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Curiosidades / Mundo

Os 15 anos mais importantes da História, segundo historiadores

A AH perguntou a historiadores quais os momentos mais fundamentais para entender o mundo em que vivemos. Este é o resultado

Thiago Lincolins, Letícia Yazbek, Lucas Vasconcellos, Fábio Marton Publicado em 20/12/2019, às 11h47

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Alguns dos momentos mais relevantes da História - Wikimedia Commons/NASA
Alguns dos momentos mais relevantes da História - Wikimedia Commons/NASA

1789 — Revolução Francesa

Crédito: Wikimedia Commons

Se a maior parte dos países ocidentais vive em um regime democrático e, em tese, somos todos iguais perante a lei, devemos ao menos algo àquele dia em que a multidão de Paris cercou uma prisão já quase sem prisioneiros. Era 14 de julho de 1789 quando a Queda da Bastilha marcou o tradicional início da Revolução Francesa.

A partir daquele momento, começava a ruir um sistema secular, no qual a monarquia liderava por ordem divina e as classes sociais eram fixas pela lei: clero, nobreza e o resto. Resto que incluía não só camponeses e trabalhadores urbanos como a ascendente burguesia. Todos bancando com impostos os privilégios de uma classe que os desdenhava. Contra as duas primeiras classes voltaram-se os pensadores iluministas, defendendo uma igualdade inata entre os seres humanos. Um exemplo mais radical do que já havia acontecido nos Estados Unidos em 1776.

As ações durante a Revolução Francesa (e também na Americana) influenciaram movimentações em outros continentes: a Revolta dos Alfaiates, a reforma social e religiosa de Brahmo Samaj (Índia) e a descolonização dos países latino-americanos a partir de 1808, entre tantos. Mesmo a monarquia brasileira, herdeira do absolutismo português, fez conces- sões ao novo pensamento, na forma de uma Constituição liberal (ainda que outorgada, de forma iliberal).

“A Revolução Francesa virou a Europa de cabeça para baixo: os Estados Gerais seriam instalados, a Assembleia Nacional Constituinte proclamada, a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão aprovada e o rei guilhotinado”, afirma a historiadora Heloísa Murgel Sterling.

Mas há todo o outro lado: a Revolução Francesa desembocaria no Terror de Robespierre, com 16594 execuções, e o imenso morticínio da Era Napoleônica, este calculado em até 7 milhões de mortes. “A igualdade foi a grande conquista, mas surgia também o Estado nacional e o projeto de impor a todos a mesma ideologia (um povo, um solo, uma cultu- ra), como a justificativa para a repressão às minorias e a imposição do nacionalismo”, afirma Pedro Paulo Funari, da Unicamp.


1917 — Revolução Russa

Crédito: Divulgação

Talvez Marx tenha errado. Talvez o comunismo nunca venha. Ou talvez Lenin – ao negar a ideia de uma revolução espontânea, nascida nos países capitalistas mais avançados, e fazer a sua mantendo firmemente as rédeas, e num país agrícola – tenha queimado a largada.

A União Soviética fracassou em criar o comunismo, a sociedade sem Estado ou opressão profetizada por Marx. Mas, certamente, não fracassou em ser um jogador central na geopolítica do século 20. Até 1989, tudo girou em torno de 1917. Mesmo a terceira força que surgiu, o nazifascismo, era uma virulenta resposta ao comunismo, que foi abraçada (ou tolerada) pelos poderosos por isso, não por seu antissemitismo – e defendia, em todo caso, o antissemitismo acusando o marxismo de ser uma conspiração judia.

Por 74 anos, a União Soviética manteve o mundo (e as pessoas) dividido em duas esferas hostis. Muitos pagaram com a vida não só pelos experimentos em países dominados por comunistas como pela reação – notavelmente, o nazifascismo, mas também inúmeras guerras no Terceiro Mundo, onde a expressão “Guerra Fria” soava como uma pia- da de mau gosto. Mesmo aqui, onde o mais perto que se passou da revolução foi uma revolta desbaratada em quatro dias em 1935, sofremos de ditaduras com sinal oposto.

