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Matérias / Personagem

Gino Meneghetti, o Rei dos Ladrões

Este ítalo-brasileiro foi o mais famoso gatuno de São Paulo, roubando pessoas ricas com destreza e agilidade dignas de um circense

André Nogueira Publicado em 06/11/2019, às 08h00 - Atualizado às 08h51

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Gino Meneghetti em sua face clássica (direita) e em seu disfarce (esquerda) - Wikimedia Commons
Gino Meneghetti em sua face clássica (direita) e em seu disfarce (esquerda) - Wikimedia Commons

Gino Amleto Meneghetti foi uma figura curiosa da História de São Paulo: um dos mais articulados gatunos da cidade. Nascido em Pisa, em 1878, ele chegou ao Brasil fugindo da justiça italiana. Ele começou a roubar joias e relógios aos 14 anos, tendo como justificativa acabar com a fonte de “vaidade dos ricos”.

Um das principais características dos roubos de Meneghetti era sua performicidade, quase artística, quando o gatuno fugia pulando entre telhados e encontrando frestas por onde rastejar. Por diversas vezes, ele realizou fugas quase impossíveis com sua agilidade e rapidez.

Além disso, Meneghetti prezava pela sua imagem. Andava sempre de terno e chapéu, parecendo um homem comum, mas sempre que realizava um roubo, deixava um cartão com seu nome, para que todos soubessem que aquela era uma expropriação realizada pelo ardiloso imigrante italiano das ruas de São Paulo.

Exímio equilibrista / Crédito: Domínio Público

LADRÃO INCOMUM

Constante citador de Proudhon ("Toda propriedade é um roubo"), Meneghetti não se considerava ladrão. Também detestava violência, nunca agredindo sua vítima. Mesmo possuindo uma arma, não há registros de que algum dia ele a tenha utilizado contra uma pessoa. Por sua simpatia e por atacar a elite de São Paulo, rapidamente Gino se tornou conhecido.

O não-uso da violência era o principal ponto de seu código de ética particular. Além, disso, fazia questão de sempre agir sozinho, considerando que ninguém é confiável o suficiente para suportar a tortura sem soltar informações relevantes. Outro ponto importante: em hipótese alguma, Meneghetti roubava de um pobre ou um operário, focando nas joalherias ricas, mansões e casas de câmbio.

FUGA MIRABOLANTE

Gino conseguiu fugir de todas as prisões em que foi colocado. Porém, foi sua primeira fuga a que mais impressionou. Tentando cavar um túnel de escape junto a um companheiro de cela, ele foi transferido para a solitária, dentro de um poço estreito e profundo. Então, de madrugada, ele usou suas habilidades quase circenses e subiu pelas paredes do poço até chegar na grade de ferro, que arrancou na unha.

Então, ele se esgueirou pelo pátio da prisão sem ser visto até chegar numa saída, numa ponte alta sobre o Rio Tamanduateí. Arrancou suas roupas e se lançou no rio, nadou até a margem, subiu numa casa e seguiu seu caminho pulando entre telhados até chegar na casa de um tio. Lá, vestiu novas roupas e rebateu a friagem com uma dose de cachaça.

Meneghetti sai da prisão / Crédito: Wikimedia Commons

A polícia só relatou a fuga no dia seguinte. Então, saíram em busca dele, o que durou anos. Em um dos casos, Meneghetti chegou a comparecer a uma coletiva de imprensa com o chefe da polícia, sem o bigode, e se sentou ao lado do delegado, enquanto eles prometiam pegar o ladrão em menos de dois dias. Ao sair daquela sala, Meneghetti entregou a um jornalista um bilhete com as palavras: "Então por que não me prendeu agora? Eu era aquele rapaz de chapéu e roupa clara, sentado à sua esquerda".

Para Roberto Moreira, chefe de polícia, o caso foi desmoralizador. Então, prender Meneghetti se tornou questão de honra. Em 1926, a polícia plantou uma base na frente da esposa do larápio, Concetta, e lá esperaram por semanas, até Gino aparecer e receber voz de prisão. Então, ele se trancou na casa, dando início a um cerco de dez horas e 200 agentes.

No desespero, o italiano tentou atravessar a cidade pelos telhados, entrou numa latrina, se escondeu em diversos pontos da cidade, fugiu de policiais que se mantinham próximos, chegou a cair de um toldo em cima de um jantar de família e ainda tentou retornar para a casa da esposa, para despistar a polícia que o prosseguia. Quando ficou encurralado, foi obrigado a se entregar.

Com Meneghetti em mãos, a polícia começou a espancar o gatuno, enquanto uma multidão assistia incrédula, após acompanhar toda a operação. Muitos, inclusive, estavam chocados por acharem, até aquele momento, que Meneghetti era uma lenda.

Com o rosto desfigurado, ele foi levado para a delegacia, onde foi obrigado, por tortura, a admitir crimes de assassinato que não cometeu. Então, foi lançado numa solitária, onde passou 15 anos sem comunicação ou luz do sol. Relatos afirmam que, nesse tempo, ele ficava gritando: "Io sono un uomo!" ("Eu sou um homem!") para qualquer um que passasse.

Crédito: Domínio Público

DEPOIS DA PRISÃO

Meneghetti saiu da prisão em 1944, partindo para pequenas cidades na Região Sul, onde praticou alguns roubos. Depois, voltou para São Paulo, onde tentou trabalhar num emprego regular. Porém, como as condições do trabalho eram, como de costume, péssimas, voltou a roubar. Com seu jeito bon-vivant, Gino gostava de comer em restaurantes caros e jogar em cassinos. Gastava muito dinheiro com vontades, e o que sobrava era doado aos pobres, que via como vítimas do sistema regulado pelos verdadeiros ladrões.

O gatuno mais famoso de São Paulo ainda foi preso algumas outras vezes, passando até a ficar duas semanas com pés, punhos e pescoço atados num tronco de escravo. Na última vez em que foi preso, em 1970, ele tinha 92 anos de idade. Foi pego em flagrante tentando arrombar um palacete da Fradique Coutinho com seu velho companheiro, o pá de cabra.

Meneghetti morreu em 1976, pobre e sozinho. Seu corpo foi cremado pelo (único) confidente, Paulo José da Costa Jr., que o lançou em alguma rua de São Paulo, atendendo a seu último pedido: "Não tenho nenhuma razão plausível para estar cá nesta terra que me causa nojo. Que o vento espalhe meu pó e que ele se dilua no ar."


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