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Matérias / Civilizações

Conquista do Novo Mundo: O encontro de Hernán Cortés com os astecas

Montezuma recebeu com bons modos o conquistador espanhol, mas sua reputação de supersticioso não correspondeu à realidade

Otávio Urbinatti Publicado em 06/11/2019, às 08h00 - Atualizado em 25/06/2021, às 11h00

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Entrada de Cortés no México, 8 de novembro de 1519 - Kurz & Allison via Wikimedia Commons
Entrada de Cortés no México, 8 de novembro de 1519 - Kurz & Allison via Wikimedia Commons

Em algum lugar do morro, um vale cercado por um grande lago revelava uma das paisagens mais exuberantes que um aventureiro poderia ver, como se cada batalha travada até ali valesse a pena. As suntuosas construções de pedras brancas simbolizavam a riqueza daquele povo. O espanhol Hernán Cortés poderia achar que era um sonho, mas ele estava diante da civilização mais ativa e grandiosa da região mesoamericana.

Era Tenochtitlán, a capital do mundo asteca. O então aventureiro, acompanhado de sua tropa, seguiu rumo à cidade com a intuição de que a conquista daquele território seria um projeto estratégico para obter o controle e a soberania do Novo Mundo.

Em 8 de novembro de 1519, a comitiva dos exploradores estava a postos, diante dos portões de Tenochtitlán, e era levada ao seu maior líder. Em pouco tempo, Cortés estava frente a frente com uma das personalidades mais marcantes da História: Montezuma II, o imperador dos astecas.

O homem, com cerca de 50 anos de idade, vestia roupas de penas e pérolas e calçava sandálias revestidas de ouro. A tensão era certa e imediata. Líderes de mundos diferentes trocavam olhares e desconfianças, até que o imperador asteca se levantou, se dirigiu ao europeu e introduziu minimamente o contato diplomático.

Cortés fez o mesmo, saltando de seu cavalo e saudando o dono da exorbitante riqueza ao redor. Em gesto de respeito e cordialidade, o aventureiro se curvou. Será Cortés o deus tão aguardado por todo aquele povo?

Não demorou muito para os astecas descobrirem que não, que aquele estranho homem branco de barba, montado em uma criatura jamais vista por eles, não era o deus tão esperado. E que esse “ser divino”, na verdade, continha muito mais ordens que profecias.

Em terras americanas

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Montezuma / Crédito: Getty Images

Hernán Cortés veio de um mundo muito distante da civilização asteca. As duas regiões, separadas por um Atlântico, eram formadas por culturas e leis bem diferentes. Mas o espírito espanhol do aventureiro, com fervor de conquistar novas terras, riquezas e almas, encurtou a distância entre o Velho Continente e o Novo Mundo a partir do século 15.

Cortés nasceu em Medelín, no sul da Espanha, em 1485. Seus pais desejavam que ele se tornasse advogado, mas o menino um dia imaginou que o seu aprendizado pudesse estar no mar, nas florestas e nas batalhas. Nessa época, o navegador e explorador italiano Cristóvão Colombo viajava pelo Atlântico em direção ao Oriente. Era 1492 quando, por um equívoco, suas embarcações tocaram numa pequena ilha das Bahamas.

“Depois de uma oração, ordenei aos capitães que testemunhassem que eu estava tomando posse desta ilha pelo rei e pela rainha”, escreve o navegador à Coroa espanhola. Era a chegada ao Novo Mundo.

Em seus relatos, o italiano descreve a região como um lugar rico e cheio de povos “amigáveis e bem-dispostos, que seriam facilmente convertidos ao cristianismo”. A história de Colombo chegou à Espanha e em pouco tempo a corte soube dos recursos que aquelas terras guardavam. Hernán Cortés, ainda criança nessa época, não esperou muito tempo para explorar lugares desconhecidos como ele.

