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Matérias / Guerras

Queda de Saigon: Há 47 anos, a Guerra do Vietnã chegava ao fim

Três anos após a saída dos EUA da guerra, ocorre a desesperada fuga diante da iminente chegada dos comunistas

Mauro Tracco, arquivo Aventuras na História Publicado em 30/04/2019, às 07h00 - Atualizado às 00h00

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Registro da Guerra do Vietnã - Divulgação/Vídeo/Youtube/SNIPERPOWNAGE
Registro da Guerra do Vietnã - Divulgação/Vídeo/Youtube/SNIPERPOWNAGE

Em Saigon, conforme o Exército do Povo do Vietnam (EPV) se aproximava, as operações de evacuação se aceleravam. Na base aérea de Tan Son Nhut, a retirada de sul-vietnamitas ocorria desde o começo do mês, transportando cerca de 500 pessoas por dia para fora do país.

No dia 20 de abril de 1975, a burocracia para a emissão de vistos de saída foi simplificada e a operação começou a apertar o passo. Na semana que se seguiu, gigantescas filas foram formadas no ginásio esportivo de Tan Son Nhut por pessoas à espera da liberação para entrar a bordo dos aviões C-130 e C-141, que decolavam ininterruptamente durante o dia. À noite, a emissão de vistos continuava. O Serviço de Imigração e Naturalização dos EUA, pressionado pelo Departamento de Estado, concordou em permitir a entrada de vietnamitas que encontrassem um americano para “apadrinhá-los”. 

Para ajudar as mulheres do país a saírem, casamentos-relâmpagos aconteciam nas filas com homens americanos. “Você aceita?”. “Aceito”. Pronto, o carimbo salvador estava garantido. Em 26 de abril, as forças do Vietnã do Norte haviam cercado Saigon. Num esforço para apaziguar o fogo comunista e azeitar as peças de uma possível negociação política, o embaixador Graham Martin convenceu o presidente Nguyen Van Thieu a deixar o país.

Frank Snepp estava no comboio que levou o ex-presidente até uma base aérea secreta, onde um avião o aguardava. Os boatos de um golpe para assassinar Thieu eram fortes o suficiente para que a caravana fizesse toda a viagem até o aeródromo com os faróis apagados. Nada aconteceu com Thieu, que deixou o país bêbado e com cara de choro, apesar de levar consigo a maior parte de seu ouro.

No dia seguinte, o sucessor Tran Van Huong deixou a cadeira, após sete dias no cargo. O general Duong Van Minh assumiu o no dia 28 de abril, tornando-se assim o terceiro presidente a governar o Vietnã do Sul em apenas uma semana. Meia hora depois, a cidade foi atingida por uma série de explosões. A espera havia terminado: Saigon estava sob fogo inimigo.

Os ataques foram feitos por caças F-5 e A-37 norte-americanos capturados pelas forças do norte na base aérea de Phan Rang. Os pilotos, no entanto, eram sul-vietnamitas que mudaram de lado e agora queriam provar sua devoção irrestrita aos novos superiores. O capitão John Ghilain era um dos fuzileiros que trabalhavam na evacuação em Tan Son Nhut quando as pistas e os hangares foram atacados. “Perdemos dois colegas nesse dia. Eles tinham chegado apenas uma semana antes com a missão de ajudar na evacuação.”

Danos psicológicos

Apesar dessas baixas, a ideia dos comunistas não era causar danos sérios, e sim obter o maior efeito psicológico possível. A estratégia foi muito bem-sucedida. As explosões, que podiam ser ouvidas em todos os cantos da cidade, deram início ao pandemônio. Não havia mais tempo para hesitar. Americanos e vietnamitas desafetos dos comunistas deveriam sair do país o mais rápido possível. Porém, com as pistas de Tan Son Nhut destruídas, a fuga por avião estava descartada.

Apenas helicópteros conseguiam pousar e aterrissar na base aérea. Inacreditavelmente, o embaixador Martin não quis autorizar a evacuação por helicóptero e insistiu que o transporte de refugiados continuasse a ser feito por aviões. Ele fez questão de visitar a base aérea pessoalmente para avaliar se era realmente impraticável o pouso e a decolagem de grandes aeronaves. Só depois de ver a situação com os próprios olhos, o embaixador assimilou o golpe. 

