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Matérias / Segunda Guerra

Manobras táticas: a curiosa saga dos tigres voadores da Segunda Guerra

No conflito, um grupo de voluntários americanos se candidatou a enfrentar os japoneses na China

Roberto Navarro Publicado em 25/01/2021, às 10h00 - Atualizado às 12h00

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Uma das aeronaves - Wikimedia Commons
Uma das aeronaves - Wikimedia Commons

Era uma ensolarada tarde de 20 de dezembro de 1941 em Yunnan, no sudoeste da China, e os pilotos conversavam do lado de fora do barracão que servia de posto de comando. Foi quando tocou o telefone de campanha.

O encarregado pegou o fone, ouviu por um breve instante e virou-se enquanto gritava: “Decolar!”. Os pilotos correram para seus aviões ao mesmo tempo em que os mecânicos tratavam de dar partida nos motores dos P-40 com bocas de tubrões pintadas nos radiadores sob o nariz.

Em pares, os caças correram pela pista de terra e, em dez minutos, estavam todos no ar, prontos para a ação. Eles rumaram para o sul e em pouco tempo avistaram uma formação de bombardeiros japoneses Kawasaki Ki-48 com dez aeronaves, voando para atacar Kunming, a capital da província.

Os caças americanos fizeram uma curva para a direita, investindo contra o inimigo com suas metralhadoras, que cuspiam fogo.

Três bombardeiros foram atingidos e começaram a cair, enquanto um quarto sofreu danos tão pesados que não conseguiu retornar a sua base, em Hanói. Os bombardeiros restantes foram obrigados a despejar suas bombas antes de chegar ao alvo e dispersaram-se, tomando o caminho de casa.

Com quatro aviões japoneses abatidos e nenhuma baixa entre os seus, a vitória dos pilotos americanos era total. Depois desse episódio, os aviadores japoneses jamais voltaram a tentar bombardear Kunming – eles sabiam que os P-40 estavam à espreita e patrulhavam as imediações. Nascia aí a lenda dos Tigres Voadores.

A história, na verdade, começou um pouco antes, em 1940, quando as unidades aéreas russas que combatiam na Guerra Sino-Japonesa foram retiradas da China e o general que governava o país, Chiang Kai-shek, pediu que esquadrões americanos as substituíssem.

Chiang também pediu permissão para recrutar aviadores americanos que pudessem pilotá-los, mas isso não podia ser feito oficialmente, pois os Estados Unidos não estavam em guerra. No entanto, a solicitação foi aprovada em segredo pelo presidente Franklin Roosevelt e, no inverno de 1940-1941, o capitão Claire Chennault foi indicado para dirigir o projeto.

Ele começou supervisionando a compra de cem caças Curtiss P-40, enquanto recrutava cem pilotos e cerca de 200 mecânicos e armeiros. Dos pilotos, 40 vinham da Força Aérea do Exército, e os outros 60 eram da Marinha e do Corpo de Fuzileiros Navais.

Todos eram voluntários e deram baixas de seus postos nas Forças Armadas americanas, sendo imediatamente contratados pela Força Aérea da República da China, embora oficialmente fossem empregados de uma empresa privada, a Central Aircraft Manufacturing Company, que os contratara para realizar atividades de treinamento e instrução.

O pagamento era excelente: 600 dólares mensais para cada piloto, 675 para os aviadores mais experientes e 750 para os líderes de esquadrão, além de um bônus adicional de 500 dólares por avião inimigo derrubado. Para efeito de comparação, um capitão da Força Aérea americana recebia na época, no máximo, 347 dólares por mês.

Manobras táticas

Em meados de 1941, 300 homens disfarçados de turistas e portando passaportes que os identificavam como civis embarcaram num navio de passageiros com destino à Birmânia. Eles foram temporariamente acomodados numa base aérea britânica em Toungoo, onde seus aviões foram montados e fizeram os primeiros vôos de teste.

Chennault desenvolvera diversas táticas para compensar a inferioridade numérica de suas forças, enfatizando que seus pilotos deviam enfrentar o inimigo em grupos, evitando combates individuais.

Também deviam tirar partido do melhor desempenho de suas aeronaves em batalhas a grande altitude, quando os P-40 eram capazes de superar os problemas de manobrabilidade encontrados em outras situações.

Ao contrário do que preconizava a doutrina tradicional, seus aviadores também eram instruídos a realizar mergulhos acentuados para aproveitar a velocidade superior que seus caças alcançavam em comparação aos Zeros nipônicos. Dezenove pilotos do grupo atingiram a condição de “ases”, ao abater pelo menos cinco inimigos, sendo que o maior deles, Robert Neale, conquistou 13 vitórias.

Chennault estabeleceu ainda um eficiente sistema de observadores no chão, munidos de binóculos e encarregados de dar o alerta avançado assim que fossem identificadas as primeiras formações de aeronaves inimigas.

Esses observadores dispunham de telefones de campanha e mantinham-se em contato constante com o posto de comando localizado no campo de pouso que servia de base para a unidade, no interior de Yunnan.

Manter a resistência chinesa às tropas invasoras do Exército Imperial do Japão era essencial para a estratégia militar dos Estados Unidos na Ásia. Desde 1938, as forças invasoras japonesas ocupavam a maior parte da China e controlavam 95% de sua indústria.

Chennault tinha bom trânsito junto ao governo da China e sabia da importância estratégica do país para os planos americanos. Ele conseguiu o apoio do governante chinês, Chiang Kai-shek, para seu plano de usar bases aéreas no interior da China para hostilizar os japoneses.

Quem visita hoje Kunming ainda encontra quem se lembre dos Tigres Voadores e de suas farras pela cidade, entrando de jipe nos bares e arrancando as saias das mulheres locais, em meio a memoráveis bebedeiras. A disciplina não era o forte do grupo, mas, mesmo assim, eles abateram quase 300 aviões inimigos, perdendo apenas 14 aeronaves em missões de combate.

Foram finalmente dissolvidos em julho de 1942, sendo substituídos por unidades da Força Aérea do Exército americano. Uma curiosidade: as bocas de tigre que decoravam seus caças foram copiadas de uma foto publicada pela revista India Illustrated Weekly mostrando um caça britânico em ação no deserto da Líbia.

Como era 

A aeronave / Crédito: Wikimedia Commons

O P-40 era o principal caça dos Estados Unidos em serviço quando a Segunda Guerra começou – mais de 13 mil unidades foram fabricadas, ao custo unitário de cerca de 60 mil dólares. Era um monomotor totalmente construído em metal.

Seu motor radial de 14 cilindros Pratt & Whitney R-1830 era capaz de produzir 1 040 hp ao nível do mar. Recebeu o nome de Warhawk da Força Aérea americana, mas os britânicos, que também utilizaram o avião, preferiam chamá-lo de Tomahawk ou Kittyhawk.

Em suas diversas versões, costumavam ser armados com até seis metralhadoras M2 Browning calibre .50 montadas nas asas, transportando nos magazines 281 cartuchos para cada arma. Quando totalmente armados e abastecidos, chegavam a pesar quatro toneladas e voavam a uma velocidade máxima de 580 quilômetros por hora.

Serviram nas forças aéreas de 18 países (inclusive no Brasil). Contavam com tanques de combustível auto-selantes, forrados com borracha, para conter vazamentos quando atingidos. Modelos mais avançados receberam um motor de maior potência fabricado pela Allison e foram armados com um par de canhões. 50 em cada asa.