Busca
Facebook Aventuras na HistóriaTwitter Aventuras na HistóriaInstagram Aventuras na HistóriaYoutube Aventuras na HistóriaTiktok Aventuras na HistóriaSpotify Aventuras na História
Matérias / Religião

William Hearst, o bilionário que transferiu mosteiros medievais para os EUA

Nos anos 20, Hearst, inspiração de Cidadão Kane, transferiu construções de 800 anos para a América

Thiago Lincolins Publicado em 07/05/2019, às 11h00

WhatsAppFacebookTwitterFlipboardGmail
Hearst e um trecho do Monastério de Óvila num parque em São Francisco - Wikimedia Commons
Hearst e um trecho do Monastério de Óvila num parque em São Francisco - Wikimedia Commons

O que dar de presente a um homem que já tem de tudo? Em 1925. William Randolph Hearst se fez essa pergunta. O presente era para ele mesmo. E sua resposta foi: um mosteiro medieval autêntico, situado a um oceano de distância. Em seu quintal. 

Hearst, o maior magnata da imprensa dos EUA, era tão poderoso que se tornou a inspiração do clássico Cidadão Kane, de Orson Welles. Dizia-se que ele fazia e desfazia presidentes

Sem crime, sem castigo

Seu alvo foi o mosteiro de São Bernardo de Claraval, localizado na província de Segóvia, na Espanha. Os espanhóis provavelmente esperavam que ele simplesmente fosse ocupá-lo, como tantos ricos excêntricos que até hoje se dispõem a morar em castelos. Até que seus funcionários chegaram e começaram a desmontá-lo, parte a parte, como se feito de Lego.

Hearst / Crédito: Wikimedia Commons

Na época em que Hearst efetuou a compra da abadia, as leis de preservação cultural da Espanha ainda não haviam sido promulgadas, o que tornou a empreita perfeitamente legal. Sem interferências, as estruturas que formavam o claustro, a sala do capítulo e o refeitório dos monges da abadia de São Bernardo de Claraval foram desmontadas e colocadas em caixas de madeira repletas de feno – ao total foram transportadas 11 mil. Na Espanha, restara a igreja e algumas outras.

E aí começaram os imprevistos. Enquanto as caixas estavam no mar, um surto de febre aftosa estourou na Espanha. Assim que chegaram aos EUA, em 1926, as caixas foram levadas e colocadas em quarentena. As caixas foram abertas e o feno que protegia as estruturas foi destruído.

Ao guardar as pedras novamente, os funcionários utilizaram caixas avulsas, que não possuíam número de identificação. Com as pedras fora de ordem, as caixas foram enviadas para um depósito.

Sagrada piscina

Hearst não se deu por vencido. Pelo contrário, redobrou seus esforços com outra vítima: o mosteiro de Santa Maria de Óvila, em Guadalajara, Espanha.  A ideia era incorporá-lo ao “castelo” Wyntoon, uma mansão de Hearst no Condado de Siskiyou, Califórnia.

O projeto de Hearst não era respeitoso ao passado da construção, para dizer o mínimo. Uma piscina seria construída a partir da capela do mosteiro. O altar daria lugar a um trampolim, e o local onde ficava o coro seria transformado em um vestiário feminino. Já a capela radial – uma pequena capela que fica localizada ao lado das igrejas – seria transformada em uma minipraia, com areia espalhada por todos os cantos.

O que restou da abadia de Santa Maria de Óvila / Crédito: Wikimedia Commons

Mediada pelo negociante de arte Arthur Byne, a compra violou as leis espanholas de preservação cultural – diferentemente da compra anterior. As regras impediam até que uma única pedra – mesmo que minúscula – de um patrimônio histórico fosse enviada para fora da Espanha. Assim, todo o plano foi executado em sigilo. Além disso, Byne encontrou na crise econômica, que afetava a Espanha na época, uma oportunidade de convencer o governo do país de que a compra seria um bom negócio. E conseguiu: 100 pessoas foram contratadas para remover as estruturas do mosteiro.

Quando os navios carregados com as estruturas chegaram ao Porto de São Francisco em 1931, Hearst e Byne encontraram mais um problema: a Grande Depressão. Com o mercado de ações em crise, a fortuna de Heart já não era a mesma. A ideia esdrúxula de ter um mosteiro transformado numa piscina foi por água abaixo.  

A parte externa do mosteiro de São Bernardo de Claraval na Flórida / Crédito: Reprodução

Como resultado, as pedras que formavam o mosteiro de São Bernardo de Claraval foram levadas a um depósito. A reconstrução da abadia só ocorreu de fato em 1964, quando Raymond Moss e William Edgemon compraram as peças. Já as estruturas do mosteiro de Santa Maria de Óvila também foram armazenadas em um depósito e depois jogadas num parque de São Francisco – hoje, algumas peças estão espalhadas em diversos mosteiros dos Estados Unidos.