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Matérias / Japão

Saigo Takamori: A queda do último samurai

Em 1877, em rebelião aberta, morreu aquele que era considerado o último verdadeiro samurai

Ramon Botifa Publicado em 11/07/2019, às 05h00

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Saigo Takamori, por Edoardo Chiossone - Wikimedia Commons
Saigo Takamori, por Edoardo Chiossone - Wikimedia Commons

Desde que o Japão havia se aberto para o mundo após ser ameaçado pelos canhões do Comodoro Perry, em 1853, o país havia passado por uma avassaladora onda de modernização, que terminaria em guerra civil, dando fim ao xogunato.

Em 1869, o imperador Meiji, então com 17 anos, mudou-se com sua corte de Kyoto para Tóquio (ex-Edo), oficialmente a nova capital do país. O novo governo, controlado por burocratas da oligarquia que havia derrubado o xogunato, iniciou uma série de reformas para modernizar o Japão.

Em 1871, aboliu o sistema de domínios, substituídos por províncias administradas por governadores nomeados pelo imperador, em lugar dos senhores feudais que transmitiam o poder hereditariamente. Os samurais, que haviam sido decisivos para o fim do xogunato de Tokugawa, acabariam sendo mortalmente atingidos no novo regime.

Com a assessoria militar francesa, o governo Meiji criou, em 1873, um exército de conscritos — todo homem que fizesse 21 anos, independentemente de sua origem social, teria de se alistar para servir as Forças Armadas. Em 1876, os samurais foram proibidos de portar espadas — somente militares uniformizados do novo exército poderiam carregar a arma.

Na prática, isso representava a extinção da classe dos samurais. O golpe final veio com a abolição do estipêndio pago aos samurais — que recebiam um salário fixo, proveniente da taxação do arroz produzido pelos camponeses. Com isso, cerca de 2 milhões de samurais, 6% da população japonesa da época, viram-se da noite para o dia obrigados a buscar outra atividade para sustentar-se.

O fim dos antigos privilégios, naturalmente, causou muita insatisfação entre os samurais. Um dos mais descontentes com a nova situação era Saigo Takamori, o personagem que inspirou o filme O Último Samurai (2003). Takamori tinha sido um dos cabeças do movimento que pusera fim ao xogunato de Tokugawa. No novo regime, ele chegou a atuar como conselheiro do imperador Meiji.

Aos poucos, porém, começou a se sentir desconfortável nesse cargo. Deixou o governo em 1873, depois de ver rejeitada sua proposta de invadir a Coreia. Takamori via nessa ação militar uma forma de reviver a antiga importância dos samurais.

Takamori voltou para Satsuma, sua terra natal, e fundou uma academia militar. Logo reuniu um grande número de ex-samurais insatisfeitos, foco de uma rebelião contra o governo que explodiria em janeiro de 1877. Takamori chegou a contar com 25 mil guerreiros, mas eles não eram páreos para o Exército imperial de 300 mil soldados treinados por instrutores ocidentais e equipados com artilharia pesada. Os confrontos duraram oito meses.

Saigo Takamori (centro, em uniforme ocidental) durante sua rebelião / Crédito: Reprodução

No dia 24 de setembro de 1877, os rebeldes — já reduzidos a 400 homens — foram encurralados na colina de Shiroyama. A tropa imperial contava com 30 mil soldados e o apoio de cinco navios de guerra. Em pouco tempo, os últimos samurais foram dizimados.

Baleado no estômago, Takamori cometeu seppuku para não ser capturado. Sem chance de escapar com vida, os últimos 40 rebeldes avançaram com suas espadas sobre a tropa imperial. Foram mortos um a um por rajadas de metralhadoras.

Em 1889, o governo Meiji absolveu postumamente Takamori pelos crimes de rebeldia e traição. Nem precisava: os japoneses já o haviam colocado no seu panteão de grandes heróis.

O legado dos guerreiros

Com as reformas introduzidas pelo governo Meiji no final do século 19, os samurais perderam o direito de portar espadas — consideradas a alma do guerreiro — e deixaram de existir como classe social. Parecia não haver mais lugar para eles num país em rápida ocidentalização.

Mas os ideais forjados ao longo de sete séculos no comando do país não desapareceriam tão facilmente. O caminho natural para os samurais era seguir a carreira militar. Muitos se alistaram como voluntários no recém-criado Exército imperial. Se antes eles deviam lealdade ao senhor feudal e ao xogum, agora lutariam em nome do imperador.

Em 1894, os chineses enviaram tropas à Coréia para sufocar uma revolta. Os japoneses, que sonhavam controlar a península coreana, também mandaram soldados para a região. Teve início a Guerra Sino-Japonesa, que terminaria no ano seguinte com a esmagadora vitória dos nipônicos. Dez anos depois, interesses geopolíticos conflitantes na mesma região levaram o Japão à guerra contra um inimigo mais poderoso, a Rússia.

Para a surpresa dos ocidentais, a Rússia foi derrotada em 1905. Em apenas três décadas, o Exército japonês estava pronto para servir aos interesses expansionistas do novo império. O triunfo sobre os chineses e russos pode ser creditado em parte aos ex-samurais. Muitos já ocupavam postos-chave no Exército imperial.

O legado dos samurais não se restringe ao campo militar. Tirando proveito do nível de educação acima da média, muitos ex-guerreiros conseguiram se destacar nas mais diferentes atividades, da literatura à ciência, da política aos negócios. Os grupos Mitsubishi, Mitsui e Sumitomo, três dos maiores conglomerados empresariais japoneses, foram fundados por famílias de samurais. Os valores que formavam o bushido — como disciplina, autocontrole e perseverança — até hoje fazem parte das características mais associadas aos japoneses.

Os infatigáveis assalariados japoneses — ou salarymen, como são conhecidos —, a força motriz da transformação do país em potência econômica, vêem-se como os samurais dos tempos modernos. Com uma diferença: enquanto seus ancestrais se sacrificavam pela honra do senhor feudal, os assalariados tudo fazem pelo crescimento das empresas onde trabalham.


Saiba mais

Code of the Samurai, Thomas Cleary, Tuttle
Hagakure, Yamamoto Tsunetomo