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Matérias / Brasil

Floresta Aurora, o clube que lutou pela dignidade dos escravizados

Fundado por alforriados, clube surgiu muito antes da Lei Áurea

Fabio Previdelli | @fabioprevidelli_ Publicado em 21/05/2022, às 00h00 - Atualizado em 12/05/2023, às 10h30

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Antigos membros do Floresta Aurora - Divulgação/Floresta Aurora
Antigos membros do Floresta Aurora - Divulgação/Floresta Aurora

Em 13 de maio de 1888, a Princesa Isabel, filha de Dom Pedro II, assinou a Lei Áurea, que oficializou o fim à escravidão no Brasil. Entretanto, muito antes disso, os negros já lutavam por sua liberdade.

16 anos antes da Abolição da Escravatura, um grupo de alforriados fundou em Porto Alegre o clube negro mais antigo do Brasil. A Sociedade Floresta Aurora nasceu em 31 de dezembro do ano de 1872.

O Floresta Aurora 

Fundado no bairro Floresta, o clube teve outras ‘sedes’ ao longo dos anos: como nos bairros de Cidade Baixa, Hípica, Cristal, Pedra Redonda e, desde 2013, fica em Belém Velho, na Zona Sul da capital gaúcha. 

Registros do Floresta Aurora/ Crédito: Divulgação/Floresta Aurora

Essas mudanças, embora pareçam situacionais, refletem um enorme problema enfrentado por outras instituições culturais negras não só de Porto Alegre, mas de todo o Brasil: a expansão imobiliária e o desenvolvimento destas regiões jogam cada vez mais e mais esses grupos para longe dos grandes centros — uma forma de reafirmar o racismo estrutural que poucos parecem se importar de ver. 

Mas essa luta e resistência diária parece não afetar nenhum pouco o Floresta Aurora, muito pelo contrário, suas raízes foram formadas assim. Quando o clube surgiu, em 1872, conforme aponta matéria publicada pela Folha de São Paulo, Porto Alegre vivia a necessidade de angariar fundos para dar um final digno para os corpos de escravos que, até então, eram jogados em valas rasas. 

O Floresta fez muito mais do que isso, os recursos arrecadados pela instituição também serviram para comprar cartas de alforrias de negros, além de desenvolver um senso de comunidade e aceitação entre eles. 

"Não frequentar espaços ocupados por brancos era algo tão posto que não era sequer problematizado. Clubes negros como o Floresta Aurora surgiram foi das necessidades básicas dessas pessoas", diz Giane Vargas à Folha. 

Professora da Universidade Federal do Pampa (Unipampa) e do curso de Museologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Vargas é autora da dissertação "Clubes sociais negros: lugares de memória, resistência negra, patrimônio e potencial", que mapeou mais de 200 instituições brasileiras desde o século 19. 

Anúncio de um evento no Floresta Aurora/ Crédito: Divulgação

A docente também é uma das envolvidas na produção do livro ‘Floresta Aurora 150 Anos Fazendo História’, que será lançado ainda este ano. Ao Gaúcha ZH, ela pontua que espaços como o do Floresta são locais de reconhecimento e patrimonialização da cultura e da história negra.

“É um espaço de lazer, mas também é de organização e de articulação política da comunidade negra. É onde ela se sente em casa. É um espaço de identidade negra e de resistência”, diz. 

Ao longo dos anos, o Floresta Aurora virou referência para a comunidade negra local. Entre seus sócios fizeram parte, além disso, diversos personagens marcantes de nossa sociedade, como o atacante do Internacional Tesourinha, que na década de 1940 fez parte do time histórico colorado apelidado de “Rolo Compressor”. 

Sentados no centro da mesa estão os jogadores Alpheu, Ávila e Tesourinha/ Crédito: Divulgação/Floresta Aurora

Além de Tesourinha, outros ídolos do futebol do Rio Grande do Sul já frequentavam o clube na época em que sua sede ficava no bairro Cristal: como é o caso de Tinga e Ronaldinho Gaúcho, aponta o Jornal do Comércio.

Apesar de ser um clube para negritude e criado por negros, o Floresta Aurora sempre incentivou a aceitação de sócios brancos, conforme aponta Gilmar Afrausino, atual presidente da instituição. Um exemplo disso é o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que já foi um assíduo frequentador dos bailes promovidos pelo Floresta.

Combatemos o racismo, mas nosso emblema literalmente é a igualdade. Nosso brasão leva duas mãos, uma negra e outra branca, se cumprimentando", diz Afrausino à Folha. 

A superação da pandemia

Acostumado a enfrentar dificuldades, o Floresta Aurora não desistiu de lutar durante o período de pandemia. Embora a situação tenha se tornado bastante problemática neste último um ano e meio de fechamento por conta da Covid-19, a instituição ainda se mantém de pé. 

Sérgio Luiz Fonseca, vice-presidente de finanças do Floresta, aponta que o clube conta atualmente com menos de 100 sócios com a mensalidade em dia, apesar dos preços acessíveis. Para se ter uma ideia, enquanto outros clubes de Porto Alegre cobram mensalidade de R$350 e até mesmo 6 mil reais pelo ingresso de novos sócios; o Floresta admite novos associados por apenas 150 reais, além da fidelidade mínima mensal de R$50.

"Temos a expectativa de que esse número melhore com a retomada e com os festejos dos 150 anos. Porém o futuro do clube passa por ser financiado menos pelo quadro social e mais pela captação de recursos de outras fontes que exigiram algumas mudanças na organização do clube, como emendas parlamentares", aponta Fonseca

Atual terreno do Floresta Aurora/ Crédito: Divulgação/Floresta Aurora

Desde que se mudou para Belém Velho, o Floresta Aurora está rodeado por comunidades mais pobres. Se o fato, em partes, mostra a falta de zelo e atenção que as políticas públicas tem com clubes sociais negros, por outro lado é uma forma da instituição reafirmar suas origens ajudando a parte mais necessitada da população gaúcha, como sempre fez.

"Na pandemia, coletamos cestas básicas, kits escolares, agasalhos e sapatos para os moradores ao nosso redor. Conseguimos atender a todas elas, e ainda sobraram recursos para uma comunidade quilombola. Então, acho que é mais correto dizer que abraçamos a comunidade tanto quanto fomos abraçados por ela", completa Afrausino.

Recentemente, um projeto de organização e documentação dos 150 anos do clube concorreu em um edital da Secretaria Estadual de Cultura para tentar obter R$150 mil de recursos. No entanto, a proposta ficou no posto de suplentes. 

A própria existência do Floresta Aurora já é uma ação afirmativa e diz algo para todos nós", afirma Giane Vargas à Folha. 

"A própria resistência ao ter sido expulso de um bairro central e conseguir se manter em outro bairro, mesmo na periferia e bem mais distante, já é uma ação extremamente política de organização. Nosso corpo negro dentro daquela instituição diz algo”, encerra.


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