Aos 19 anos, Cortés chegou ao Novo Mundo sob comando do espanhol Diego Velázquez, em uma ilha conhecida como Hispaniola. O mérito de sua primeira missão fez com que o governador da região, também espanhol, lhe retribuísse com terras e escravos. Em 1511, ele se juntou a 300 homens em uma nova expedição liderada por Velázquez. Dessa vez, a comitiva tinha como destino a ilha de Cuba.

Aqui, Hernán Cortés já se tornara um homem influente em terras americanas. Mas os espanhóis ainda buscavam novas expedições pelo Novo Mundo. Em 1517, Velázquez, que se tornou governador de Cuba, ouviu rumores de que uma nova terra a oeste estaria coberta de ouro, prata e muitas outras riquezas. Era a descoberta de uma península mexicana, chamada Yucatán, e o comandante não hesitou em colocar Cortés para liderar a expedição.

A missão do espanhol em Yucatán, por sua vez, tinha apenas caráter de “resgate”, e não de invasão. “Era uma autorização do governador caribenho unicamente para comercializar com nativos indígenas e resgatar náufragos espanhóis”, conta Susane de Oliveira, historiadora e professora do departamento de História da
Universidade de Brasília (UnB).

O explorador então reuniu mais de 500 soldados para navegarem em direção à terra recém-descoberta. Em solo mexicano, a comitiva se deparou com a primeira resistência de nativos. Mas a soberania espanhola prevaleceu e, como recompensa, autoridades locais o presentearam com iguarias e mulheres indígenas. Uma delas era a índia Malintzin (ou Malinche).

A aproximação dessa nativa com Cortés foi tão decisiva que até hoje muitos historiadores reforçam o seu papel na conquista do México. Malinche, que aprendeu a língua espanhola, também falava o maia e a língua asteca nauatle. Por esse motivo, ela se tornou a intérprete e tradutora dos espanhóis e revelou importantes comportamentos, crenças e valores indígenas.

Malinche também foi amante do aventureiro, com quem teve um filho, Martín Cortés. Em abril de 1519, a chegada das tropas em Vera Cruz, ainda na costa mexicana, foi um marco para as expedições espanholas. Dizem que os povos totonacas que moravam ali estabeleceram uma forte aliança com os espanhóis.

Por meio de Malinche, Cortés se aproximou dessa gente e pôde conhecer de perto seus anseios. Há relatos de que o cacique da tribo compartilhou com o espanhol o descontentamento com os povos que dominavam a região. Foi quando Cortés ouviu falar muito sobre um líder influente do território mexicano: Montezuma II, o imperador da civilização asteca que abriu esta reportagem.

Nesse encontro com Cortés, os nativos descontentes com o líder não só reclamavam dos excessivos impostos que ele cobrava como também das riquezas que guardava no centro do México. E, como bom conquistador que era, o aventureiro se aproveitou da situação para prosseguir rumo ao interior, desobedecendo as ordens impostas por Velázquez. Era agosto de 1519 quando Hernán Cortés direcionou sua expedição rumo ao coração político do Império Asteca, a tão falada Tenochtitlán.

Encontro de Hernán Cortes e Montezuma II, Mexico, 1519/ Crédito: Getty Images

Exército de nativos

Além dos totonacas, Cortés começou a ampliar suas alianças contra os astecas – também denominados mexicas. Eram manobras políticas que favoreciam interesses de ambos os lados. De um, a figura do conquistador europeu que precisava reunir apoio local. De outro, nativos que viam em Cortés a oportunidade de se livrar do domínio asteca. “Sob o governo de Montezuma II, os astecas expandiram e consolidaram seu governo e influência na região mesoamericana.

Isso gerou fortes conflitos com algumas cidades como Tlaxcala e Huejotzingo, que não se submeteram a esse poderio. Tais rivalidades fizeram com que essas comunidades se unissem aos espanhóis”, explica Susane. A partir daí, Cortés traçou um plano e conseguiu organizar um exército indígena de aliados, recrutando milhares de nativos.