Há um saldo positivo nessa reação: grande parte dos avanços sociais em países capitalistas, como leis trabalhistas e proteção a minorias, foi uma resposta para apaziguar os ânimos e diminuir a chance de uma vitória leninista. Claramente foi o caso de Vargas, um ferrenho anticomunista em sua primeira encarnação.

“O êxito da tomada de poder por anticapitalistas levou à divisão social em todos os países e ao conflito que continua até hoje, mesmo depois do fim da União Soviética”, afirma Pedro Paulo Funari, da Unicamp. Ainda hoje, é um clichê no discurso político relacionar adversários aos desastres da União Soviética ou, ao contrário, tentar negá-los. E não só à esquerda: a Rússia de Putin, um país em que “propaganda gay” é crime, busca absolver Stalin com um viés nacionalista.


622 — Fundação do Islã 

Crédito: Wikimedia Commons

A maioria destas datas define o começo de eras. Esta é sobre o começo de uma civilização. O Islã marca seu ano zero na Hégira, a fuga de Maomé e seus discípulos de Meca para Medina. Eram então uma minoria perseguida e haviam descoberto uma conspiração para assassinar o profeta. Ele pregava havia 12 anos, tentando converter as pessoas ao monoteísmo visto por ele como o único legítimo, com os cristãos cometendo heresia ao chamar Jesus de Deus.

Em Medina, Maomé se tornaria o líder de um Estado e um Exército. “O início da era muçulmana marca o ocaso a prazo dos iranianos zoroastristas, do cristianismo imperial grego (bizantino) e a futura constituição de uma imensa comunidade (Umah) islâmica”, diz Funari. Maomé retornaria a Meca e ela cairia diante de suas forças sete anos depois. Quando ele morreu, em 632, toda a Arábia estava sob o domínio islâmico. Ao fim do Califado Rashi-dun, que durou até 661, a Pérsia, o Egito, boa parte da Anatólia e o norte da África estavam sob sua bandeira. Em 750, o império ia da Península Ibérica até a Índia.

As duas civilizações (ou três, com os judeus) sob supostamente o mesmo Deus teriam uma vasta história de conflito. E também de tolerância e importantes trocas. Ao conquistar territórios helenizados como Egito, Levante e Anatólia, os islâmicos toparam com originais gregos importantes e seria por traduções árabes que a Europa Ocidental encontraria novamente Aristóteles, Euclides e textos médicos da Antiguidade. Essa foi a Era de Ouro do Islã.

Outra coisa completamente diferente é o Islã radical moderno e seu conflito com o Ocidente. Esse é um desdobramento relativamente recente. O Salafismo, a origem do fundamen- talismo moderno, surgiu na Arábia (futuramente Saudita) no século 18. Só se tornaria um fenômeno mundial a partir da Primeira Guerra. Procura tentar recriar um Islã como eles enxergam ter sido nos tempos do Profeta na fase militar, pós-Hégira, e nos califados que se seguiram. 622, assim, está no centro dos con- flitos do mundo atual. E o possível fim desses conflitos depende da interpretação adotada para ele.


1453 — Queda de Constantinopla 

Crédito: Wikimedia Commons

Há uma lenda que diz que, quando os turcos estavam aos muros de Constantinopla, com seus canhões de mais de 5 metros de comprimento, os sábios da Igreja convocaram um sínodo. Precisavam resolver uma questão urgente: “Quantos anjos cabem na cabeça de uma agulha?”. Ou, em outra versão: “Qual é o sexo dos anjos?”.

A história, repetida até hoje, foi identificada como calúnia. Mas diz muito sobre o desdém com que a Idade Média e seus valores, identificados no Império Bizantino, foram vistos na era que começava então e nas que se seguiram. 29 de maio de 1453 foi escolhido como o momento final da Idade Média, que começou com a queda do Império Romano do Ocidente, em 476, por ser a queda do Império Romano do Oriente – Império “Bizantino” é uma invenção ocidental.

“Localizada no Estreito de Bósforo, Constantinopla funcionava como uma ponte para as rotas comerciais que ligavam a Europa à Ásia por terra”, afirma o escritor Luiz Octavio de Lima. “A conquista da capital bizantina pelos otomanos foi crucial para o domínio turco sobre o Mediterrâneo oriental e os Bálcãs.”

