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Matérias / Entretenimento

Do Homem-Aranha ao Batman: A ascensão e o reinado dos mocinhos

Como os super-heróis conquistaram os norte-americanos e impulsionaram a indústria dos quadrinhos

Bárbara Bretanha Publicado em 15/08/2021, às 10h00

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Imagem meramente ilustrativa de revistas em quadrinhos - Divulgação/ Pixabay/ ralpoonvast
Imagem meramente ilustrativa de revistas em quadrinhos - Divulgação/ Pixabay/ ralpoonvast

Oano é 1938, quase uma década após o crash da bolsa de Nova York ter projetado os Estados Unidos — e o mundo — em um período de crise econômica severa. As bancas já recebiam algumas histórias em quadrinhos, almanaques que se popularizaram apenas cinco anos antes, quando a Editora Eastern Color começou a compilar tirinhas cômicas (comics) e lançá-las em periódicos.

Chamados de comic books, eram vendidos a 10 centavos de dólar (US$ 1,30 hoje). A novidade, naquele 18 de abril, era o primeiro volume da série Action Comics. Na capa, um sujeito de colante azul e capa vermelha erguia um carro. Não tardaria para que conquistasse não só um título próprio, mas a imaginação dos jovens norte-americanos. O Super-Homem anunciava o início da era de ouro dos heróis fantasiados.

Histórias de super-homens, dotados de poderes incríveis ou coragem acima da média, são tão antigas quanto a humanidade. E quase tão antiga quanto é a prática de ilustrar esses feitos. A arte sequenciada e com diálogos tampouco é invenção moderna.

As catedrais da baixa Idade Média têm afrescos com santos em que as frases são ilustradas através de pergaminhos saindo da boca, assim como o famoso ‘balão’. Isso tinha até nome: filactera”, diz Flávio Calazans, coordenador do núcleo de pesquisas em histórias em quadrinhos da Unesp.

O interesse por heróis épicos é universal, mas nos EUA tornou-se febre. Eles se multiplicaram e saltaram dos gibis para o rádio, a televisão, o cinema e as casas das pessoas na forma de produtos licenciados.

Das batalhas de Batman contra políticos corruptos na época da Depressão, à luta unilateral do Capitão América contra a Alemanha nazista, os quadrinhos não só refletiam o clima nacional, mas contribuíam para moldá-lo. Vestindo as cores da bandeira dos EUA, o Super-Homem tornou-se emblemático.

“Nas primeiras aventuras, ele era um superassistente social, refletindo o idealismo liberal do New Deal. Bêbados, maridos abusivos e viciados em jogo receberam sua atenção. Em uma das histórias, um proprietário que obriga seus mineradores a trabalhar em condições insalubres é obrigado a passar pela mesma experiência”, escreve Roger Sabin em Comics, Comix & Graphic Novels.

Então, quando a Guerra Fria chegou à América, o personagem evoluiu para um guardião da ordem mundial: um todopoderoso e às vezes corpulento conservador lutando pela ‘verdade, justiça e o estilo de vida americano'", explicou.

O trabalho era malremunerado, árduo, e, pior, geralmente nem dava crédito ao autor. Faziam-se quadrinhos na esperança de um dia serem promovidos às tirinhas dos jornais. Ironicamente, o Super-Homem, de Jerry Siegel e Joe Shuster, tinha passado anos sendo rejeitado pelos jornais.

Heróis como Tarzan, Fantasma, Mandrake e até mesmo o Dr. Oculto já existiam, mas nenhum reunia todos os elementos que se tornariam de rigueur posteriormente: superpoderes, a identidade secreta, uma fantasia e, naturalmente, uma grande missão.

Imagem meramente ilustrativa de revistas em quadrinhos / Crédito: MichaelGaida/ Pixabay/ ralpoonvast

Precursores

Os quadrinhos já existiam desde o século 19. Na França eram conhecidos como bande dessinée (tiras desenhadas) e na Itália como fumetti (fumacinha, em referência aos balões de fala). O cartunista suíço Rodolphe Töpffer, considerado pai dos quadrinhos modernos, desenhou sua primeira história em 1827.

