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Matérias / Crimes

Caso Liana Friedenbach e Felipe Caffé: A discussão em torno de Champinha

Casal foi brutalmente assassinado em meados de 2003; duas décadas depois, porém, o assunto ainda chama atenção

Pamela Malva/ Atualizado por Fabio Previdelli Publicado em 12/01/2021, às 14h24 - Atualizado em 01/09/2023, às 14h24

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Fotografia de Felipe Caffé e Liana Friedenbach - Arquivo Pessoal
Fotografia de Felipe Caffé e Liana Friedenbach - Arquivo Pessoal

"Champinha já pagou o que devia". Ari Friedenbach reconhece que sua afirmação, em entrevista ao Balanço Geral, pode parecer meio chocante, mas é assim que enxerga a situação de Roberto Aparecido Alves Cardoso, responsável pelo assassinato de sua filha, Liana Friedenbach, há 20 anos.

+ Após 20 anos, pai de Liana Friedenbach diz que Champinha 'pagou o que devia'

Liana tinha apenas 16 anos quando foi assassinada, em 5 de novembro de 2003. Dias antes, ela havia saído de viagem com seu namorado, Felipe Caffé, de 19, que também foi morto — no dia 2 novembro.

Cinco pessoas foram presas pelos crimes de sequestro, tortura, estupro e assassinato. Segundo o TAB, do UOL, apenas duas continuam presas, sendo Champinha, que tinha 16 anos na época, uma delas.

Ari Friedenbach em entrevista ao Balanço Geral/ Crédito: Reprodução/Record TV

"Champinha já pagou o que devia. Pode parecer meio chocante [essa afirmação], mas é o que eu penso. Nós temos uma legislação no país e o tempo máximo para maior de idade ficar preso é de 30 anos. No caso de Champinha, que cometeu o crime quando era menor, ele estava sob medida socioeducativa e hoje está na unidade experimental de saúde, interditado civilmente, ele não está na Fundação Casa e nem no presídio, e vai completar 20 anos nessa situação", explicou Ari em entrevista ao Balanço Geral.

Relembre os brutais assassinatos de Liana Friedenbach e Felipe Caffé, e entenda a discussão em torno da prisão de Champinha — que até hoje gera debates sobre a redução da maioridade penal e da Lei Antimanicomial no país.

O crime

Quando tinha cerca de 16 anos, a estudante Liana Friedenbach, nascida em maio de 1987, estava apaixonada por Felipe Caffé, um jovem de 19 anos. O casal havia planejado uma viagem romântica em outubro de 2003.

Como o relacionamento ainda era recente, a jovem disse para sua família que viajaria à Ilhabela com um grupo de amigos; Felipe, por sua vez, alegou que iria acampar, sem dar mais detalhes.

Os dois, de fato, foram acampar, mas em um sítio abandonado no município de Embu-Guaçu, na Grande São Paulo. Eles, porém, não esperam pelo pior. A aventura logo se tornou o pior pesadelo do jovem casal, que não contava com a crueldade de um terceiro adolescente.

Fotografia de Liana Friedenbach na época dos crimes / Crédito: Arquivo Pessoal

No dia 31 de outubro, poucas horas antes de cair na estrada, o jovem casal esperou pelo horário de seu ônibus no famoso vão livre do MASP, na Avenida Paulista, em São Paulo. Às 5h do dia 1º de novembro, então, eles chegaram no Terminal Rodoviário Tietê.

De lá, Liana e Felipe desembarcaram em Embu-Guaçu, por volta das 9 horas, onde pegaram outro ônibus para o lugarejo de Santa Rita, que ficava perto do sítio abandonado — eles ainda andaram cerca de 4,5 quilômetros a pé até o local para acampar, aponta a Folha.

Na manhã seguinte, foram encontrados por Champinha e Pernambuco, que resolveram assaltar o casal no início da tarde. O que os ladrões não esperavam, contudo, que os jovens não tinham qualquer dinheiro consigo e decidiram sequestrá-los. Liana havia dito que pertencia a uma família rica e propôs que os criminosos pedissem dinheiro para seu resgate em troca de sua libertação.

Importante salientar que Roberto Aparecido Alves Cardoso, o Champinha, então com 16 anos, era natural de Embu-Guaçu. Diferente de todos os outros meninos da região, contudo, ele já demonstrava sinais de psicopatia desde muito pequeno. Para o sequestro de Liana e Felipe, Champinha estava acompanhado de seu braço direito, Paulo César da Silva Marques (Pernambuco).

Fotografia de Champinha / Crédito: Reprodução

Logo na primeira noite do sequestro, os jovens foram levados até a casa de Antonio Matias de Barros, outro criminoso amigo dos assaltantes, e Felipe foi jogado em um quarto. No cômodo ao lado, Liana foi estuprada por Pernambuco.

Já no dia 2 de novembro, os comparsas perceberam que Felipe não faria muita diferença para o plano. Assim, enquanto Champinha levava Liana para outro cativeiro, Pernambuco carregou o garoto para um matagal, onde atirou em sua nuca. Ao longe, a menina escutou o disparo que matou seu namorado. Posteriormente, aponta a Folha, Pernambuco teria dito à Liana que Felipe havia sido libertado e fugiu.

