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O sonho de Casemiro: entenda a importância da criação do Instituto de Tecnologia de Aeronáutica, o ITA

Um dos mais importantes idealizadores da história brasileira é, sem dúvidas, o Marechal Casimiro Montenegro Filho

Coluna - André Nogueira, historiador Publicado em 06/04/2021, às 08h00

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Imagem meramente ilustrativa - Imagem de Free-Photos por Pixabay
Imagem meramente ilustrativa - Imagem de Free-Photos por Pixabay

Se o Brasil passou de um país totalmente dependente, a nação de crescimento mais rápido do mundo nos anos 1950, isso foi resultado de desmedidos esforços na mudança do eixo econômico do país, ou seja, a industrialização proporcionada após a Revolução de 1930.

Porém, esse movimento não é resultado de um trabalho único de Vargas: foram necessárias as mais diversas iniciativas e idealizações, das classes populares e de órgãos estatais, em busca da independência concreta do Brasil. Um dos mais relevantes desses idealizadores, sem dúvidas, foi o Marechal Casimiro Montenegro Filho, o mais importante aeronauta de nossa História.

Montenegro compreendia que o desenvolvimento nacional passava, pelo menos, pela autonomia profissional e pela integração territorial. O segundo tópico, preocupação central do governo revolucionário, já seria apontado quando o militar era apenas tenente, em 1931, e comandou a criação do Correio Aéreo Militar, primeira experiência de sistema articulado para acessar os rincões mais afastados do país.

Porém, a experiência com o Correio Aéreo destacou a Casimiro uma das principais deficiências brasileiras da época: a ausência de profissionais qualificados para a produção em larga escala de aeronaves nacionais. Ou melhor, sua desarticulação, uma vez que o potencial produtivo brasileiro era gigante e inutilizado, uma vez que muitas de suas cabeças já viviam no estrangeiro: o país poderia ser uma potência aeronáutica, mas sequer conseguiria ter uma Força Armada sem importações. Portanto, na visão do militar, “Antes de produzirmos aeronaves, precisamos produzir engenheiros”, e essa não seria uma missão fácil.

O marechal Casimiro foi, desde cedo, um homem integrado às questões sociopolíticas. Ingressou na Revolução em 1930, participou da resistência ao levante paulista reacionário de 1932. Nesse tempo todo, esteve presente em articulações institucionais que o levaram a ser pai do Correio Aéreo e de mais alguns órgão que foram gestados em suas experiências internacionais nos anos 1940, quando, tenente-coronel, descobriu a indústria aeronáutica estadunidense e o Massachusetts Institute of Technology (MIT), onde conheceu o professor Richard Smith.

Foi nessa instituição civil que o Marechal-do-ar viu inspiração para seu sonho, como militar progressista e nacionalista, de criar uma escola de ponta para formação de engenheiros e, com isso, quebrar com a dependência econômica e cultural do país em relação a aeronaves e transportes.

Porém, ao contrário do que se espera das grandes mentes do terceiro mundo, Casimiro não viu como opção manter-se nos EUA para melhorar sua formação, mas convocou uma série de pesquisadores altamente qualificados, organizados pelo prof. Smith para se mudarem para o Brasil e iniciarem lá a formação de novos profissionais, em território, língua e direitos brasileiros.

Com isso, foi o Brasil que se apropriou do capital intelectual encontrado pelo militar, criando algumas das instituições de engenharia mais prestigiadas do mundo, o ITA e os departamentos científicos da FAB.

Mesmo antes do nascimento do ITA, em 1950, o sonho de Casemiro, um dos primeiros formados pela Escola Técnica do Exército, já era liderado pelo Centro Técnico da Aeronáutica (atualmente Departamento de Ciência e Tecnologia Aeroespacial, DCTA, fundada pelo próprio Montenegro).

A criação deste órgão de pesquisa da Força Aérea era a realização de um antigo projeto de Santos Dumont e foi a partir dele que a FAB se tornou referência internacional em produção tecnológica, atingindo seu ápice com o ITA e a Embraer.

Em 1950, em São José dos Campos, foi finalmente fundado o Instituto de Tecnologia de Aeronáutica, órgão vital do projeto de autonomia técnico-científica do país. Casimiro tornou-se o primeiro diretor e, com isso, passou a sofrer impasses com um velho amigo de caserna, Eduardo Gomes, reacionário e atual patrono da Força Aérea.

Isso porque a lógica de uma instituição científica cuja produção é patrimônio nacional era vista como um gasto financeiro exagerado e um desvio de esquerda.

Gomes queria um ITA inspirado na Aeronáutica estadunidense, com departamentos científicos respondiam apenas à Força Armada, e a sociedade civil não desfrutava diretamente de seus avanços.

No livro de Fernando Morais, Montenegro – As aventuras do marechal que fez uma revolução nos céus do Brasil, é descrita a relação de tensão e proximidade entre os aeronautas. Acontece que Montenegro acabou por sofrer diretamente pelas mãos de seu amigo de direita.

Líder dos movimentos contra Vargas e JK, Gomes tinha influência no círculo militar e, ao sustentar o Golpe de 1964 e se tornar Ministro da Aeronáutica de Castelo Branco, integrou o comando da repressão e da limpa ideológica ocorridas nas Forças Armadas no início do regime.

Na tentativa de minar o ITA em favor de interesses estrangeiros, Eduardo Gomes retirou Casimiro Montenegro da liderança da instituição, que passou a focar a produção na própria FAB, perdendo o espírito republicano de ver o progresso científico como patrimônio nacional, ou seja, de todos. Apenas com os governos civis, o ITA voltou a se dirigir a um público nacional.

A atuação da Ditadura para com o ITA e o Marechal Casimiro, falecido em 2000, é demonstrativo de como a instituição é de importância fulcral e, portanto, foi alvo do reacionarismo entreguista.

Prova da relevância dessa escola e da manutenção do sonho do marechal de tornar o Brasil uma potência dos céus é o fato dela, junto com o atual DCTA, terem sido embriões da brasileira Embraer, reconhecida produtora de aviões e afins e que é, hoje em dia, a terceira maior construtora de aeronaves do mundo, uma das mais prestigiadas nos EUA e Europa, e dona do avião mais cobiçado do planeta, o KC-390.


André Nogueira é historiador formado pela USP. 


**A seção 'Coluna' não representa, necessariamente, a opinião do site Aventuras na História.