A história com imagens que críticos desprezam e estudiosos mal notam tem influência maior talvez até que a literatura escrita”, escreveu Töpffer.

Nos EUA, depois da criação do Funnies on Parade, em 1933, a venda de quadrinhos disparou. Eram, em sua maioria, reproduções de tiras de jornais. Em poucos anos, porém, foram sendo substituídos por conteúdo original.

Era mais barato para as editoras comprar material de aspirantes que pagar direitos de reprodução para títulos consagrados. Sofrendo com os efeitos colaterais da Depressão e desesperados por qualquer trabalho, esses artistas não encaravam os quadrinhos com grande entusiasmo. 

História de origem

Após a Primeira Guerra, com a reestruturação dos territórios do leste europeu, os EUA viram uma nova onda de imigração. Filho de judeus da Lituânia, o jovem Jerry Siegel sofreu na infância para conciliar uma cultura com raízes diferentes das suas.

Encontrou na ficção uma válvula de escape. Tímido, era conhecido pelas paródias que escrevia de heróis como Tarzan. Siegel, que fazia parte do grupo de jornalismo da escola, logo estava imprimindo suas próprias criações. E foi na escola, aos 16 anos, que conheceu Joe Shuster, o artista que daria vida às imagens que imaginava.

Juntos, criaram um fanzine, história em quadrinhos autoral, chamado Science Fiction. O terceiro volume, publicado em janeiro de 1933, trazia como vilão um telepata careca. Deram a ele o nome de Super-Homem, em referência ao Übermensch de Friedrich Nietzsche. Em uma entrevista em 1983, Siegel disse que a ideia de transformar o personagem surgiu depois.

Alguns meses após ter publicado a história, me ocorreu que o Super-Homem como herói em vez de vilão podia render um grande personagem para as tirinhas”, disse.

Assim, o bebê alienígena Kal-El foi enviado à Terra pelo pai, momentos antes da destruição de seu planeta, Krypton. Descoberto no Kansas por um casal de fazendeiros, foi batizado de Clark Kent. Tímido e atrapalhado, o jovem decide ir para a cidade de Metrópolis, onde se torna jornalista. O repórter esconde um segredo: os superpoderes.

Imagem meramente ilustrativa de loja de revistas em quadrinhos / Crédito: emiliefarrisphotos/ Pixabay/ ralpoonvast

Fórmula de sucesso

A mistura de colosso com o jovem bem-intencionado funcionou: não eram apenas Siegel e Shuster que conseguiam se imaginar na pele do alienígena. O super-herói, cujos direitos autorais foram adquiridos por US$ 130 (cerca de R$ 5 mil, hoje), rendeu milhões para a Detective Comics Inc. e inspirou outra criação da editora: o Batman.

Logo a Marvel criaria o Tocha Humana e a Fawcett Publications, o Capitão Marvel. Com dinheiro entrando, as empresas desenvolveram estratégias para envolver ainda mais o leitor. Uma delas foi a criação dos side-kicks, os parceiros dos heróis. O primeiro foi Robin, em 1940. Dessa forma, crianças e adolescentes podiam se imaginar auxiliando seu herói. Outra ferramenta para incentivar o consumo veio com a guerra.

Guerra e máscaras

“No fim da década de 30, a dureza da Grande Depressão estava acabando e as pessoas viviam um pouco melhor. Mas existiam problemas sociais e políticos emergindo, conta Stephen Krensky em Comic Book Century: The History of American Comic Books. Com a crise econômica, o crime estava aumentando, e outra ameaça contribuía para o clima de instabilidade: a ascensão do fascismo e a criação do partido nazista na Alemanha.

O público norte-americano precisava de heróis, tanto quanto o governo precisava de símbolos e as editoras, de dinheiro. “Editoras perceberam que a guerra podia ser usada como vantagem: afinal, vilões reais como Hitler e Tojo eram ameaças ideais para os super-heróis. A maioria dos títulos eram cópias baratas de SuperHomem e Batman”, afirma Sabin. Nesse período, surgiu o emblemático Capitão América. Já na primeira capa, dá um belo soco em Adolf Hitler.

