uma vez no poder, o aitolá criou um regime teocrático que está entre os mais estranhos da Terra aos olhos ocidentais: as mulheres são obrigadas a usar véu e uma Guarda Revolucionária zela pela manutenção dos preceitos do Corão, do século 7. É comum cenas em que crimes são punidos com chibatadas em praça pública. Em 2006, Sakineh Ashtiani foi condenada à morte por apedrejamento, acusada de adultério - a pena ainda não foi cumprida, mas gerou forte reação internacional. O Irã frequenta as manchetes por causa de seu programa nuclear, que resiste às inspeções internacionais e pode levar à construção de uma bomba atômica, e por seu governo, que se recusa a reconhecer a existência de Israel.

Saiba mais

LIVRO


Ancient Persia, Josef Wiesehöfer, I. B. Tauris, 1998

The Persian Empire, Lindsay Allen, University of Chicago Press, 2005