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Matérias / Brasil

Paulo Freire: orgulho nacional ou inimigo público?

Inventor de um método revolucionário de alfabetização, educador brasileiro mais reconhecido do mundo, Paulo Freire virou alvo de ataques, mesmo depois de morto

Alexandre Carvalho Publicado em 17/09/2020, às 16h21

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O educador Paulo Freire - Divulgação
O educador Paulo Freire - Divulgação

Governantes e governistas do Brasil estão errados quando insistem em associar Paulo Freire ao marxismo (sempre por essa lente de que as teorias de Karl Marx são como xingar a mãe de Deus). Ele não era marxista, embora admitisse Marx como uma das influências possíveis de sua filosofia da educação. Mas chamá-lo de “herói da esquerda” e dizer que ele queria levar a política para a sala de aula são afirmações absolutamente corretas. (A política, não um partido, vale frisar.)

Desde o início de sua atuação como educador, Paulo Freire defendeu que a aprendizagem deveria vir sempre acompanhada da consciência política. Aliás, esta não respira sem aquela. E que esse conhecimento está na essência da própria cidadania.

Freire em foto pessoal. Crédito-Divulgação/Escola de Gestão Socioeducativa Paulo Freire

Quando voltou ao Brasil, após o exílio, Freire filiou-se ao PT e tornou-se secretário de Educação quando Luiza Erundina foi prefeita de São Paulo (1989-1993). Na época, apresentou uma proposta de educação pública, popular e democrática, plantando as sementes do que viriam a ser as parcerias público-privadas, Fies, Prouni, orçamento participativo… Ou seja, a política educacional que seria adotada nos governos petistas.

Enfim, ao longo de toda a sua vida como educador, filósofo e pensador político, Paulo Freire foi sempre, antes de qualquer outra identificação, um humanista, que pretendia mudar o mundo (ou pelo menos o Brasil) democratizando o acesso à escrita
e à leitura, essas janelas para a liberdade individual e coletiva. Era um revolucionário, sem dúvida, mas sem nada de agente soviético de filme do James Bond.

“Nos anos 1960, fui considerado um inimigo de Deus e da Pátria, um bandido terrível. Hoje diriam que eu sou apenas um saudosista das esquerdas.”

Orgulho ou inimigo?

Quando ainda estava na campanha presidencial, em 2018, questionado sobre o que pensava do Ministério da Educação, o então candidato Jair Bolsonaro soltou uma de suas declarações de tom belicista: se eleito, iria “entrar com um lança-chamas no MEC e tirar o Paulo Freire lá de dentro”.

Sua intenção não pretendia ser literal, obviamente. Talvez até pretendesse mesmo botar fogo no ministério, para incendiar os “ensinamentos marxistas” que, na concepção dele, dominam a educação brasileira. Mas não podia querer queimar Paulo Freire vivo. Afinal, o educador já estava morto desde maio de 1997, de um ataque cardíaco em função de complicações ocorridas numa operação de desobstrução de artérias.

A estratégia de confundir políticas democráticas de educação com comunismo não começou com Bolsonaro. Em 1964, os militares que implantaram um regime ditatorial no Brasil imediatamente extinguiram o Plano Nacional de Alfabetização.

E, não satisfeitos, prenderam Paulo Freire por 70 dias, acusado de traidor da pátria. Solto, foi prontamente exilado, passando brevemente pela Bolívia antes de se instalar por cinco anos no Chile, onde atuou para a Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação, após um trabalho voltado para a reforma agrária.

Foi justamente durante esse exílio chileno que Freire escreveu seu primeiro livro, Educação como Prática da Liberdade. Um título que não deveria ter agradado aos militares brasileiros na época, mas que fez sucesso internacional – a ponto de Paulo Freire ter sido convidado para ser professor visitante na Universidade Harvard em 1969.

À época, o educador já havia concluído também seu terceiro, e mais importante, livro: Pedagogia do Oprimido. Ainda passou um ano em Cambridge, antes de se mudar para Genebra. Só voltaria ao Brasil em 1979, com a Anistia de Geisel, que acabaria
culminando com o fim da Ditadura Militar em meados da década seguinte.

De lá para cá, enquanto sua popularidade no Brasil teve altos e baixos, de acordo com a ideologia do governo da vez, seu reconhecimento no exterior só aumentou. Além de ter recebido 35 títulos de Doutor Honoris Causa, de universidades europeias e americanas, ele ganhou o prêmio Unesco de Educação para a Paz em 1986.

Patrono do Brasil

Uma pesquisa feita entre os estados de São Paulo, Minas Gerais e Paraná revelou que Paulo Freire é o segundo nome mais escolhido para escolas públicas – só perde para Monteiro Lobato, e vem logo à frente de Tancredo Neves. Não à toa, uma lei sancionada em 2012 declarou-o Patrono da Educação Brasileira.

Mesmo recentemente, ele retornou às manchetes dos jornais e dos portais de internet. Agora por causa de um desdobramento do movimento antirracista que acontece nos Estados Unidos: na Faculdade de Educação da Universidade Columbia, em Nova York, uma das mais prestigiadas do planeta, seu nome está cogitado para substituir o de Edward Thorndike como o homenageado de um prédio do Teachers College.

Thorndike é um psicólogo que foi conhecido por manifestar ideias racistas, machistas e antissemitas – tudo o que não deveria ser homenageado nunca. A importância de Freire só passou a ser desmerecida quando a extrema-direita assumiu o Palácio do Planalto.

Jair Bolsonaro não perde uma chance de cutucar o fantasma do recifense. Já eleito, em dezembro do ano passado, o presidente voltou a atacar o fantasma do educador. Ao anunciar que não pretendia renovar o contrato com a TV Escola que, segundo ele, promovia “ideologia de gênero”, Jair declarou: “Os caras estão há 30 anos [no Ministério], tem muito formado aqui em cima dessa filosofia do Paulo Freire, esse energúmeno, ídolo da esquerda”. O dicionário explica que os significados do termo energúmeno são os seguintes: “desprovido de inteligência”, “boçal”, “bronco”, “ignorante”.


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