A fim de fugir do regime islâmico, parte da população migrou para Itália e Espanha – incluindo matemáticos, médicos, artistas e engenheiros. Esses gregos, munidos de parte do conhecimento preservado da Antiguidade, seriam uma das forças iniciais da Renascença. Os turcos não se recusavam a vender aos cristãos. Mas aproveitaram o monopólio para subir os preços das especiarias, os produtos mais rentáveis do mundo.

Nessa crise, um país do outro lado da Europa viu uma oportunidade: cortar o intermediário. A aventura portuguesa, tateando aos poucos a costa da África, daria frutos em 20 de maio de 1498, quase no aniversário de 45 anos após a Queda de Constantinopla, com a chegada de Vasco da Gama em Calicute.

Buscando uma alternativa, um genovês a serviço da Espanha, subestimando seriamente o tamanho da Terra, havia topado com outro continente, que insistiu até a morte em chamar de Índia. 


1455 — Prensa de Gutenberg 

É difícil superestimar o tamanho da revolução vinda da criação do alemão Johannes Gutenberg. “Se a internet passou a conectar o mundo de forma instantânea e independente de classe social, não foi menor a revolução provocada pelo advento da máquina de impressão tipográfica”, afirma Luiz Octavio de Lima.

Até Gutenberg desenvolver a prensa de tipos móveis, o acesso a livros e documentos era um grande luxo, prerrogativa dos nobres e do clero. Um único livro podia tomar meses de trabalho de um escriba profissional, e o custo era proporcional ao esforço. A prensa foi criada na China. Mas, por lá, eles tinham uma desvantagem séria. Desde o século 7, os chineses imprimiam calendários e livros sagrados. Mas, para isso, precisavam entalhar até 400 mil ideogramas diferentes em madeira. A página era composta inteira e a economia de trabalho era bem menor do que seria no Ocidente. Gutenberg tinha o luxo de poder reciclar as poucas letras do alfabeto latino em outros trabalhos impressos.

Formada por letras e símbolos em relevo esculpidos em metal, a prensa de Gutenberg tornou possível a publicação em larga escala de livros. E, com isso, assegurar a multiplicação e a circulação dos textos. Com eles, as informações e o conhecimento começaram a ser divulgados de forma sistemática, para qualquer pessoa alfabetizada.

Em 1489, já havia prensas como a de Gutenberg em países como Itália, França, Espanha, Holanda, Inglaterra e Dinamarca. Em 1500, mais de 15 milhões de livros já haviam sido im- pressos. O primeiro deles foi a Bíblia, posteriormente traduzida para o alemão, o que seria fundamental na outra revolução logo ao lado.

Foi o fim do monopólio da Igreja e das pequenas elites acadêmicas sobre o conhecimento. “A cultura escrita expandiu o debate público de ideias e, desde meados do século 20, a indústria cultural passou a movimentar grandes cifras financeiras com a edição e a circulação de jornais, livros, revistas e de material publicitário”, afirma Paulo Henrique Martinez, professor do Departamento de História da Unesp.


1517 — As teses de Lutero

Crédito: Wikimedia Commons

Quando o monge agostiniano Martinho Lutero decidiu publicar seus questionamentos, ele não imaginava que seria responsável por desencadear uma cisão sem volta do cristianismo — e da História europeia. Suas 95 teses, pregadas na porta da igreja de Wittenberg, só pretendiam mudar alguns aspectos da crença católica.

A principal questão era a propaganda enganosa por trás da venda das indulgências. A ideia era que um sacrifício ou boa ação poderiam compensar os pecados. Algo que ainda é praticado: é indulgência quando alguém é instruído a rezar repetidamente após a confissão. Na época, o mais comum era se penitenciar doando à Igreja. Em outras palavras, padres estavam vendendo o perdão de Deus.

Ou assim dizia Lutero, e, ao ser perseguido, terminaria por romper com a Igreja. Metade da Europa acabaria atendendo a novas denominações cristãs. “A publicação das teses de Lutero marca o surgimento de uma alternativa ideológica bem-sucedida ao monopólio ideológico da Igreja Católica e abria as portas para a multiplicação de pontos de vista. Com isso, abriam-se as portas ao racionalismo que prevaleceria até hoje”, diz o Pedro Paulo Funari.

