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Matérias / Rússia

Envenenamento de Alexander Litvinenko: Relembre uma das maiores polêmicas da Rússia

Opositor foi a primeira vítima confirmada da síndrome letal de radiação aguda induzida por polônio-210

Fabio Previdelli Publicado em 26/02/2022, às 10h00 - Atualizado em 15/07/2022, às 13h00

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Alexander Litvinenko hospitalizado - YouTube/CBC News
Alexander Litvinenko hospitalizado - YouTube/CBC News

Durante o outono de 2016, em um dia quente de outubro, dois visitantes russos chegaram em Grosvenor Street, no coração de Londres. Seus nomes eram Andrei Lugovoi e Dmitry Kovtun.

Horas antes, a dupla havia passado pela alfândega britânica sem ser detectada. Lugovoi e Kovtun não levavam drogas ou quantias absurdas de dinheiro, entretanto, carregavam algo tão surreal que aquilo nunca havia sido visto antes no Reino Unido. 

A substância era polônio-210, um isótopo altamente radioativo. Segundo matéria do The Guardian, o material é, provavelmente, o veneno mais tóxico conhecido pelo homem quando ingerido ou inalado — mais de 100 bilhões de vezes mais mortal que o cianeto de hidrogênio.

Andrei Lugovoi e Dmitry Kovtun/ Crédito: Getty Images

O elemento tinha vindo de um reator nuclear russo. O trabalho de Lugovoi e Kovtun era simples: envenenar Alexander Litvinenko , um dissidente russo, funcionário do MI6 e crítico do Kremlin. A dupla foi enviada pelo Serviço de Segurança Federal da Rússia (FSB), em uma operação que, quase certamente, foi aprovada pelo presidente da Rússia, Vladimir Putin

O Polônio-210

Antes de entendermos o crime, primeiro precisamos entender como a arma usada para tal ato funciona. O polônio-210 é o que podemos chamar de elemento perfeito para um envenenamento

O primeiro ponto é que o elemento é um emissor de partículas alfa, o que torna sua radiação de curto alcance, sendo assim, incapaz de atravessar paredes; ou até mesmo sendo ‘interrompido’ por uma simples folha de papel ou por células mortas da pele, conforme explica matéria do TecMundo. Esse fato ficará claro mais pra frente. 

Imagem ilustrativa/ Crédito: YouTube/BBC Newsnight

O segundo fator é que o polônio é muito fácil de ser transportado. Outra característica é que a substância é capaz de matar com uma pequena quantidade, desde que ele seja ingerido ou inalado por uma pessoa, já que suas partículas radioativas estarão em contato direto com o tecido interno do corpo. 

Um último ponto relevante é que, como já dito, ele emite partículas alfa, o que o torna, praticamente, invisível para detectores de radiação comuns — que são feitos para ‘enxergarem’ radiação gama.

Os agentes trapalhões

Voltando ao caso, a Scotland Yard  nunca conseguiu estabelecer como Andrei Lugovoi e Dmitry Kovtun transportaram o polônio, afinal, as possibilidades são inúmeras: um recipiente com o veneno administrado por um conta-gotas tipo pipeta. Ou um spray tipo aerossol. Até mesmo uma caneta-tinteiro modificada pode ter sido usada.

Também nunca ficou claro se a dupla tinha ideia do perigo que levavam em suas mãos, afinal, os dois viveram a vida loucamente enquanto estiveram na Grã Bretanha. Ninguém em Moscou parece ter dito a eles que a substância tinha propriedades altamente radioativas, visto que deixaram um rastro químico por diversos lugares que passaram. Mais tarde, foi possível identificar várias coisas que os assassinos tocaram ou lugares onde estiveram. 

O contato entre Lugovoi, Kovtun e Litvinenko começou a ser tratado logo pela manhã. Às 11h49 daquele 16 de outubro, quando os dois desembarcaram no aeroporto de Gatwick, um primeiro contato foi feito com Alexander. Lugovoi havia se apresentado como um parceiro de negócios que dava conselhos para empresas que procuravam investir na Rússia. 

O opositor russo Alexander Litvinenko/ Crédito: YouTube/CBC News

Os assassinos viajaram de trem para o centro de Londres, onde se hospedaram no hotel Best Western na Shaftesbury Avenue, no coração do Soho. Saindo rumo ao encontro, eles quebraram uma das principais regras da espionagem: não chamar a atenção para si mesmo. 

De acordo com o The Guardian, eles não só eram assassinos, mas se pareciam como tal, trajados como dois gângsters. Kovtun estava vestindo um terno de poliéster metálico prateado e Lugovoi estava vestido de xadrez. Eles combinaram suas roupas brilhantes com camisas e gravatas coloridas. Além de usarem enormes jóias. 

