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Matérias / Segunda Guerra

Mykola Trosevich, o padeiro que montou um time contra os nazistas

Em agosto de 1942, equipe formada por ex-jogadores disputou uma partida contra time de oficiais alemães — e preferiram morrer do que se humilharem para os combatentes de Hitler

Fabio Previdelli Publicado em 19/07/2020, às 09h00 - Atualizado em 17/12/2021, às 09h00

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Jogadores do FC Start - Wikimedia Commons
Jogadores do FC Start - Wikimedia Commons

O dia 22 de junho de 1941 marca não só a data da invasão dos alemães nazistas na União Soviética, no que ficou conhecido como Operação Barbarossa, como também foi o ponto de partida para uma série de eventos que marcou a história do esporte mundial.

Isso porque, no dia seguinte, Nikolai Trusevich, famoso goleiro soviético do Dínamo de Kiev, se alistou no exército para servir durante a Guerra. Porém, no conflito, acabou sendo capturado e passou por dois campos de concentração antes de ser jogado nas ruas da capital da Ucrânia assim como outros presos.

Assim, em 1942, Trusevich foi reconhecido Josef Ivanovic Kordic, apesar de estar bem mais magros e ter sido jogado às traças das ruas de Kiev — entregue à própria sorte. Kodric era um grande aficionado por futebol e fã de carteirinha do time do Dínamo. Aliás, o esporte era uma das poucas coisas que cativava aquele tcheco da Morávia que tinha sangue germânico e era bem relacionado com os nazistas.

Kiev durante a Segunda Guerra Mundial / Crédito: Wikimedia Commons

A relação com o Terceiro Reich era tão boa que Josef foi levado para administrar a Padaria Nº3, que fornecia alimentos ao exército invasor. Com isso, tirou o ex-arqueiro das ruas e o levou para trabalhar em sua fábrica de pães junto a outros esportistas locais.

A atitude é comparada por Andy Dougan, autor escocês de 'Futebol e Guerra' (Editora Zahar), com a do empresário Oscar Schindler. “Seria fácil imaginar Josef Kordic como uma figura parecida com Oscar Schindler, empenhado em esconder esses esportistas —homens e mulheres — do escrutínio dos alemães.

Na verdade, suas razões parecem ter sido muito menos altruístas. Kordic era um aficionado do esporte e, como para a maioria dos entusiastas, a ideia de conviver com seus heróis o mobilizou mais do que qualquer coisa”.

Apesar do funcionamento agradar os alemães, Kordic acreditava que seus funcionários tinham que ter uma motivação maior para manterem a boa produtividade. Com esse pensamento, decidiu dar a eles uma nova oportunidade dentro do esporte.

Imaginando que outros ex-jogadores do Dínamo poderiam estar vivendo as mesmas condições de Trusevich, convenceu o ex-futebolista a buscá-los em Kiev para montar um time. O primeiro a ser recrutado foi Makar Goncharenko, que havia sido o artilheiro da liga local em 1938. Um fato marcante é que o centroavante tinha guardado seu uniforme e chuteiras, pois tinha esperança de voltar a jogar mesmo após a invasão dos sovietes.

Cena da fatídica partida de futebol / Crédito: Wikimedia Commons

Além de Goncharenko, outros seis jogadores do Dínamo foram encontrados, mas como o número era insuficiente para montar um esquadrão, Makar teve que recrutar outros três atletas que jogaram pelo rival, o Lokomotiv de Kiev.

Com o grupo escalado, todos começaram a trabalhar na padaria paralelamente aos treinamentos. Nessa altura, eles já participavam de uma liga amadora que tinha a autorização dos nazistas.

O esporte era uma maneira de mostrar [aos ucranianos] que a vida continuaria sob os nazistas como antes; era uma ferramenta de propaganda muito poderosa”, revela Dougan em entrevista à Folha.

O esporte e o emprego garantiram aos atletas uma oportunidade de levarem uma vida digna, mas também lhe abriram a oportunidade de entrarem para a história do esporte com o FC Start, nome dado ao time recém formado.

Mesmo sem o desempenho do auge de suas formas físicas como jogadores profissionais, o grupo sobrava sempre que entrava em campo, o que pode ser constatado com seus sete primeiros jogos, todos vencidos por goleada.

O bom desempenho dentro de campo refletiu na atenção das arquibancadas, embora isso não tenha sido necessariamente um ponto positivo. Tudo porque, os jogos do FC Start eram observados por militares de alta patente que começaram a se incomodar com a vibração dos ucranianos sempre que ganhavam uma partida.

Sem saber que o esquadrão era formado por ex-profissionais, os nazistas convocaram um jogo do FC Start com o Flakelf, uma equipe formada por militares de Luftwaffe — que eram considerados a elite das Forças Armadas.

Mais nem isso foi capaz de intimidar o time que jogava como música e acabou vencendo os militares por 5 a 1, em 6 de agosto de 1942. Três dias depois, no entanto, outra partida aconteceria depois de uma revanche pedida pelos alemães.

Só que dessa vez o clima era diferente. No estádio do Zenit, onde aconteciam todos os jogos, os atletas do FC Start receberam a visita de oficiais da SS nos vestiários, que ordenaram que eles fizessem a saudação nazista ao entrarem em campo. Mas a tentativa de intimidá-los não funcionou, e no intervalo a equipe já vencia por 3 a 1.

Foi aí que as regras do jogo mudaram. Os atletas receberam novamente uma visita nos vestiários, mas desta vez com um recado direto e reto: eles não poderiam vencer o jogo sob hipótese alguma.

Cartaz do jogo de revanche / Crédito: Wikimedia Commons

Mas o amor pelo esporte falava mais alto e eles acabaram saindo vitoriosos por 5 a 3. A partir daí, surgiu o mito de que os jogadores do FC Start foram fuzilados logo na saída do campo, perto dos vestiários.

Apesar de essa versão ser mais representativa por mostrar o esporte acima de qualquer imposição política, Dougan acredita que ela não é a mais fiel aos fatos, embora seja tão trágica quanto. “Trusevich, Klimenko e Kuzmenko foram executados pelos nazistas no campo de concentração de Siretz, aproximadamente seis meses depois do jogo. Nikolai Korotkykh, que foi exposto como um agente do NKVD, o Ministério do Interior soviético, foi torturado e morto no interrogatório semanas depois da partida”.

“Eles morreram, como tantos outros soviéticos, porque dois sistemas totalitários [o nazismo e comunismo soviético] estavam se enfrentando e eles [colegas de time] estavam fadados a serem vítimas daquele massacre em grande escala. Qualquer um podia ser executado: guerrilheiros, comissários, judeus, ciganos”, relembrou Goncharenko em uma entrevista em 1992. “Houve 9 vitórias em 9 jogos, o time marcou 46 gols e concedeu apenas 11. E isso não é uma lenda, aconteceu mesmo.”


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