Nem de longe as mudanças se limitaram a questões teológicas. Na alta camada da sociedade, os nobres sentiram que a Reforma era um ótimo pretexto para tomar para si o poder de papas, cardeais e outras autoridades religiosas, marcando um grande racha geopolítico. A Reforma representou o marco da alfabetização e da nova imprensa. Ao traduzir a Bíblia para o alemão, Lutero democratizou a intepretação dos textos sagrados — uma nova forma de pensar, não hierárquica, que muitos viram como o germe do Iluminismo.

Não foi uma revolução sem sangue. A Reforma também resultou em conflitos. Um dos mais notórios é o massacre da Noite de São Bartolomeu, na França em 1572. Dez mil protestantes foram mortos por franceses católicos durante a tragédia. Um século e um ano depois de Lutero, a cisão entre católicos e protestantes levaria ao maior conflito já visto na Europa: a Guerra dos 30 anos, que custaria milhões de vidas.


1492 — Chegada de Colombo à América 

Crédito: Wikimedia Commons

Um ano de acerto de contas para a Espanha. Após uma década, em 1492, chegava ao fim, na Europa, a Guerra de Granada. O último reino islâmico na Pensínsula Ibérica era derrotado. Sob o comando do rei Fernando e do general Rodrigo Ponce de León y Alhama, terminavam os oito séculos de presença islâmica na região.

Menos de três meses depois, o Decreto de Alhambra expulsava da Espanha todos os judeus que se recusassem a se converter. Os islâmicos sofreriam de legislações semelhantes posteriormente. Os que se converteram, sob suspeita de terem revertido à sua fé original, seriam as principais vítimas da Inquisição Espanhola.

Resolvida a questão interna, em agosto, o genovês Cristóvão Colombo, após muito insistir, saiu com suas três caravelas para encontrar um caminho para a Índia que não passasse pela costa da África, dominada pelos portugueses. Em 12 de outubro, desembarcando na ilha de Guanahani, nas atuais Bahamas, encontrou nativos taínos, adornados em penas, sem nem sinal de qualquer cidade asiática. Batizou a ilha de San Salvador, visitou parte do território de Cuba e outras ilhas. Insitiria até o fim da vida que Cuba era a China e havia descoberto uma rota para a Ásia.

Caberia a outro italiano, Américo Vespúcio, notar o óbvio e afirmar que aquilo tudo não era a Ásia, mas outro continente. Um Novo Mundo. “Ninguém sabia o que esse novo mundo podia significar, mas entenderam que algo espetacular e importante havia acontecido”, afirma Richard Vinen, do King’s College London.

As especiarias estavam a meio planeta de distância. Levaria mais sete anos para Vasco da Gama encontrá-las pela rota a leste, e mais 30 para a expedição de Magalhães mostrar um caminho alternativo para a Espanha. A América, sabemos bem, não seria ignorada. A ambição europeia seria despertada para ouro, prata e, depois, plantações. Catastrófica para os nativos da América, uma revolução sem precedentes para todo o mundo. A primeira “grande globalização”, como define Paulo Henrique Martinez, da Unesp.


1687 — Lei da gravidade

Crédito: Divulgação

A pílula de Copérnico foi particularmente dura de engolir. Como poderia um mundo visitado por Deus em pessoa, na figura de Cristo, que mesmo os sábios pré-cristãos da Antiguidade acreditavam ser o centro de tudo, ser rebaixado a um mero satélite do Sol?

Ao final do mesmo século em que Galileu fora forçado a parar de defender essa ideia perturbadora, pensadores, principalmente no mundo protestante, estavam aceitando o inevitável, mas ainda havia uma grande lacuna na teoria: se os planetas, incluindo a Terra, giravam em torno do Sol, onde ficava o lado de baixo do mundo? O que os prendia no lugar? Por que simplesmente não caíam?

E aí caiu a maçã. Não literalmente: é uma lenda que Newton tenha tido sua ideia ao ser acertado pela fruta, mas algo atingiu sua mente. Em 5 de julho de 1687, aos 40 anos de idade, Isaac lançou a obra Princípios Matemáticos da Filosofia Natural, “considerada uma das mais importantes da história universal”, como define o historiador Rodrigo Trespach.