Às 15h, Litvinenko os encontrou na Grosvenor Street. Esperando por eles estava Tim Reilly, o chefe da empresa, que por ventura falava russo. Após um pouco de conversa fiada, Lugovoi, em tom de brincadeira, sugeriu que todos bebessem um pouco de chá, visto que estavam na Inglaterra e precisavam respeitar o costume local. 

Reilly recusou, mas serviu uma xícara da bebida para cada um dos presentes na reunião. Pouco depois, Tim, por acaso, acabou indo ao banheiro, o que abriu a brecha perfeita para o polônio ser colocado no copo de Litvinenko

Uma arma nuclear invisível estava pronta para explodir. Lugovoi e Kovtun mal deviam estar prestando atenção na reunião, para eles, a única pergunta era: Litvinenko beberia o chá batizado? Ele não bebeu.

Pode-se imaginar o que deve ter passado pelas mentes da dupla quando a reunião terminou e a bebida permaneceu intocada. Constatou-se, posteriormente, que a mesa onde o encontro aconteceu estava cheia de material radioativo. 

Os russos, mais tarde, alegaram que foi Litvinenko quem os envenenou durante seu primeiro encontro significativo em Mayfair. Essa versão foi repetida para a mídia estatal russa, que a transmitiu como verdadeira.

Porém, a hipótese foi facilmente refutada quando a Scotland Yard reconstruiu a jornada de todos os envolvidos. Enquanto o trajeto de Litvinenko, de sua casa para Green Park, estava limpo; Lugovoi e Kovtun deixaram uma mancha nuclear sinistra onde quer que fossem, incluindo seus quartos de hotel, contaminado bem antes de seu primeiro encontro com Litvinenko

Após uma volta pela cidade, a dupla chegou ao hotel onde estavam hospedados por volta da 1 hora da manhã. Lugovoi manuseou polônio na privacidade de seu quarto, onde parece tê-lo transferido de um recipiente para outro. E depois ter jogado qualquer resto na pia do banheiro, onde leituras maciças de radiação alfa foram identificadas, aponta o The Guardian. No dia seguinte, os russos trocaram de hotel, muito provavelmente, para se distanciar do veneno, que Andrei Lugovoi havia derrubado no banheiro.

Na outra ponta dessa história, quando chegou em casa, Litvinenko sentiu-se levemente mal. Ele vomitou uma única vez. Seu espasmo de vômito foi devido à exposição à radiação — que pode ter sido causada por ele inalar um pouco do veneno que exalava de seu chá, mesmo à distância. 

Missão completa

Após a primeira falha, Andrei Lugovoi foi enviado novamente ao Reino Unido, desta vez sozinho. Ele voou em 25 de outubro de Moscou para Londres, no voo 875 da British Airways. Mais tarde, naquele dia, Lugovoi encontrou Litvinenko no Palm Court, no térreo, num salão de chá da tarde. Porém, por razões desconhecidas, também não foi desta vez que o plano foi concluído. 

Lugovoi não conseguiu implantar o último frasco de polônio. Uma explicação possível é que o bar Palm Court tinha câmeras de vídeo, que Lugovoi teria visto. Ou talvez suspeitasse que estava sendo observado. O certo é que a missão foi abortada. Litvinenko só foi envenenado na terceira tentativa, segundo aponta Luke Harding no livro ‘A Very Expensive Poison’. 

Em 1 de novembro de 2006, Litvinenko adoeceu repentinamente e foi hospitalizado. Ele morreu três semanas depois, tornando-se a primeira vítima confirmada da síndrome letal de radiação aguda induzida por polônio-210, conforme apontou o The Times. 

Em seu leito de morte, ele apontou a FBS e o presidente russo Vladimir Putin como os responsáveis pelo atentado."Você pode conseguir silenciar um homem, mas o uivo de protestos de todo o mundo, Sr. Putin, reverberará em seus ouvidos pelo resto da sua vida".

As investigações 

Em setembro de 2021, o Tribunal Europeu de Direitos Humanos, na França, concluiu que a Rússia foi a responsável pela morte de Alexander Litvinenko, mesmo com o Kremlin sempre negando as acusações. Porém, a corte europeia apontou que o “assassinato é imputável" ao governo russo.

O Tribunal Europeu de Direitos Humanos/ Crédito: YouTube/BBC Newsnight

Segundo o Tribunal, o Kremlin não respondeu de maneira “satisfatória” e tampouco conseguiu refutar as acusações do caso que foi conduzido no Reino Unido. Com isso, estabeleceu-se o pagamento de 100 mil euros em danos morais para a viúva de Litvinenko

Além do mais, o inquérito sugere que, muito provavelmente, Putin aprovou a operação. A investigação concluiu que Lugovoi e Kovtun colocaram em prática uma ação, que tudo leva a crer, que foi organizada pelo Serviço de Segurança Federal da Rússia (FSB).


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