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O Stálin das fotos de família

Duas biografias recém-lançadas mostram olado humano e íntimo da vida do líder soviético elevantam a hipótese de ele ter sido envenenado

Heloísa Gomyde Publicado em 01/05/2006, às 00h00 - Atualizado em 23/10/2017, às 16h36

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Aventuras na História - Arquivo Aventuras
Aventuras na História - Arquivo Aventuras

Ele tinha um braço bem menor que o outro e uma doença de pele salpicava-lhe manchas pelo corpo. Ao andar, as pontas dos pés voltavam-se para dentro. Além disso, ele nasceu com o segundo e o terceiro dedos do pé esquerdo grudados. Facetas de seu comportamento sugerem uma personalidade desajustada. Só dormia em cadeiras ou divãs e, à mesa, era capaz de jogar cascas de laranja no prato do vizinho – arroubos infantis que não o impediram de ordenar a morte de, calcula-se, 20 milhões de pessoas. “Dizem que sou um monstro, mas, como você pode ver, faço piada com isso. Talvez não seja tão horrível, afinal”, disse, certa vez, Josef Stálin, que governou a União Soviética entre 1924 e 1953.

Dois livros recém-lançados no Brasil almejam mostrar o homem por trás do ditador. Um Stálin Desconhecido, dos gêmeos Zhores e Roy Medvedev, e Stálin – A Corte do Czar Vermelho, de Simon Sebag Montefiore, contam segredos guardados nos arquivos do Partido Comunista até 1991. Troca de correspondências, documentos e anotações devassam a vida dos que dirigiram o Kremlin por décadas, a despeito de todo o esforço empreendido para que essas histórias jamais viessem a público.

As duas biografias levantam a hipótese de que o líder soviético tenha sido envenenado. Colabora com ela o fato de que a versão oficial da morte de Stálin foi falsificada. Ele morreu em sua casa de campo de Kuntsevo, e não no Kremlin, como foi divulgado. Também causa estranheza a demora para que médicos fossem chamados a partir do momento em que foi encontrado – mais de dez horas. A hipótese perde força, porém, quando se leva em conta que não havia camarada articulado o suficiente para emergir como sucessor natural – Nikita Kruchev foi alçado à liderança aos poucos. E, segundo os biógrafos, Stálin, embora hipocondríaco, pode ter negligenciado a saúde: mandou prender o médico que havia lhe recomendado descanso, por achar que o conselho era parte de uma conspiração. Oficialmente, o ditador foi fulminado por um derrame, em março de 1953.

As biografias mostram também que Stálin tinha uma vida familiar confusa. Não falava sobre o pai, a primeira mulher suicidou-se, só se dava bem com a filha quando ela era criança. Já no poder, visitou a mãe, Yekaterina, poucas vezes. Numa, como ela não compreendia a profissão do filho, Josef disse: “Lembra do czar? Pois é, sou uma espécie de czar”. A mãe respondeu: “Você teria feito melhor se fosse padre”.

Confusão no lar

Com a filha Svetlana, nos anos 30: Stálin tinha relações familiares complicadas, a começar por suas origens, sobre as quais ele não falava. O pai, Vissarion, era agressivo e beberrão e foi expulso de casa quando Stálin era criança

Raras visitas

A mãe, Yekaterina (à esq.), teve de lavar roupas para sustentar o filho. Já no poder, Stálin nunca a convidou para conhecer Moscou – ela morava na Geórgia, com empregados.

Poção mágica

Também no começo dos anos 30, caçando, hobby do qual não gostava tanto – preferia jardinagem. Hipocondríaco, Stálin tinha outra mania: bebia água de regatos glaciais como se fosse uma poção mágica.

Homem letrado

Ele governava com a família e os amigos ao redor e lia muito: era capaz de devorar 500 páginas por dia e tinha uma biblioteca com 20 mil livros. “Se quer conhecer as pessoas a sua volta, descubra o que elas lêem”, dizia.

Entrevista

História – Qual foi sua maior surpresa durante a pesquisa?

Simon Montefiore – Não houve só uma coisa, passei o tempo todo muito entusiasmado. Os novos materiais eram muito ricos em todos os aspectos da vida de Stálin. Essas descobertas vão mudar a forma como os historiadores escreverão sobre Stálin no futuro.

Existe alguma resposta sobre Stálin que você ainda não encontrou?

Stálin foi um homem muito reservado. Há muitas perguntas que eu gostaria de fazer para ele, mas minhas questões seriam mais filosóficas. Stálin foi um estadista talentoso e inteligente, um discípulo fanático do marxismo. Ele acreditava que matar fazia parte da política e sacrificava família, amigos e amores por crueldade política. Foi um dos mais bem-sucedidos conquistadores de todos os tempos. Mas, acima de tudo, ele foi um assassino que instaurou mais sofrimento e morte do que qualquer outro, exceto Hitler.

Saiba mais

Livros

Um Stálin Desconhecido, Zhores e Roy Medvedev, Record, 2006

Stálin – A Corte do Czar Vermelho, Simon Sebag Montefiore, Companhia das Letras, 2006