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Matérias / Brasil

Contratempos e a volta de Vargas ao poder: as eleições e a copa de 1950

Obstáculos no dia da última partida contra o Uruguai selaram a derrota da seleção brasileira na competição mundial

José Renato Santiago Publicado em 20/06/2021, às 11h00

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O Estádio do Maracanã antes da Copa do Mundo de 1950 - Domínio público/ Acervo Arquivo Nacional
O Estádio do Maracanã antes da Copa do Mundo de 1950 - Domínio público/ Acervo Arquivo Nacional

Marcadas para 3 de outubro de 1950, as eleições presidenciais que definiriam
o sucessor do general Eurico Gaspar Dutra contou com quatro candidatos. O principal deles, Getúlio Vargas, do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), governara o país por 15 anos, parte desse período como ditador, e lançara a sua candidatura em 19 de abril, dia em que celebrava aniversário.

Durante a corrida presidencial, Vargas ainda teria como principal concorrente o Brigadeiro Eduardo Gomes, da União Democrática Nacional (UDN), o mesmo que perdeu as eleições anteriores para Dutra. Já o Partido Social Democrático, o PSD, lançou o nome do ex-prefeito de Belo Horizonte Cristiano Machado. Por fim, o baiano João Mangabeira foi o indicado pelo Partido Socialista Brasileiro, o PSB.

Naquele ano, os olhos da população brasileira estavam voltados também para a quarta edição da Copa do Mundo, a primeira após o fim da Segunda Guerra Mundial. Como a Europa estava destroçada pelos conflitos de guerra, o Brasil surgiu como candidato único para sediar a competição. Havia uma promessa anterior de realização da Copa do Mundo na Argentina — o “esquecimento” motivou a recusa da vinda da seleção de nossos vizinhos para a disputa.

Segundo relatos da época, ajudou na decisão da Fifa o fato de Getúlio Vargas, durante a década de 1940, em meio ao regime ditatorial, ter utilizado por tantas vezes as tribunas do estádio de São Januário como “palanque” para divulgação de suas ações, sobretudo as relacionadas aos direitos trabalhistas, em uma clara representação de qual era a importância do futebol no dia a dia do país.

Fotografia de Getúlio Vargas quando jovem / Crédito: Creative Commons/ Wikimedia Commons

Boato ou não, uma vez que a decisão do Brasil como país-sede acontecera durante o mandato do presidente Dutra, é inegável afirmar que poucos governantes da história do país souberam utilizar o cenário futebolístico em prol de suas ações públicas como Getúlio. O maior símbolo da primeira Copa do Mundo realizada no Brasil foi justamente a construção do Maracanã.

Inaugurado em meio a andaimes ao longo da arquibancada, no dia 16 de junho, o PTB confirmou Getúlio Vargas como seu candidato a presidente da República. Coube ao estádio sediar a abertura da competição em 24 de junho, com mais de 80 mil pessoas presentes, em uma tarde marcada por vitória de 4 a 0 do Brasil diante do México.

Com gols de Ademir, duas vezes, Jair e Baltazar, foi o vislumbre de um grande momento a ser vivido pelo futebol nacional na competição. No dia seguinte à estreia, o Brigadeiro Eduardo Gomes e Cristiano Machado deram início às suas campanhas presidenciais.

A segunda partida disputada pelo Brasil no Mundial aconteceu no dia 28, no Pacaembu, em São Paulo. O empate por dois gols, que colocou em risco a classificação brasileira para a próxima fase da competição, foi recebido como uma ducha de água fria por todos os torcedores. A seleção precisava vencer o próximo jogo de qualquer maneira.

Em 1º de julho, mais de 140 mil pessoas estiveram presentes no Maracanã para empurrar a seleção brasileira para uma vitória por 2 a 0 diante da fortíssima equipe da Iugoslávia, com gols de Ademir e Zizinho.