Mas essas colaborações foram frágeis e ambíguas, pois os associados indígenas não compartilhavam dos mesmos padrões culturais, objetivos e interesses na invasão da capital asteca.

“Os Tlaxcaltecas, por exemplo, reivindicaram a outorga real de títulos formais de nobreza, recompensas e isenções que pudessem garantir-lhes certos privilégios na nova ordem colonial”, conta a professora. À medida que as tropas avançavam, mais diversidade e complexidade cultural encontravam. E entenderam que os astecas eram apenas uma das muitas culturas que existiam ali.

Um oásis no centro do México

Há 500 anos, Cortés chegava a Tenochtitlán. E era então recebido pelo imperador Montezuma. Algumas versões contam sobre uma coincidência da profecia asteca: o imperador tinha em mente que o ano de 1519 marcaria a volta do deus Quetzalcóatl, que retornaria do mar para reivindicar seu trono. A divindade, descrita com pele branca e barba preta, não teria gerado dúvidas em Montezuma de que Cortés figurava o tão esperado deus.

Contudo, a professora e doutora em História da Universidade de Barcelona, Espanha, Natalia Moragas, conta que há muitas versões que ainda não são claras sobre essa ritualidade. “A imagem de um Montezuma supersticioso e temeroso não corresponde com a realidade. Muitas histórias das conquistas foram criadas para legitimar e maravilhar os feitos políticos e militares de Hernán Cortés”, justifica.

Encontro de Cortes e Montezuma, de Edward R. Shaw / Crédito: Domínio Público via Wikimedia Commons

Outras versões também afirmam que a entrada diplomática da comitiva espanhola em Tenochtitlán foi justificada com a esperança de que o aventureiro Cortés se intimidasse com tamanha riqueza e poder dos astecas e fosse embora. Apesar do número muito inferior de homens, o espanhol não recuou. Ao contrário: muitos afirmam que Cortés se aproveitou da situação e aprisionou Montezuma.

Em paralelo, o clima de intolerância religiosa contra judeus e muçulmanos na Espanha foi decisivo no imaginário de Cortés. Essa percepção ficou registrada nas cartas que enviava ao rei espanhol Carlos V, em que descreve os edifícios astecas como “mesquitas”. “No horizonte cristão colonial, essa associação das práticas religiosas dos astecas com as práticas pagãs era uma maneira de justificar também a sua inferiorização e destruição”, explica a historiadora Susane.

Por esse motivo, Cortés entendeu que os templos astecas eram lugares profanos e precisavam ser destruídos. Fatores como esses enfraqueceram o poder de Montezuma e a população começou a reagir. Nesse momento, em 1520, Velázquez já havia descoberto a trapaça de Cortés e ordenou que seus soldados seguissem em direção ao México para detê-lo. O explorador foi avisado e deixou a capital asteca para enfrentar as tropas de seu ex-aliado. A batalha lhe rendeu mais uma vitória e acabou convidando os soldados derrotados para a jornada de conquista do Império Asteca. Era hora de voltar a Tenochtitlán.

La noche triste

Enquanto Cortés estava fora, o líder que ocupava o seu lugar havia matado inúmeros astecas. E, logo que chegou à capital Tenochtitlán, o espanhol e sua tropa foram surpreendidos por uma rebelião e aprisionados no palácio da cidade. Montezuma, que já tinha se submetido às ordens espanholas, foi mandado ao local para apaziguar a situação, mas os astecas já estavam descrentes e um golpe de pedra acertou em cheio sua cabeça – matando, assim, o maior líder asteca de todos os tempos.

Em junho de 1520, a situação para os espanhóis se agravou e Cortés e seus homens decidiram deixar Tenochtitlán no episódio que ficou conhecido como La Noche Triste. Enquanto fugiam do palácio durante a noite, foram surpreendidos por outro ataque asteca. Nessa batalha sangrenta, muitos soldados aliados foram mortos. Mas Cortés e outros 400 homens conseguiram deixar a capital e se refugiar numa vila próxima, na aldeia Tlaxcala.