Uma vez na casa de Antônio Caetano da Silva, Champinha já não se preocupava mais com o resgate de Liana. Com a menina em suas mãos, ele começou a estuprá-la. Foi apenas no terceiro dia do desaparecimento dos jovens que, preocupado, o pai da garota decidiu acionar o Comando de Operações Especiais. Àquela altura, Ari já havia descoberto que a filha tinha mentido para viajar com Caffé.

Em busca de Liana e Felipe, as autoridades encontraram os celulares, carteiras e peças de roupa dos jovens no matagal. Nesse meio tempo, aos amigos que chegavam no cativeiro, Champinha apresentava Liana como sua namorada.

Ainda no terceiro dia, o jovem criminoso e mais dois comparsas, Antônio Caetano e Agnaldo Pires, estupraram Liana coletivamente. Mais tarde, percebendo um certo movimento da polícia na região, o irmão de Champinha decidiu avisá-lo.

Sob o pretexto de que levaria a suposta namorada para a rodoviária, o adolescente guiou Liana até o meio do mato e a executou ali mesmo, no dia 5 de novembro. Foram dezenas de facadas até que a jovem finalmente parasse de respirar.

Os corpos de Liana e Felipe foram encontrados apenas no dia 10 de novembro, poucas horas antes de Champinha e seus comparsas serem capturados. Em julho de 2006, três dos capangas foram condenados: Antonio Caetano da Silva (pegou 124 anos de prisão), Agnaldo Pires (47 anos) e Antônio Mathias de Barros (6 anos).

Em 2007, Pernambuco foi condenado a 110 anos e 18 dias de prisão, pelo assassinato de Felipe. Champinha, por sua vez, foi condenado a três anos na Fundação Casa, por ser menor de idade na época dos crimes — decisão que revoltou a população.

Champinha já preso, na época dos crimes / Crédito: Reprodução/Video/YouTube

Quando completou a maioridade, no entanto, o jovem passou por uma bateria de exames psiquiátricos, que atestaram uma saúde mental instável. Assim, por apresentar um alto grau de ameaça para a sociedade, Champinha permanece numa Unidade Experimental de Saúde (UES), na Vila Maria, até hoje, onde deve ficar preso por tempo indeterminado.

O debate por Champinha

Conforme revela o UOL Tab, por ser menor de idade à época, Champinha foi levado à antiga Febem, hoje Fundação Casa, por onde não poderia ficar mais de três anos detido. Mas a situação não foi bem assim, visto que uma decisão judicial o manteve por lá.

Quando tinha 21 anos, o criminoso tentou fugir e, assim, acabou sendo levado para a recém-criada Unidade Experimental de Saúde (UES), na Vila Maria, Zona Norte da capital paulista. O local é considerado um equipamento único no país, sendo destinado a egressos maiores de idade da Fundação Casa que foram responsáveis por atos infracionais graves, que possuem diagnóstico de transtorno de personalidade antissocial e laudos de alta periculosidade.

A UES não se trata de uma prisão e tampouco um hospital psiquiátrico, mas sabe-se que seu atendimento médico é precário. Os medicamentos aplicados aos 'moradores' de lá não são informados, assim como não é relatado os avanços no tratamento de cada um. Atualmente, quatro pessoas vivem na UES, que é considerado um "limbo" entre a saúde e o sistema penitenciário.

Champinha permanece no local sem uma sentença que determine o quanto tempo ele deverá ficar por lá — algo debatido por Ari Friedenbach: "Agora nós temos que pensar em como lidar com essa situação após 20 anos. Ele está internado nessa unidade experimental de saúde. Vamos mantê-lo recluso ou colocá-lo em liberdade?".

"Como será feito esse acompanhamento e quem vai dar esse tratamento a Champinha? Esse é o debate, é uma questão que a sociedade tem que parar para pensar. Não basta a gente simplesmente resolver jogando a chave da masmorra no lixo ou simplesmente achando que a situação pode perdurar eternamente. Como a sociedade vai poder receber uma pessoa como essa?", prosseguiu.

Este, porém, não é o único debate em torno de Champinha. Ari recorda que o assassinato de sua filha já foi usado como argumento para defender a diminuição da menor idade penal no país. Em estado de choque, após o caso, o pai de Liana chegou a defender a medida, mas sua opinião é totalmente contrária hoje em dia.

Além disso, o caso de Champinha também foi usado para desinformação. Em junho, a Resolução n. 487 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) determinou novas diretrizes para a aplicação da Lei Antimanicomial — da qual parlamentares tentaram barrar argumentando que criminosos como Champinha voltariam às ruas.

A Resolução n. 487 apresenta avanço nos esforços para as mudanças na assistência à saúde mental para pessoas em conflito com a lei, aponta o próprio site do CNJ, orientando a desinstitucionalização de apenados com transtorno mental, além da adoção de medidas preventivas, tratamento individualizado e ambulatorial. Champinha, assim como os demais internos da UES, não são afetados com a decisão.