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Matérias / Esporte

Ditadura em jogo: Quando política e esporte entram em choque

Em meados de 1973, Pinochet tinha planos específicos que, para sua surpresa, acabaram sendo frustrados por Pelé, falecido nesta quinta-feira, 29

Coluna - José Renato Santiago Publicado em 25/07/2021, às 10h00 - Atualizado em 29/12/2022, às 16h47

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Imagem colorizada de Augusto Pinochet e fotografia de Pelé - Janitoalevic/ Ministerio de Relaciones Exteriores de Chile/ John Mathew Smith/ Creative Commons/ Wikimedia Commons
Imagem colorizada de Augusto Pinochet e fotografia de Pelé - Janitoalevic/ Ministerio de Relaciones Exteriores de Chile/ John Mathew Smith/ Creative Commons/ Wikimedia Commons

No dia 11 de setembro de 1973 o presidente Salvador Allende, juntamente com um pequeno grupo de correligionários, no Palácio de La Moneda, sede do governo chileno, enfrentou por cerca de três horas os ataques da infantaria, blindados e bombardeios das forças militares sob o comando do general Augusto Pinochet.

Allende foi o primeiro chefe de Estado socialista marxista eleito democraticamente na América, e muito do seu apoio político teve origem no Partido Comunista e nos sindicatos locais. Morreu no palácio, e a versão oficial para sua morte foi suicídio.

Tão logo assumiu o poder, a Junta Militar comandada por Pinochet instituiu no país uma política de repressão aos partidos de esquerda, que tiveram muitos de seus membros e aliados torturados e mortos no Estádio Nacional de Santiago, local utilizado pelo governo para prisão e fuzilamento. Estima-se que, já no dia seguinte à morte de Allende, cerca de 600 prisioneiros foram transferidos para lá.

Mais de 20 mil presos políticos podem ter passado pelo local. O golpe militar que contou com o apoio americano, em plena Guerra Fria, provocou o imediato rompimento das relações diplomáticas entre o Chile e a União Soviética.

Já no campo esportivo, ao vencer o grupo 9 das eliminatórias europeias, a seleção soviética enfrentaria o vencedor do grupo 3 das elimina tórias da América do Sul, a seleção do Chile. A primeira partida entre os dois países aconteceu em Moscou duas semanas após o golpe militar chileno.

Mais de 60 mil soviéticos foram assistir a um empate sem gols. O jogo de volta estava agendado para o dia 21 de novembro no Estádio Nacional de Santiago. Dias após o jogo de Moscou, no entanto, o presidente da Federação Soviética de Futebol, Valentin Granatkin, se manifestou contrário à realização da partida nesse estádio, pelo uso político que tivera.

O próprio governo soviético, comandado pelo secretário-geral do Partido Comunista, Leonid Brejnev, emitiu uma nota afirmando que “por considerações morais, os esportistas soviéticos não podem jogar nesse momento no estádio de Santiago, salpicado de sangue de patriotas chilenos”.

A Federação Chilena de Futebol cogitou transferir a partida para o Estádio Sausalito, em Viña del Mar, proposta logo desautorizada por Pinochet, que fazia questão que a partida acontecesse no Estádio Nacional e queria mostrar ao mundo que tudo estava bem no Chile. Uma comissão enviada pela Fifa, composta de um suíço e um brasileiro, atestou estar tudo em ordem no Estádio de Santiago — ainda que haja registros da existência de mais de 7 mil pessoas presas ali naquele dia.

Edson Arantes do Nascimento, o Pelé / Crédito: Getty Images

Com a autorização da Fifa para a realização do jogo, Pinochet iniciou a transferência dos presos políticos para outros locais. Pinochet planejou fazer uma grande festa, e convidou o prestigioso Santos de Pelé na época para realizar naquele mesmo dia um amistoso com a seleção chilena, em comemoração à vaga para o mundial de 1974.

Além do cachê de 30 mil dólares, o ditador chileno tinha em mente realizar uma homenagem ao Rei do Futebol antes da partida. Pelé, entretanto, alegou estar contundido, com um estiramento muscular, e não poderia viajar para Santiago.

Autoridades chilenas contataram o Santos e pessoas próximas ao governo brasileiro para insistir que o Rei fosse, ao menos, para ser homenageado, hipótese também descartada pelo atleta. Outro jogador que se recusou a ir a Santiago foi o meio-campista Clodoaldo, que usou como pretexto uma crise de sinusite.

A ausência dos dois campeões mundiais no amistoso provocou estranheza. Embora a imprensa chilena, na época, tenha divulgado que todos os ingressos tinham sido vendidos, menos de 20 mil pessoas estavam no estádio naquele dia.

Pelé abraçando Jairzinho após título da Copa de 1970 / Crédito: Divulgação/ Fifa

Mesmo sem o selecionado soviético, o juiz chileno Rafael Ormazábal apitou o início da partida. Em menos de 30 segundos depois da saída de bola, Valdés, o capitão do Chile, chutou para o gol vazio. O árbitro decretou o fim do jogo, com vitória chilena por 1 a 0.

Entrou em campo, então, a equipe santista, que no primeiro tempo abriu 4 a 0 no placar, que acabaria em 5 a 0. A Fifa confirmaria a vitória do Chile sobre a União Soviética, assim como a vaga para a Copa do Mundo de 1974.

Na competição mundial realizada na Alemanha, os chilenos foram eliminados ainda na primeira fase, com uma derrota e dois empates. O 'Rei do Futebol' encerraria sua carreira com a camisa santista em 2 de outubro de 1974, e com a camisa do Cosmos de Nova York, em 1° de outubro de 1977.

O General Pinochet entregou a presidência a Patricio Aylwin, o vencedor das eleições realizadas em 1989, em 11 de março de 1990. Faleceu aos 91 anos, em 10 de dezembro de 2006, justamente no Dia Internacional dos Direitos Humanos.


Por José Renato Santiago, Doutor e mestre pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo com pós-graduação pela ESPM. Autor de livros sobre a história do futebol, gestão do conhecimento e capital intelectual.


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