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Curiosidades / Brasil

O ateu, com fama de comunista, que inventou o Guaraná Jesus

Mais lidas do ano: Um dos farmacêuticos mais populares e polêmicos que já passou por São Luís, viu sua invenção se popularizar e torna-se símbolo de seu estado de origem

Fabio Previdelli

por Fabio Previdelli

fprevidelli_colab@caras.com.br

Publicado em 30/11/2019, às 07h00 - Atualizado em 26/12/2022, às 13h20

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Jesus Norberto Gomes, o criador do Guaraná Jesus - Domínio Publico e Divulgação
Jesus Norberto Gomes, o criador do Guaraná Jesus - Domínio Publico e Divulgação

Com uma personalidade única e de origem humilde, pouco a pouco ele ficou cada vez mais popular e adorado. Tem a cara de seu povo, se tornou a representação de toda uma cultura. Uma verdadeira febre, quase que uma religião. Paulatinamente, Jesus tem conquistado um espaço maior nas casas e nos corações do povo brasileiro. Afinal, cativa como ninguém.

Só que ele é diferente de todos os outros. Não faz distinções, usa rosa e azul e é par ideal para qualquer ocasião. Adocicado, com um quê de cravo e canela. Companhia perfeita para aquele bolo da tarde ou até mesmo uma boa tapioca. Sua cor rosada é inconfundível. Guaraná Jesus é único. E por isso tornou-se símbolo do Maranhão.

Jesus ateu e comunista

Apesar do nome, seu inventor não era nem um pouco religioso, muito pelo contrário, Jesus Norberto Gomes era declaradamente um ateu. Como se não bastasse tamanha contradição, o rapaz ainda tinha fama de comunista.

Nascido em Vitória do Mearim, no Maranhão, em 1891, se mudou aos 14 anos para a capital do estado em um busca de um emprego. Sua primeira oportunidade não demorou surgir, foi trabalhar na farmácia Marques. Aos 20 anos, se tornou empreendedor e abriu a farmácia Galvão. Não sabia, mas aquele momento mudaria sua vida para sempre.

Noberto Gomes tinha o hábito de batizar suas invenções como forma de homenagear uma das pessoas mais importantes de sua vida: ele mesmo. Foi assim como o Antigripal Jesus, o Xarope Peitoral Jesus e a Jesulina Pasta Dentifrícia. Dessa mesma forma foi com o Guaraná Jesus, criado em uma seção de águas gasosas e refrigerantes, algo que era comum nas farmácias da época.

No entanto, a primeira versão do produto não agradou tanto assim. O gosto levemente amargo não caiu nas graças do público. Mas como bom brasileiro e maranhense, ele não desistiu nunca e continuou buscando novas alternativas para sua fórmula de sucesso.

Desta vez, ele havia acertado em cheio, o novo sabor fez sucesso imediato com os netos de Jesus e logo se tornou um fenômeno por toda a região. A fórmula da bebida gaseificada era toda feita à base de extratos vegetais. Até mesmo o corante do refrigerante era natural.

Explorador da natureza

Em entrevista a revista Piauí, em 2007, Fábio Gomes, neto de Jesus, revela que seu avô era pioneiro em explorar as maravilhas naturais da Amazônia. Ele fazia expedições e sempre trazia ervas da floresta.

Antes de todo mundo começar a falar em biodiversidade, ele já achava que o grande tesouro farmacológico do mundo estava na selva amazônica”.

Fábio também garante que o avô tinha uma visão à frente em relação aos direitos trabalhistas: “Quando ninguém falava em participação dos funcionários, meu avô dava participação nos lucros da farmácia”, diz orgulhoso.

Esse, entre outros motivos, fez com que surgisse o boato de que Jesus era comunista. Em novembro de 1935, Norberto Gomes e outras oitenta pessoas acabam tendo suas prisões decretadas em decorrência da Intentona Comunista. O grupo foi levado até o Rio de Janeiro e permaneceu lá até o ano seguinte.

Fábio ainda guarda uma cópia da carta-testamento que o avô escreveu a punho em 1958, na qual ele pedia um funeral modesto e determinava que a diferença entre os custos das exéquias baratas e mais caras fosse doada ao Partido Comunista.

Jesus dizia: “Não fui e não sou socialista, infelizmente, porque seria um idealista. Como pequeno-burguês tenho defeitos, mas sou admirador sincero desse regime verdadeiramente humano, onde pode ser obtida a verdadeira democracia”.

Em 1961, a família de Jesus vendeu a fábrica própria para a então Cervejaria Antárctica Paulista. Mas uma briga judicial — motivada pela acusação contra a fabrica por adulterar e boicotar a venda do produtor — fez com que o contrato fosse rompido anos depois.

Jesus Norberto Gomes faleceu dois anos depois, em 1963, e por obra do destino, não presenciou o produto que inventou proporcionar seu maior acordo comercial. Em 1980, a família Gomes vendeu a marca à antiga Companhia Maranhense de Refrigerantes, que na época era franqueada pela Coca-Cola Brasil no estado.

Jesus, uma identidade cultural

Já em 2001, o Guaraná Jesus foi adquirido pela multinacional e passou a fazer parte do portfólio da empresa. Mas, desta vez, o refrigerante teve sua identidade e seu sabor característico preservados, mantendo assim a identificação cultural local do produto.

Os elementos gráficos do rótulo remetem à própria cor do guaraná, já o logotipo escrito “Jesus” é a singular assinatura de seu criador.

“Manter os aspectos tradicionais da bebida foi um compromisso assumido pela Coca-Cola Brasil diante da família do criador da marca, Jesus Norberto Gomes, ao adquirir a marca em 2001", garante Rodrigo Assunção, diretor de Marketing e Planejamento Estratégico da Solar.

Todas suas características originais foram mantidas, e o produto que você bebe hoje é o mesmo que era bebido há 89 anos”, afirma. 

Em 2008, a Coca-Cola criou uma campanha para os que consumidores escolhessem a nova identidade visual das embalagens do Guaraná Jesus por meio do voto popular. Dentre as três opções, o modelo selecionado foi aquele que remete aos azulejos coloniais portugueses de São Luís.

A ideia foi um sucesso de público e crítica, tanto que a empresa ganhou medalha de ouro de Melhor Estratégia de Marketing no Prêmio Internacional de Excelência em Design (IDEA).

Antes engarrafado somente em São Luís e distribuído em três estados: o próprio Maranhão, Piauí e Tocantins; agora, o Guaraná Jesus ganhou outras praças. Desde 2016 passou a ser vendido em São Paulo, Minas Gerais, Paraná e Brasília.