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Matérias / Argentina

Morre Hebe de Bonafini, líder das 'Mães e Avós da Praça de Maio' durante a ditadura na Argentina

A importância das netas, mães e suas avós no movimento pela reparação dos danos causados durante um governo opressor da América Latina

Redação Publicado em 10/05/2020, às 12h00 - Atualizado em 21/11/2022, às 13h43

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Hebe de Bonafini - Getty Images
Hebe de Bonafini - Getty Images

Faleceu aos 93 anos no último domingo, 20, Hebe de Bonafini. Importante nome da história da América Latina, ela liderou as 'Mães e Avós da Praça de Maio'. A morte da ativista foi revelada por Cristina Kirchner, vice-presidente da Argentina.

"Caríssima Hebe, Mãe da Plaza de Mayo, símbolo mundial da luta pelos direitos humanos, orgulho da Argentina. Deus te chamou no Dia da Soberania Nacional... Não pode ser uma coincidência. Apenas obrigado e adeus", escreveu Cristina através de sua conta no Twitter. 

Mas quem foram as 'Mães e Avós da Praça de Maio' e qual a importância do grupo na história da resistência à ditadura militar no país?

Assim como a Comissão Nacional da Verdade aqui no Brasil, a Argentina possui diversos grupos de memória que tentam reconstituir o trajeto de perseguidos políticos na ditadura para reaver os acontecidos durante a repressão e atingir um critério de justiça contra as graves violações dos direitos humanos dos governos militares na América Latina. Uma das principais organizações da Argentina para isso é a Associación Civil Madres de Plaza de Mayo (Mães da Praça de Maio), que é diretamente associada às Avós da Praça de Maio.

A missão desses grupos é localizar e reconstituir o caminho percorrido pelas crianças que foram sequestradas e torturadas durante o regime militar na Argentina entre 1973 e 1986. Em 2020, por exemplo, o grupo foi responsável por encontrar a “neta 129”, garota nascida no cárcere (sua mãe era presa política) e que foi identificada aos 42 anos, na Espanha. Eles usam a numeração para não expor a identidade das vítimas.

Protesto em 1977 / Crédito: Wikimedia Commons

A ditadura militar da Argentina foi uma das mais sangrentas do continente, responsável pela morte e desaparecimento de milhares de opositores políticos e particularmente marcada pelo desaparecimento e sequestro de diversas crianças cujas famílias pertenciam a círculos da oposição ao regime.

O mesmo ocorreu em outros países como Brasil, Chile e Paraguai, mas a articulação do governo militar argentino, o Exército, empresas nacionais e estrangeiras, a CIA e a Mossad em criar redes de sequestro de crianças era singular.

As crianças iam parar nessa situação por diversos motivos: eram usadas na tortura dos pais, ou estavam com a mãe durante sua prisão, ou nasceram enquanto a mãe estava presa em alguma delegacia.

Muitos jovens eram presos por já estarem se introduzindo em grupos de esquerda -- havia casos de puro sadismo de generais ligados à tortura, separação da criança da família, criação de redes para adoção clandestina, além do uso desses sequestros como tática de disseminação do terror, muito utilizada na Argentina.

Todo esse processo foi apelidado de Guerra Suja, em que o governo argentino foi o centro articulador e responsável por uma série de iniciativas generalizadas de perseguição, tortura, agressão, violação de direitos e violência indiscriminada contra a população argentina nos anos 1970.

Protesto contra a Guerra Suja / Crédito: Wikimedia Commons

O nome dos movimentos tem origem num ato de 1977, em que mais de uma dúzia de mão cujos filhos foram sequestrados pelo governo durante a ditadura se reuniram numa praça central de Buenos Aires, a Plaza de Maio, e caminharam em protesto em direção à Casa Rosada (sede do governo federal) exigindo respostas ao fato de seus filhos terem sumido e seus registros civis anulados, tentando pressionar a Junta Militar que governava à responder pelos crimes contra os direitos humanos que teriam praticado.

Porém, será só com a reabertura democrática que algumas respostas começaram a aparecer. As Mães e as Avós da Praça de Maio concluíram os inquéritos e identificaram 256 crianças desaparecidas entre 1973 e 1986 e tiveram seu sucesso principalmente no fim dos anos 1990 e anos 2000, ao se associarem com o kirchnerismo.

A grande diferença entre as Avós e as Mães da Praça de Maio não se deve a qualquer divergência ideológica, mas sim termos práticos: enquanto as mães buscam respostas em relação a seus filhos e abraçam a demanda de qualquer outra mãe cujo filho fora raptado pelo governo militar, as avós se dedicam às crianças desaparecidas durante a ditadura e cujas mães também desapareceram durante os expurgos do regime.

As Mães e as Avós da Praça de Maio são os primeiros movimentos da América Latina em defesa direta aos Direitos Humanos e estão diretamente associadas também a lutas contra as restrições tradicionais às quais as mulheres estão historicamente sujeitadas.

O sucesso de sua luta está associado à extrema organização interna do grupo em seu esforço de exposição das atrocidades humanas ocorridas a nível regional, onde houve importantes investigações em arquivos e quartéis, e internacional, além do uso de símbolos e campanhas com importante adesão na sociedade.