No tempo em que esteve afastado, o aventureiro espanhol reuniu soldados e suprimentos necessários para retomar a invasão. Ainda em dezembro daquele ano, cerca de 25 mil homens avançaram em direção à capital Tenochtitlán e cercaram a ilha pelo Lago Texcoco. O povo asteca se viu em uma enrascada, não podendo entrar nem sair da cidade.

Muitos morreram de fome, mas uma arma foi muito mais letal: as epidemias. Em poucos meses, as doenças trazidas pelos espanhóis dizimaram grande parte dos mexicas. E, em 1521, um conflito sangrento contra o Império terminou na morte do seu último rei, Cuauhtémoc. E, após a destruição dos luxuosos templos da cidade, Tenochtitlán estava sob o domínio de um novo líder. Um colonizador.

Para o professor de História da América Colonial da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), Luís Guilherme Kalil, essa conquista, porém, não se deve exclusivamente aos espanhóis, visto que muitos grupos indígenas saíram como vencedores desse conflito.

Nessa última batalha, “os europeus correspondiam a cerca de 5% do total de homens que cercaram a cidade. Isso sugere um conflito muito mais complexo e multifacetado – o que leva alguns pesquisadores a trabalharem com a ideia de que se tratou mais de uma guerra civil do que de uma grande invasão estrangeira”.

Hernán Cortés chegando ao México, de Vicente Alanís / Crédito: Vicente Alanís via Wikimedia Commons

Herança nacional

Henán Cortés se tornou o governador das terras mexicanas e construiu uma nova cidade em cima de Tenochtitlán. A capital asteca, então, virou ruínas e foi nomeada de Nova Espanha, a atual Cidade do México. Em 1528, Cortés viajou para o seu país e foi recepcionado como um grande herói. E o triunfo da conquista mexicana lhe rendeu o título de rei da Nova Espanha.

Em 1540, ele retornou ao seu país de origem, onde morreu sete anos mais tarde. Nessas décadas, o local era considerado uma das mais importantes colônias do Novo Mundo. A Coroa espanhola enriqueceu e muitos cidadãos cruzaram o Atlântico para povoar as terras mexicanas.

“A queda da capital Tenochtitlán marcou o fim de um poder estabelecido em grande parte da Mesoamérica e o início do processo de conquista e de colonização desse território, em que indígenas e até astecas participaram”, explica a professora de Barcelona.

A submissão dos nativos descrita pelos espanhóis era iminente e uma série de perseguições religiosas e culturais se tornou comum durante o período colonial. No entanto, diferente do que sugerem as versões tradicionais, o impacto da conquista não foi tão nocivo assim aos nativos, pois a região era marcada por uma enorme complexidade cultural, muito maior do que os europeus compreendiam. Segundo historiadores, muitos ali mantiveram seus estilos de vida e até se adaptaram às novas habilidades trazidas pelos estrangeiros.

Ainda que a História tentasse deslegitimá-los, Susane de Oliveira revela que os índios “não podem ser vistos como atores marginais nessa conquista, pois souberam ingressar também no jogo de manobras legais, debates políticos e alianças sociais que caracterizavam a complexidade da política colonial espanhola”.

Nesse sentido, a língua nauatle, falada por astecas e outras tribos, marca presença em território mexicano até os dias de hoje. “Estima-se que mais de 1,5 milhão de mexicanos falem essa língua atualmente. A herança asteca ainda é um componente fundamental da identidade do país”, completa a docente de Brasília.

Essa memória afetiva com os povos astecas ficou ainda mais clara no processo de independência do México, no século 19, quando precisaram desconstruir a imagem bárbara dos nativos e estabelecer uma História e identidade nacional. E essa luta por legitimidade existe até hoje e só reforça a diversidade e pluralidade étnico-racial do nosso tempo.


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