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Notícias / Brasil

Acusado de omitir tortura em laudo na Ditadura, ex-legista torna-se réu

José Manella Netto teria assinado, em 1969, um documento que atestava o suposto suicídio de Carlos Roberto Zanirato. Entenda!

Pamela Malva Publicado em 05/11/2021, às 09h00

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Militares na Avenida Paulista, em 1968 - Correio da Manhã / Arquivo Nacional / Domínio Público, via Wikimedia Commons
Militares na Avenida Paulista, em 1968 - Correio da Manhã / Arquivo Nacional / Domínio Público, via Wikimedia Commons

Em meados de 1969, José Manella Netto trabalhava como legista em São Paulo e assinava atestados de dezenas de mortes. Nesta semana, ele tornou-se réu por falsidade ideológica e ocultação de cadáver após omitir a causa da morte de Carlos Roberto Zanirato, militante submetido à sessões de tortura durante a Ditadura Militar.

Segundo divulgado pelo O Globo, o ex-médico legista teria assinado, junto do também legista Orlando Brandão, o atestado de óbito do militante. No documento, os especialistas afirmaram que Carlos Roberto teria cometido suicídio ao saltar na frente de um ônibus no meio da Avenida Celso Garcia, localizada na zona leste de São Paulo.

Acontece que, com o passar dos anos, verificou-se que o militante político foi atirado na frente do veículo. Isso porque relatórios da Marinha encontrados durante as investigações revelaram que ele estava algemado no momento em que morreu, o que contraria a versão dada pela polícia na época — de que ele teria fugido antes de morrer.

Diante dessas informações, então, o procurador da República Andrey Borges Mendonça decidiu denunciar o legista José Manella Netto. A acusação foi aceita pela 5ª Vara Criminal da Justiça Federal em São Paulo e deve ser investigada com mais profundidade.

Segundo o procurador, o próprio Instituto Médico Legal (IML) foi um grande colaborador da repressão contra os opositores da Ditadura Militar. Nesse sentido, o próprio Manella Netto, que teve seu exercício cassado pelo Conselho Regional de Medicina de São Paulo em 1994, afirmou, durante o procedimento de análise do corpo, que o atropelamento não teria causado os ferimentos encontrados no cadáver de Carlos Roberto.

Fotografias de Carlos Roberto Zanirato e Carlos Lamarca, respectivamente / Crédito: Comissão da Verdade do Estado de São Paulo/ Memórias da Ditadura/ Creative Commons/ Wikimedia Commons

O caso de Carlos

Em meados de 1969, Carlos Roberto Zanirato tinha apenas 19 anos e acabava de entrar para o Exército Brasileiro. Integrante do 4º Regimento de Infantaria, em Osasco, o jovem abandonou seu posto nos quartéis para fundar, junto de do capitão Carlos Lamarca, a Vanguarda Popular Revolucionária (VPR).

Preso em 23 de junho de 1969, Carlos Roberto foi o primeiro militante detido pelo Departamento Estadual de Ordem Política e Social de São Paulo (Dops/SP) a desaparecer. Segundo o Ministério Público Federal, ele foi submetido à sessões de tortura durante seis dias, até ser atirado na frente do ônibus que o matou.

Na época, os oficiais envolvidos no caso disseram que o militante cometeu suicídio durante um momento de descuido dos militares. Nesse sentido, eles afirmam que o prisioneiro estava sendo levado para um encontro com outros militantes da guerrilha.

Nenhum inquérito policial foi aberto após a morte do militante e nenhuma perícia foi realizada na cena do crime, apesar do procedimento ser obrigatório na época. Carlos Roberto foi sepultado como indigente no Cemitério de Vila Formosa, por mais que as investigações atestem que os militares tinham diversos dados do homem cadastrados.

Os restos mortais de Carlos Roberto nunca foram identificados, mesmo décadas depois. Ainda assim, a Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP) reconheceu, em 1996, que a morte do militante é responsabilidade do Estado brasileiro.