O quadrinho tem a ver com a evasão, quando a vida está ruim as pessoas correm para ele”, diz Calazans. “E os Estados Unidos são o país mais belicoso do mundo. O entretenimento ajuda a doutrinar as crianças a não gostar do inimigo e validar o conflito.”

Segundo o New York Times, uma em cada quatro revistas enviadas para as tropas norte-americanas na Segunda Guerra era um gibi. É nessa época que surge a Mulher Maravilha. Com a maioria dos homens enviados ao front, coube às mulheres assumir as fábricas e as outras ocupações masculinas. A super-heroína, que namora um soldado a quem vive resgatando, luta pelos direitos das mulheres.

Imagem meramente ilustrativa de revistas em quadrinhos / Crédito: lisistent/ Pixabay/ ralpoonvast

Supervilões

Com o fim da guerra, as vendas caíram. Em resposta, o Super-Homem ficou mais poderoso. Originalmente ele “pulava sobre arranha-céus e corria mais rápido que um trem expresso”, mas começou a voar, desenvolveu visão de raio x e se tornou invulnerável a tudo, exceto kryptonita.

A medida, no entanto, foi insuficiente, e os super-heróis cederam espaço a outros gêneros. Os quadrinhos se voltaram ao público adulto e histórias de crime e horror, repletas de violência, se popularizaram. Então, os quadrinhos viraram bode expiatório para delinquência e analfabetismo juvenil, depois que um psiquiatra respeitado, Fredric Wertham, publicou A Sedução do Inocente, em 1954.

“Todos os quadrinhos com suas palavras e expletivos em balões são ruins para a leitura”, escreveu Wertham. “Mas nem todo quadrinho é ruim para as mentes e emoções das crianças. O problema é que os ‘bons’ quadrinhos são soterrados por aqueles que glorificam a violência e o crime.”

Mutirões passaram a queimar quadrinhos nas ruas. Um subcomitê do Senado foi criado para investigar a situação. O proprietário da Entertainment Comics, editora especializada em HQs de terror, Bill Gaines, foi chamado para depor em favor das histórias.

Em um ponto da sessão, um senador ergueu uma capa que mostrava um homem com um machado ensanguentado segurando a cabeça decepada de uma mulher. “Você acha que isso é de bom-tom?”, ele teria perguntado. Ao que Gaines respondeu: “É de bom-tom... para um comic de horror”.

Virou manchete

Em pânico, a indústria optou por se autorregular e criou um órgão e um código para a censura. Gaines afirmou ironicamente que “nós da EC esperamos uma queda imediata nos crimes e delinquência”. Com a nova regra, os super-heróis também sofreram.

Toda história que pudesse ser considerada subversiva era vetada. “Esse foi um ponto de virada. As vendas caíram conforme linhas de quadrinhos eram canceladas”, diz Sabin. O número de títulos caiu pela metade entre 1954 e 1956.

Nova era

As HQs nunca mais alcançaram os mesmos níveis de venda. O revival dos super-heróis teve início em 1956, com a primeira aparição do novo Flash, inspirado no herói da década de 40. O clima de guerra fria favorecia narrativas voltadas para a ciência. Logo, a DC revitalizaria uma série de outros heróis, como o Átomo. Stan Lee, da Marvel, desenvolveu o conceito de “marvelita”, o fã que compra todos os quadrinhos da marca.

Nos anos 60, por influência da pop art, as HQs voltaram à moda. Mas até o Pantera Negra, criado para refletir o movimento por direitos civis, foi recebido com ceticismo. “O fim dos anos 60 foi um período turbulento, a geração que havia sobrevivido à Segunda Guerra parecia em descompasso com os jovens que rompiam a tradição. A Guerra do Vietnã tinha começado e se tornou um conflito entre gerações. Os heróis eram parte do establishment”, diz Krensky.


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