Foi a partir da publicação, composta de três volumes (o segundo e o terceiro foram divulgados em 1713 e 1726), que Isaac Newton basicamente reescreveu a física – da forma como ainda é ensinada nas escolas, porque, mes-
mo se superada pela Física Quântica e a Relatividade, ainda serve para quase todos os fins práticos.

Copérnico, Galileu e Kepler explicaram que os planetas se movimentavam em torno do Sol. Mas, como define Bruna Marques Cabral, da UFRJ, foi Newton quem representou isso em termos matemáticos e nos permitiu compreender como funcionava a mecânica do Cosmos. A Teoria da Gravitação Universal mostrou onde ficava o “lado de baixo”: em todo lugar. Tudo tem gravidade, e as órbitas resultam da interação entre os campos gravitacionais. Isso explica por que não caímos da Terra, por que a Lua gira em torno da Terra, por que a Terra gira em torno do Sol e, séculos depois, por que as galáxias se mantêm unidas.

Sem as equações de Newton, seria impossível imaginar a exploração espacial. E a gravidade é apenas parte: sem a revolução newtoniana, não haveria a Revolução Industrial para sequer fazer foguetes.


1859 — A Origem das Espécies 

Crédito: Wikimedia Commons

Os eventos revolucionários nos outros anos aqui listados mudaram o cenário político, religioso ou científico. Mas a revolução de Charles Darwin tocou em algo mais profundo: quem é o ser humano. Ninguém duvidava de nossa natureza animal. Ela é berrantemente óbvia: respiramos, comemos, morremos, servimos de comida para os vermes como qualquer outro bicho.

Mas havia essa ideia geral de sermos uma grande exceção, de nossa capacidade para consciência nos tornar algo sobrenatural, fora da natureza. Éramos como animais misturados com anjos (ou demônios, aos pessimistas).

Essa segunda queda da graça — após Copérnico ter nos tirado do centro do Universo – pode não ter sido ainda aceita por todos. Cristãos e islâmicos criacionistas continuam a negá-la. Mas é absolutamente decisiva no pensamento científico e sua interpretação popular. Passamos a nos entender como parte e fruto da natureza.

A maioria das denominações cristãs — catolicismo e protestantismo tradicional – aceitaram a Evolução, entendendo o relato bíblico como algo alegórico. Deus teria guiado a seleção natural por 3,5 bilhões de anos até nós. Mas é inegável o estrago que a Teoria da Seleção Natural fez à visão religiosa. “Foi um golpe contra a ‘ordem mundial divina’”, afirma Bruna Marques Cabral, da UFRJ. A pergunta básica do “de onde viemos”, que era sempre levantada contra os céticos, ganhou uma resposta sólida.

A evolução abriu espaço para ideias inconcebíveis até então. Marx diria que Darwin deu “a base na Ciência Natural para a luta de classes histórica” e imaginou a História como a evolução inevitável em direção ao comunismo. Do outro lado, darwinistas sociais – mais infamemente, os nazistas — tentaram tomar as rédeas da evolução, com funestas consequências.

O impacto é físico. A medicina moderna, que deve muito ao entendimento de como os micróbios desenvolvem resistência por seleção natural, permitiram um aumento populacional e de longevidade sem precedentes. O mundo não seria reconhecível sem Darwin.


1969 — A viagem da Apollo 11

Crédito: Divulgação/NASA

"Um pequeno passo para um homem, um grande passo para a humanidade.” Quase 50 anos depois, soa otimista. Desde 1972, com a última missão do Programa Apollo, a 17, estamos confinados à órbita terrestre. Mas quem sabe ainda em vida vejamos um brado como o de Neil Armstrong caso se concretize o sonho de uma missão para Marte, seja pela Nasa ou outra agência, seja pela iniciativa privada.

A Era Espacial começara com os soviéticos, em 4 de outubro de 1957, com o lançamento do satélite Sputnik I. O americanos reagiram enviando o satélite Explorer I, em 31 de janeiro de 1958. Quando Yuri Gagarin se tornou o primeiro homem no espaço, em 12 de abril de 1961, os Estados Unidos estavam definitivamente perdendo.