Gol de Friaça na final da Copa do Mundo de 1950 / Crédito: Domínio público/ Acervo Arquivo Nacional

A classificação conquistada para a fase final foi comemorada de forma intensa. Durante os jogos, folhetos de propaganda eleitoral choviam sobre a torcida, pedindo votos, em meio aos lances protagonizados por nossos atletas. O Brasil, mais que nunca, só vivia futebol e a política vinha a galope. A empolgação cresceu de forma exponencial quando a nossa seleção goleou a Suécia por 7 a 1, em 9 de julho.

No dia seguinte, a comissão técnica tomou a decisão, tida por muitos jogadores como determinante para a futura derrota da equipe, de mudar o local da concentração brasileira, até então na Casa dos Arcos, no bairro do Joá — um lugar, na época, tranquilo e de díficil acesso, onde os atletas ficavam distantes de todo o clima festivo da capital federal —, para a sede do Vasco da Gama, em São Januário. Na época, o técnico da seleção, Flávio Costa, justificou a mudança pelo fato de algumas pessoas estarem indo ao Joá para fazer serenatas e gritar os nomes dos craques brasileiros.

Veio o dia 13 de julho e, ao som da marchinha de carnaval Touradas em Madri, a seleção nacional aplicou nova goleada: 6 a 1 sobre a Espanha. A atuação de nossa equipe associada ao fato de o próximo adversário, a seleção uruguaia, ter sofrido para empatar em dois gols com os espanhóis e vencer, de virada, nos últimos minutos os suecos por 3 a 2, era vista como a certeza de que o título mundial já era do Brasil.

Ao identificar nesse momento uma boa oportunidade de amealhar votos para sua campanha, no dia seguinte, na publicação esportiva O Globo Sportivo, o presidenciável Eduardo Gomes publicou um anúncio com os dizeres: “Desportista! Amparar, desenvolver e incentivar iniciativas novas no setor de esportes é um dos programas do Brigadeiro! Como desportista que é, o Brigadeiro está tão interessado quanto você em trabalhar, nos esportes, pela grandeza da Pátria!”.

Eurico Gaspar Dutra no jogo de abertura da Copa do Mundo de 1950 / Crédito: Domínio público/ Acervo Arquivo Nacional

Desde então, São Januário passou a ser a sede da política nacional com invasão de torcedores, políticos e curiosos que atrapalhavam a paz até então vivida no Joá. Ainda assim, bastaria um empate diante dos uruguaios, que permaneceram hospedados de forma quase anônima no Hotel Paysandu, no bairro do Flamengo.

Eis que enfim chegou 16 de julho, o dia decisivo. Após terem dormido tarde por causa da grande agitação nolocal, os atletas brasileiros enfrentaram ainda uma série de compromissos comerciais junto a empresas que prometiam fabulosas premiações pelo título. Já sentados no refeitório para almoçar, e posteriormente seguirem ao Maracanã, os atletas precisaram sair de lá e se dirigir à sala de troféus do Vasco para ouvir palavras do presidenciável Cristiano Machado.

Ao final, retornaram ao refeitório, de onde precisaram se ausentar novamente, desta vez para ouvir outro presidenciável, Eduardo Gomes. Em meio a tantos discursos, o tempo se foi, e o jeito foi comer alguns sanduíches no vestiário, momentos antes do início da partida final. Já no gramado, nossos atletas ainda tiveram tempo de ouvir o ex-prefeito do Rio de Janeiro Angelo Mendes de Moraes afirmar: “Cumpri minha promessa construindo este estádio. Agora façam o seu dever, ganhando a Copa do Mundo...”.

Mais de 200 mil pessoas testemunharam o “Maracanazzo”, como ficou conhecida a vitória do Uruguai por 2 a 1 frente ao Brasil. Em 3 de outubro daquele ano, Vargas foi eleito com 48,73% dos votos, Eduardo Gomes ficou com a segunda colocação, com 29,66%, e Cristiano Machado em terceiro, com 21,49% dos votos.


José Renato Santiago é doutor e mestre pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo com pós-graduação pela ESPM. Autor de livros sobre a história do futebol, gestão do conhecimento e capital intelectual.


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