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Curiosidades / Brasil

Democracia abalada: Saúde de Tancredo Neves expôs fragilidade política do Brasil

Com João Figueiredo ainda no poder, Tancredo mostrava alerta com lição aprendida com Vargas: “No Brasil, não basta vencer a eleição, é preciso ganhar a posse!”

André Nogueira Publicado em 10/05/2020, às 10h00 - Atualizado em 10/11/2022, às 11h04

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Tancredo Neves - Agência Senado
Tancredo Neves - Agência Senado

Tancredo Neves foi um dos mais marcantes políticos da história brasileira. Passando pelo governo Vargas, pelo Parlamento após o primeiro golpe contra Jango, foi quadro central do MDB e, finalmente, por eleição indireta durante o processo de abertura da Ditadura Militar, eleito presidente. Aliado ao projeto da Aliança Democrática, ele se relacionou com a dissidência da ARENA e colocou o ex-UDN José Sarneyno cargo de vice.

Porém, diante da crise e das incertezas da passagem de João Figueiredo para uma autoridade civil no governo, Tancredo morreu por conta de uma complicação cirúrgica pouco tempo antes de sua posse, em 1985, devido a uma infecção generalizada no combate a um possível tumor.

A morte de Tancredo Neves possui um forte elemento conspiratório, sendo que muitos acreditam que ele foi deliberadamente assassinado. Figura polêmica, associado essencialmente à luta pela democracia, mas marcado pela conciliação com medidas golpistas, ele deixou sua marca na História e, principalmente, no povo, que tem em sua figura uma confiança gigantesca.

Conheça 5 fatos importantes sobre a doença que matou Tancredo Neves.

1. Mal de tempos

No dito popular, Tancredo morreu do famoso “nó nas tripas”, ou seja, um mal gerado por obstruções no trato intestinal causado por uma infecção em meio a uma cirurgia no Hospital de Base de Brasília.

As suspeitas de assassinato foram muitas, e até de que seu mal fora inventado, porém, isso não poderia ser verdade. Tancredo sofria com efemeridades ligadas aos problemas digestivos há mais tempo.

Velório oficial de Tancredo / Crédito: Senado Federal

O presidenciável teria começado a sofrer com dores no abdômen desde junho de 1984, mais de um ano antes da complicação. É relatado que desde essa época, o político sofria com mal-estar e dores na barriga.

Seu neto e também político Aécio Neves foi um dos responsáveis por acompanhar o consumo de antibióticos e analgésicos anti-inflamatórios, antes do quadro piorar. A crise que o obrigou a ser internado só ocorrera sete meses depois das dores mais agudas.


2. Erros médicos?

Após a internação do eleito presidente na UTI, em Brasília, a equipe responsável pela preparação e para a cirurgia de Tancredo cometeu uma série de tropeços e erros. Já no começo, houve uma discussão, que se estendeu além do tempo esperado, para saberem onde seria o local mais apropriado para a realização da cirurgia.

Tancredo doente / Crédito: Getty Images

Além disso, registra-se que mais de 30 pessoas ocupavam a sala de cirurgia durante o procedimento, fato que pode aumentar o risco de infecção do paciente.

Finalmente, quando foi anunciado o final da cirurgia, declarou-se que ela fora um sucesso, com a divulgação do laudo descrevendo a remoção de um divertículo, coisa que diminuiria a gravidade da situação.

Porém, o dado era mentiroso: na verdade, fora retirado um tumor de seis centímetros do intestino, sem conhecimento da família (que os médicos disseram estarem cientes e de acordo com tudo). Segundo o médico Élcio Miziara, autor da biópsia, o falso laudo foi feito para não causar pânico, mas fato é que tudo deixou o caso ainda mais suspeito.


3. Coração de Estudante

Tancredo era muito popular no país e, principalmente, em sua terra natal, Minas Gerais. Seu estado também é berço de uma das conjunturas artísticas mais icônicas do Brasil: o Clube da Esquina e, especialmente, Milton Nascimento.

Foto de Tancredo Neves / Crédito: DarwIn via Wikimedia Commons

Seu principal parceiro musical, Wagner Tiso, compôs uma música em 1983 chamada Coração de Estudante, originalmente em homenagem a outro mineiro da política: o senador símbolo das Diretas Já!, Teotônio Vilella.

Porém, na voz de Milton, a canção se tornou uma espécie de hino patriótico em homenagem a Tancredo, que declaradamente amava Coração de Estudante.

Com o anúncio da doença do político, a música passou a circular pelo país como forma de louvação e pedido de melhora para o presidente eleito. Sua melodia era constantemente reproduzida nas rádios e cantarolada pelas ruas nos anos 1980.


4. Posse em risco

Mesmo conhecendo suas efemeridades, Tancredo Neves decidiu, ainda em campanha, não anunciar a doença, nem se permitir entrar na sala de cirurgia. Seu maior medo era que a Linha Dura do regime militar impedisse a passagem do poder a Sarney no caso de alguma complicação que o impedisse de assumir.

Posse de Sarney / Crédito: Agência Senado

Segundo ele, a regra para as transições teria sido explicada por Getúlio Vargas a ele: “no Brasil, não basta vencer a eleição, é preciso ganhar a posse!”.

Então, Tancredo decidiu que só anunciaria publicamente sua doença no dia da posse como presidente, marcada para o dia 15 de março daquele ano, quando já estivesse prontamente em Brasília.

Sua preocupação em conter uma ruptura política, porém, não se concretizou: mesmo com sua morte, as pressões sobre os militares não permitiram que Sarney fosse golpeado.


5. Foto mórbida

Antes da crise que levou o presidente ao hospital, tentou-se impedir a divulgação de que o político estava mal — principalmente para cessar mobilizações e comoção naquele cenário instável.

Em 1985, então, o fotojornalista Gersávio Batista, que voara para Brasília para captar imagens do presidente no pós-cirurgia, foi indicado para divulgar imagens que tranquilizassem o país.

Então, cercado de médicos, Tancredo Neves foi retratado com a cabeça meio caída, sentado em sua casa. O intuito era criar um ar de alto-astral, como se ele tivesse se recuperando. Porém, o efeito foi contrário: mórbido e cadavérico, o rosto frio do presidente não enganou ninguém.

A fotografia só impulsionou mais boatos sobre a conspiração, sendo que muitos acreditavam que ele já havia falecido. Ainda não estava morto, mas claramente ele não estava bem: três horas depois, Tancredo estava indo em direção ao hospital, em crise hemorrágica.