Em 1961, a Nasa elevou as apostas com o Programa Apollo, projeto especial com o objetivo de levar o homem à Lua dali a dez anos. Foram oito. Em 20 de julho de 1969, a mis- são Apollo 11 levava Armstrong, Edwin Aldrin e Michael Collins à superfície lunar, por onde caminharam por duas horas e 45 minutos.

Para o jornalista e escritor Luiz Octavio de Lima, “a chegada do homem à Lua assinalou o ponto alto da corrida espacial”. No mundo todo, milhões vibraram com as imagens televisionadas ao vivo. Naturalmente, aprendemos muito mais sobre a Lua e sobre tecnologia espacial, que permite coisas como o GPS, para ficar no exemplo mais familiar, hoje em dia. Diversas pequenas inovações do dia a dia, como as lâmpadas de LED, a comida liofilizada (sopa em saquinho), a papinha de bebê, computadores miniaturizados e fones sem fio vieram de criações da Nasa.

No entanto, a maior contribuição da chegada do ser humano à Lua talvez tenha sido mais metafísica do que científica. Depois de ter explorado a Terra, o ser humano cruzou, de fato, uma nova fronteira, para além do planeta que nos deu origem.

Ainda que a corrida espacial tenha terminado após a vitória americana, e os governos não tenham mais liberado os gigantescos orçamentos necessários para missões como a Apollo, voltarmos não é mais uma questão de se, mas quando.


1914 — Começa a Primeira Guerra

Crédito: Wikimedia Commons

Um morto: o arquiduque Francisco Ferdinando, herdeiro do trono do Império Austro-Húngaro, assassinado em Sarajevo pelo terrorista Gavrilo Princip. Poderia terminar nisso, não fosse a complexa trama de alianças e tensões que levou a um conflito global. Ao final das contas, em 1918, calculava-se (a depender da fonte) mais de 20 milhões. E podemos chegar a 70 milhões se incluirmos nas faturas os mortos da Segunda Guerra, que foi, em grande parte, uma consequência da Primeira. Ela foi, afinal, iniciada por um veterano desta, ascendendo ao poder em resposta aos acordos do fim da guerra e ao temor de uma revolução comunista, defendendo uma luta contra a suposta degeneração moral.

A Grande Guerra original pode não ter a mesma presença na imaginação popular que a seguinte. Meses nas trincheiras para morrer futilmente diante de ninhos de metralhadoras ou envenado por gás não rende filmes heroicos. E, por isso, suas consequências são seriamente subestimadas.

Os confrontos resultaram na dissolução de três grandes impérios de uma vez: a Alemanha, o Império Austro-Húngaro e o Império Otomano. Mesmo no lado vencedor, a Grã-Bretanha passou de maior investidor estrangeiro para um dos maiores devedores do mundo. Toda a economia da Europa entrou em colapso, enquanto os EUA emergiam como grande credor. Terminava uma era europeia e começava a americana. Ainda que, como todo o resto, isso só viesse a ficar realmente claro ao final da outra Grande Guerra.

Antes do fim do confronto, o mundo teria que lidar com o nascimento de outra potência: a União Soviética. Criado pelos bolcheviques sob a liderança de Lenin, o país surgiu da queda do regime czarista em grande parte pela exaustão da guerra.

O choque seria sentido também na cultura. A geração dos anos 20 romperia com o modo de vida de seus pais e, reagindo ao horror dos anos anteriores, se dedicaria ao hedonismo. Os Loucos Anos 20, como acabaram chamados, foram um primeiro ensaio da Revolução Sexual que foi cortado pela Grande Depressão dos anos 1930.


