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Matérias / Crimes

22 anos depois, relembre o que foi o caso Lucas Terra

Em 2001, o garoto de 14 anos foi morto e teve seu corpo cruelmente queimado num crime brutal

Fabio Previdelli Publicado em 24/05/2020, às 09h00 - Atualizado em 26/04/2023, às 10h26

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Imagem mostra o adolescente Lucas Terra - Arquivo pessoal
Imagem mostra o adolescente Lucas Terra - Arquivo pessoal

A morte do jovem Lucas Vargas Terra, que foi brutalmente assassinado na capital baiana em 2001, chocou o país. Apenas um entre os três suspeitos foram presos por suposto envolvimento em um dos crimes que "marcaram os últimos 40 anos na Bahia".

Nesta terça-feira, 25, outros dois acusados de envolvimento no crime foram a júri popular, sendo eles: Joel Miranda e Fernando Aparecido da Silva. Eles negam o crime.

"São 22 anos de impunidade, de abuso do tempo de espera. Esperar para que haja o julgamento de uma criança, todos esses anos, é ferir a nossa família todos os dias. Hoje, eu sinto como se não fosse uma vitória, porque quando passa muito tempo ela perde o efeito, mas eu quero que eles sejam julgados e que tenham pena máxima", disse Marion, a mãe de Lucas Terra, conforme repercutido pelo G1. 

O jovem, que tinha 14 anos na época, teria sido vítima de agressões sexuais e foi queimado vivo. O acusado é o pastor Silvio Roberto Galiza, o único condenado até o momento. 

Desaparecimento

Na noite de 21 de março de 2001, o menino ligou de um telefone público para seu pai, Carlos Terra, avisando que estava junto de Galiza e que dormiria na Igreja, localizada no bairro do Rio Vermelho, naquela noite, afinal, estava tarde para voltar sozinho para casa.

No dia seguinte, o garoto não voltou para casa e, durante as buscas, o pastor contou versões contraditórias sobre quando foi a última vez que viu o garoto. De acordo com o promotor que investigou o caso, Davi Gallo, as buscas foram “desfocadas” por informações falsas.

Entretanto, no dia seguinte, 23, os restos mortais de uma criança foram achados num caixote queimado que havia sido abandonado em um terreno baldio. O corpo foi encaminhado ao Instituto Médico Legal (IML) e o resultado do exame de DNA só foi conhecido 43 dias depois.

Mechas do cabelo e partes da roupa que ficaram intactos permitiram apontar que o corpo seria o de Lucas Terra — o que foi confirmado depois por um laudo pericial da polícia.

Além do mais, foi revelado que o garoto sofreu uma tentativa de asfixia, mas o grau de carbonização do jovem impediu que fosse constatado uma causa da morte e se Lucas sofreu ou não uma tentativa de abuso sexual. Esse ponto levou o promotor a crer que "certamente houve ato de violência sexual".

A perícia encontrou, no corpo, vestígio de tecidos semelhantes aos encontrados na Igreja do Rio Vermelho, o que foi crucial para ligar o pastor e a Igreja ao crime. O assassinato aconteceu dias antes que o jovem e seu pai seguiriam para a Itália, onde sua mãe, Marion Terra, os esperava.

Testemunhas da brutalidade

Pessoas que conviviam com Lucas relataram que ele era um membro ativo dentro da igreja e que Galiza até mesmo o nomeou assistente informal, conforme resgatado pelo programa 'Linha Direta', da TV Globo, com relatos de testemunhas. Também é dito que ele passou a controlar a vida do adolescente.

Silvio também se incomodava quando via seu alvo interagindo com garotas e até mesmo proibiu que ele namorasse uma menina. O 'Linha Direta' também resgatou relatos de testemunhas que disseram que sempre que pudera, Silvio convidava para dormir na igreja com outros garotos — esse ponto era desconhecido por seu pai.

Em uma ocasião, quando já estava tarde, Silvio convidou os adolescentes para dormir na Igreja. Após seus superiores descobrirem que Galiza dormiu com Lucas na mesma cama, enquanto os demais meninos estavam em um cômodo separado, o pastor foi transferido para outra instituição, mas isso não o impediu de continuar visitando a igreja que o garoto frequentava. Silvio já havia sido expulso de outra comunidade e tinha ganhado o apelido de “O Secretário do Diabo”.

Amigos da vítima, que depuseram contra o pastor, foram perseguidas. O pai de Lucas também foi perseguido e solicitou ajuda ao Ministério Público (MP) para ter sua integridade garantida.

Protestos e condenação

O inquérito contra Galiza só foi concluído em outubro de 2001, quando o pastor passou a ser acusado pela morte do jovem. Entretanto, ele não teve sua prisão preventiva decretada, o que só aconteceu após Carlos Terra acampar na porta do MP de Salvador.

Carlos, o pai de Lucas em protesto /Crédito: Reprodução/Vídeo

Os pais de Lucas passaram a recorrer a ONGs de defesa dos Direitos Humanos e também ao Ministério da Justiça, em Brasília. Carlos, inclusive, conseguiu entregar uma carta ao escritório da ONU, na Suíça, questionando a demora no julgamento e indagando de onde viriam recursos financeiros para os advogados mais caros do Brasil defender Galiza — sendo que ele morava em uma comunidade carente.

Essa pressão culminou com a marcação do primeiro julgamento do pastor. Assim, em junho de 2004, Silvio Roberto Galiza foi condenado a 23 anos e 5 meses de prisão — a pena foi reduzida para 18 anos, e depois para 15, após a entrada de um recurso por parte da defesa. Em 2012, ganhou a liberdade condicional, conforme repercutido pelo G1. 

Com cinco testemunhas contra o pastor, o júri considerou o crime triplamente qualificado e ainda aceitou a tese de que o réu cometeu abuso sexual, matou e ateou fogo contra o corpo da vítima.

Em entrevista ao Linha Direta, em 2006, o pastor alegou inocência e acusou outros três membros da Igreja de envolvimento no caso: o bispo Fernando Aparecido da Silva, o pastor Joel Miranda Macedo e o segurança dos dois, Luis Claudio.

O caso Lucas Terra sendo apresentado no programa Linha Direta / Crédito: Divulgação

O pastor alegou que o menino havia flagrado Joel e Fernando durante um ato sexual e por isso, foi morto. A denúncia foi aceita e após inúmeros recursos, o STF decidiu, em última instância, em 2020, o júri popular. 

Carlos, pai de Lucas, faleceu em 2019 e não presenciará o júri popular dos acusados do crime. Durante anos, ele cobrou por justiça no caso. 

"Toda nossa caminhada foi feita um amparando outro. Hoje a me sinto sozinha aqui, mesmo com meu filho [irmão de Lucas]. A companhia dele, que nunca desistiu de lutar – ele sempre acreditou, dizia para mim: ‘Marion, mesmo que demore, mesmo que seja até o último dia da minha vida, nós vamos lutar para que esses homens sentem no banco dos réus'", disse Marion nesta terça-feira, 25.