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Matérias / Personagens

Rasputin, o bruxo que criou um reinado paralelo na Rússia

O conselheiro de Alexandra, a esposa do último czar do país, chegou a nomear ministros e despertou o ódio da sociedade

Ricardo Giassetti Publicado em 30/12/2019, às 09h05

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Rasputin em fotografia do Império Russo - Domínio Público/ Klimbim
Rasputin em fotografia do Império Russo - Domínio Público/ Klimbim

A Primeira Guerra Mundial, travada entre 1914 e 1918, mostrou à Europa que não havia nada de nobre em conflitos militares. Enquanto milhões de corpos jaziam empilhados nas trincheiras, o Império Russo estava na rabeira, defasado em treinamento e tecnologia.

Em setembro de 1915, o czar Nicolau Romanov II tomou uma decisão dramática: substituir o grão-duque Nicolau Nikolaievich, seu primo, no comando do Exército russo.

Estrategicamente, era uma péssima idéia. Nicolau II não tinha a mínima competência para guiar tropas em batalha. O que seria capaz de convencê-lo, então, a abandonar a capital São Petersburgo e ir para o front no oeste? Simples: a insistência de sua esposa, Alexandra.

Por trás dos palpites da czarina estava uma profecia do seu conselheiro particular, o lendário Rasputin. Após o início da guerra, ele havia previsto que, caso Nicolau II não assumisse pessoalmente o controle das forças russas, o Império seria derrotado. Para o ardiloso profeta, entretanto, importava menos o sucesso militar da Rússia do que suas ambições particulares.

“Alexandra tinha grande poder sobre Nicolau e, como Rasputin tinha influência sobre ela, a manipulação das decisões era bastante fácil”, diz David Saunders, professor de História Russa da Universidade de Newcastle, na Inglaterra.

O bruxo Rasputin / Crédito: Wikimedia Commons

A submissão da czarina às ideias de Rasputin tinha um motivo claro: o curandeiro teria o poder de salvar Alexei, o herdeiro do Império, da chamada doença real — nome dado à hemofilia. Na ausência de Nicolau II, a czarina assumiu o trono e colocou-se na posição de refém de Rasputin, que passou a nomear até ministros de Estado.

Com a presença dos oportunistas indicados pelo conselheiro, o Império Russo caiu no caos e a corrupção se alastrou. Enquanto isso, na frente de batalha, Nicolau II despejava seus soldados para a morte certa.

A crise fez crescer a insatisfação com a monarquia e com os desmandos de Rasputin. E ele não tinha opositores apenas dentro da Rússia. Para Inglaterra e França, ter os russos como aliados na guerra era crucial para dividir as forças encabeçadas pela Alemanha em duas frentes.

Ver o patético czar no front enquanto Rasputin implodia o Estado não interessava nem a ingleses nem a franceses. Com tantos inimigos, o conselheiro real vivia com a cabeça a prêmio. Seu assassinato chegou a ser planejado algumas vezes, sem sucesso. Foi só na madrugada de 17 de dezembro de 1916 que um grupo de conspiradores conseguiu, a duras penas, dar cabo do bruxo.

Rumo ao topo

Rasputin provavelmente veio ao mundo entre 1863 e 1873, batizado como Grigori Efimovich Novykh. Até a juventude, morou na cidade siberiana de Pokrovskoye. Apesar de começar a pregar a palavra de Deus desde os 11 anos, o jovem ficou conhecido por sua queda por sexo e álcool. Aos 18 anos, ele foi a um monastério e conheceu a seita Khlysty, que pregava a prática dos piores pecados para salvar a alma.

Para os seguidores da seita, só quem havia pecado ao máximo conseguiria a redenção máxima. Filha de Grigori, Maria sempre defendeu que ele havia rejeitado a seita, por sua repulsa à ideia de autoflagelação praticada por eles. No entanto, ele defendia algo parecido — que ceder à tentação era uma forma de humilhação diante de Deus e, portanto, o caminho para a salvação. Passou a ser conhecido como Rasputin — que significa depravado em russo.

De volta à cidade natal, ele casou-se com Proskovia Fyodorovna, com quem teve duas filhas e um filho. Mas suas aspirações não cabiam em uma aldeia tão remota. Rasputin decidiu então peregrinar pela Grécia e por Jerusalém, desenvolvendo suas próprias doutrinas. Em 1903, ao retornar à Rússia e se estabelecer em São Petersburgo, ele já era considerado um staretz — homem santo, adivinho e curandeiro. Graças a suas boas relações com a Igreja, conseguiu se aproximar da elite do Império.

Os romanov / Crédito: Klimbim

Naquela época, a Rússia passava por um período de extrema instabilidade. Com a morte do grande estadista Alexandre III, o poder caiu nas mãos do infantilizado Nicolau II, que claramente não tinha visão para reger os complexos trâmites do Império. Para desgosto dos pais, ele havia escolhido casar-se com Alexandra, de ascendência germânica e bisneta da rainha Vitória da Grã-Bretanha. Isolado do resto da corte, o casal se empenhou em produzir um herdeiro.

Quinto filho do casal real (depois de quatro meninas), Alexei nasceu em 1904. Sua doença hemorrágica mobilizava médicos, místicos e religiosos dentro e fora da Rússia. Percebendo a oportunidade, Rasputin moderou sua vida de libertino e esperou um convite para ir ao palácio real.

Em 1905, sob recomendação de uma amiga de Alexandra, Rasputin foi chamado para uma audiência com a czarina durante uma das crises de Alexei. Não se sabe exatamente como, mas ele fez parar o sangramento.

Apesar de seu sucesso como curandeiro, o iletrado e fedorento místico era visto como péssima influência na corte. Era odiado por seus hábitos extravagantes, temido por sua suposta paranormalidade e execrado por ter origem pobre. Boatos diziam que Rasputin estava frequentando a cama de Alexandra e praticando jogos sexuais com as filhas dela.

O próprio bruxo alimentava a fama, proclamando suas supostas conquistas durante banquetes regados a vodca. Não demorou para que a polícia secreta russa fizesse chegar aos ouvidos de Nicolau II informações sobre tais fanfarronices.

Advertido, Rasputin negou os fatos, atribuindo-os à inveja da sociedade. Não adiantou. Nem mesmo um pedido pessoal de Alexandra ao czar evitou que Rasputin fosse enviado de volta para Pokrovskoye. Mas ele voltaria.

Durante a temporada de caça de 1912, os Romanov foram passar férias em Spala, na Polônia, onde Alexei teve outra crise aguda de sua doença. Depois que os médicos da corte desenganaram a criança, Nicolau II chegou a encomendar um funeral. Alexandra, em desespero, enviou um telegrama para Rasputin, que prontamente respondeu: “Não se preocupe. O pequenino não morrerá. Não deixe que os médicos o aborreçam”.

Dias depois, Alexei estava recuperado. Rasputin retomou assim seu lugar na corte. “O que quer que tenha acontecido em Spala naquele outono mudou a vida de Alexandra. Enquanto Rasputin estivesse ao seu lado, seu filho viveria e tudo estaria bem”, diz Greg King, autor de The Last Empress (A última imperatriz). 

Entretanto, o seu fim foi trágico: em dezembro de 1916, Rasputin foi envenenado, baleado e jogado em um rio para ter o seu óbito confirmado. Acredita-se ainda que seus assassinos o castraram antes de jogá-lo no rio — o pênis do bruxo, de 28,5 centímetros de comprimento, está exposto em um museu de sexo e erotismo em São Petersburgo.