1945 — Termina a Segunda Guerra

Crédito: Wikimedia Commons

"Eu me tornei morte... destruidor de mundos.” A frase vem de um dos criadores da bomba atômica, o físico Robert Oppenheimer, citando o texto hindu Bhagavad Gita. Não foi com um gemido, mas com um estrondo, que acabou a pior guerra que a Humanidade presenciou desde seus primeiros passos na savana africana. Era agosto de 1945, quando os moradores da cidade de Hiroshima, no Japão, foram surpreendidos por um enorme clarão, dez vezes mais forte que o sol, que incendiou casas, roupas e a pele de quem foi exposto. Em seguida, a onda de impacto varreu tudo que estava em pé na cidade. Pessoas passaram a correr por entre as chamas e corpos carbonizados, segurando sua própria pele. Muitos dos que aparentemente haviam escapado intactos morreriam pelo efeito da radiação. “A Era Nuclear tinha começado e o medo tornou-se universal”, diz Heloisa Murgel Starling, da UFMG.

O Teatro do Pacífico estava quase vencido em agosto de 1945. Mas os japoneses, mesmo ameaçados de “pronta e total destruição” com a Declaração de Potsdam, em 26 de junho, pareciam dispostos a resistir até o fim. A matemática determinava que menos americanos morreriam com um ataque de terror nuclear que com uma invasão convencional. Com o fim da Segunda Guerra, o poder global se concentrou nas mãos dos dois aliados vencedores: Estados Unidos e União Soviética.

Em 1947, esse casamento de conveniência terminaria, com a cisão diplomática dando início à Guerra Fria, dominada por um bem quente pavor da aniquilação nuclear. “Os dois países tinham a capacidade de explodir o planeta, e a guerra era ‘fria’ exatamente por conta disso: americanos e soviéticos conseguiram compreender, embora a duras penas, que com armas nucleares não há vitória militar possível”, afirma Starling.

A Guerra Fria se foi, mas as armas nucleares ficaram. Os sombrios ecos dos estrondos de agosto continuam a ser ouvidos nas tensões entre a Coreia do Norte e o mundo. Para ficar só num exemplo.


1968 — O ano de uma geração

Crédito: Wikimedia Commons

Não há só um evento para marcar o que faz de 1968 um ano digno de estar na lista. Foi o ano da juventude, da efervescência, das revoltas. Caracterizado por uma série de protestos que abalaram as instituições e regimes, ele deu origem a transformações que afetaram a sociedade de forma irreversível. Uma única faísca que colocou o mundo todo em chamas.

O mais lembrado é o Maio de 68 em Paris. O que teve início como uma manifestação a favor de reforma estudantil evoluiu para uma grande greve de operários, que envolveu mais de 9 milhões de pessoas. A reação brutal do governo, que transformou as ruas parisienses em campos de batalha, deixou ainda mais clara a importância dos protestos, que tomaram também outros países da Europa Ocidental, como Itália e Alemanha.

Nos Estados Unidos, a revolta foi contra a Guerra do Vietnã. Manifestações pelos direitos civis das mulheres e dos negros também aconteceram em todo o país – estas últimas impulsionadas pelo assassinato de Martin Luther King, em 4 de abril do mesmo ano. No Brasil, a ditadura ainda tinha espaço para protestar. A Passeata dos Cem Mil, realizada em 26 de junho no Rio de Janeiro, ainda é considerada um símbolo da resistência democrática. A efervescência seria afogada com a instituição do AI-5, em dezembro.

Não foi só no Brasil que 1968 terminou em revertério para a esquerda. Nos EUA, em novembro, o conservador Richard Nixon foi eleito. Na França, nas eleições de junho, o partido do presidente Charles de Gaulle, o grande vilão do Maio de 1968, ganhou 352 das 487 cadeiras no Parlamento.

Mas a memória marcou o modo de pensar de toda a geração baby boomer ainda no poder. Como define o historiador Richard Vinen: “Foi um ano que terminou com a vitória da direita, mas que sempre será lembrado como um ano de revolução”.


1989 — A Queda do Muro de Berlim

Crédito: Wikimedia Commons

Embora o muro tenha levado meses para ser totalmente destruído, são as imagens da noite de 9 de novembro de 1989 que permanecem no memória. Munidos de martelos e picaretas, jovens berlinenses começavam a destruir o enorme paredão de concreto, de mais de 160 quilômetros de extensão, que dividia a Alemanha socialista da capitalista.

A Guerra Fria já durava 42 anos e, mesmo com a expectativa do fim – o tratado de redução dos arsenais nucleares havia sido assinado em 8 de dezembro de 1987 —, o clima de tensão continuava. E o muro, erguido em 1961, continuava em pé, impedindo que a população do lado socialista fugisse para a Alemanha Ocidental. Ou que nazistas da Aleamanha Ocidental invadissem o outro lado (sua justificativa oficial).

Começou por um grande mal-entendido. Günter Schabowski, o porta-voz da Alemanha Oriental, afirmara em entrevista que as viagens ao lado ocidental seriam permitidas. A ideia era um processo lento. Mas, questionado sobre a data, deu a entender que a mudança já estava em vigor. A eufórica população da Alemanha Oriental congregou-se diante do muro, pedindo para passar. Diante das torres de guarda, milhares de cidadãos gritavam pedindo a abertura dos portões. Os guardas ficaram sem reação. A passagem foi permitida. Outros, usando ferramentas comuns, começaram a esburacar o muro. Logo alemães do outro lado se juntaram a eles.

No dia seguinte, mais de 2 milhões de alemães do lado oriental cruzaram para a Alemanha Ocidental, em uma festa que celebrava a reunificação do país — oficializada mais de um ano depois, em 3 de outubro de 1990. A Queda do Muro abriu caminho para o fim do socialismo europeu. Os regimes cairiam em sucessão. A União Soviética terminaria no Natal de 1991.

“A Queda do Muro marcou o início do mundo capitalista multipolar que vem até hoje. O capitalismo não contou mais com uma alternativa”, afirma Pedro Paulo Funari. No que se seguiu, chegou-se a dizer que a História havia acabado. Assim foi até certo setembro...


2001 — Ataque ao WTC

Crédito: Wikimedia Commons

Na manhã de 11 de setembro de 2001, uma era, literalmente, desabou. O mundo assistiu ao vivo dois aviões civis servirem como a mais eficiente arma de terror jamais usada.

Mas isso não estava claro para quem via então. O que aconteceu foi uma transmissão ao vivo de emergência quando um avião se chocara com a torre norte do World Trade Center, em Manhattan. Com todas as atenções voltadas para o incêndio, o mundo viu ao vivo o segundo impacto na outra torre, 17 minutos depois. Após mais de uma hora de incêndio, com cenas de pessoas desesperadas se jogando do topo, outra vez o inesperado: as sólidas torres de 110 andares, maravilha da engenharia moderna que havia marcado a paisagem de Nova York por 24 anos, foram ao solo. Com elas — o número só seria estabelecido muito tempo depois — 2997 pessoas.

Foi o fim de uma curtíssima era, espécie de interlúdio entre o fim do comunismo soviético e o começo da nossa. Nos anos 90, o cientista político Francis Fukuyama chegou a ousar dizer que a História havia acabado: dali para a frente, viria a paz eterna e o domínio universal da de- mocracia. A teoria não foi nem de longe universalmente aceita, mas, até 11 de setembro de 2001, podia-se defendê-la sem soar completamente fora da realidade.

A reação foi fulminante. E provavelmente fútil. O então presidente dos EUA, George Bush, iniciou o que ele mesmo chamou de “Guerra Global ao Terrorismo”: operações militares, medidas econômicas e pressão política aos grupos acusados de serem extremistas ou aos governos de países acusados de abrigá-los. A infame prisão na base de Guantánamo seriainaugurada em janeiro seguinte.

Um atentado nessa escala não se repetiria. E, de certa forma, o 11 de setembro é algo ultrapassado, pensado para ser transmitido pela TV. Mas ele incentivou toda uma nova geração de extremistas islâmicos a uma atividade terrorista sem precedentes. A recente ascensão da ultradireita deve muito a um sentimento anti-islâmico. Não só o próprio mundo islâmico passou por um terremoto desde 11 de setembro como a própria democracia ocidental parece em risco.


Votaram:

Bruna Marques Cabral, doutoranda em História pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ)

Heloisa Murgel Starling, historiadora e coautora de Brasil: Uma Biografia

Luiz Octavio de Lima, autor de 1932: São Paulo em Chamas

Paulo Henrique Martinez, Unesp/Assis

Pedro Paulo A. Funari, Departamento de História, Unicamp

Richard Vinen, Departamento de História, King’s College London

Rodrigo Trespach, historiador e autor de livros


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