Era hora de o poder de decisão mudar de mãos. Ao saber dos ataques a Tan Son Nhut, o presidente Gerald Ford, em Washington, convocou uma reunião de emergência com o Conselho Nacional de Segurança e ordenou o uso de helicópteros na evacuação. Na manhã do dia 29, a música White Christmas foi veiculada pela Rádio das Forças Armadas, em Saigon. Era o sinal de que a Operação Vento Frequente estava autorizada.

Caos

Pouco se importando com as decisões de Martin e dos americanos, helicópteros do Exército sul-vietnamita já voavam em direção à Sétima Frota da Marinha dos EUA, ancorada a 20 milhas da costa. Alguns militares simplesmente pulavam na água quando estavam próximos de alguma embarcação. Outros desobedeciam às ordens dos norte-americanos e pousavam onde e quando queriam. Seus ocupantes eram desarmados e jogados nas celas dos navios. Os helicópteros eram empurrados ao mar para dar espaço aos choppers americanos. Pelo menos 45 aeronaves foram descartadas dessa forma.

Enquanto os militares vietnamitas chegavam à frota americana pelo ar, os civis iam pelo mar. Barcos superlotados de fugitivos saíam das docas do rio Saigon com destino aos navios. Enquanto isso, nas ruas da capital, a histeria coletiva alcançava seu ponto alto. Pessoas gritavam, choravam, corriam ao som de bombas e tiroteios, à procura de uma saída da cidade. O caos causado pela massa descontrolada atrapalhou a evacuação.

Ônibus que levariam refugiados para a base aérea ou para prédios com heliportos não conseguiam percorrer as ruas congestionadas. “Dava para ver o desespero no rosto das pessoas. Elas ofereciam dinheiro para entrar na embaixada. Outros imploravam que seus filhos fossem salvos. A multidão estava incontrolável. Tínhamos de escalar o muro de três metros da embaixada e puxar os americanos pelos braços, pois era impossível abrir o portão”, lembra Ghilain.

Brincando de Deus

Na embaixada, milhares de pessoas amontoavam-se em frente ao portão e ao redor do muro. “Os guardas brincavam de Deus. Escolhiam quem seria salvo e usavam a coronha de seus rifles para afastar quem não seria”, relata Snepp em seu livro. Mães eram separadas de seus filhos: alguns foram pisoteados, outros simplesmente abandonados no portão.

Os vietnamitas que conseguiram entrar na embaixada foram organizados em grupos de 60 pessoas para serem embarcados nos helicópteros que aterrissavam no teto e no quintal. Durante o dia, os oficiais soltavam bombas de fumaça colorida para ajudar os pilotos a encontrar o prédio. Quando o sol se punha, um projetor de slides iluminava o ponto de aterrissagem no teto. No quintal, a iluminação era feita pelos faróis dos carros oficiais.

O resgate por helicóptero, conhecido como Operação Vento Frequente, durou 21 horas, das 11h do dia 29 até quase 8h do dia 30. Os pilotos trabalharam entre 10 e 15 horas sem descansar. Cada viagem levava cerca de 40 minutos no ar e 10 minutos no chão, para o embarque de passageiros. Ao todo, foram 662 vôos feitos por helicópteros CH-53 e CH-46.

Alguns helicópteros foram alvejados ao sair da cidade, mas os autores dos tiros não eram os comunistas, que esperavam pacientemente o fim da evacuação nos limites de Saigon, e sim os próprios militares sul-vietnamitas, enfurecidos com a partida dos EUA. “Nós saímos em desgraça. Muitas vidas foram perdidas. Mas também estava satisfeito por tudo ter acabado, já que tinha ficado sem dormir durante os últimos quatro dias”, relata o fuzileiro Ghilain, ao lembrar do que sentiu quando subiu no helicóptero, ao amanhecer do último dia de Saigon. Apesar do triste espetáculo, os EUA conseguiram, em um mês, evacuar todos os seus cerca de 20 mil cidadãos e 150 mil vietnamitas. 

Guerra encerrada 

Às 9h do dia 30 de abril, apenas uma hora após a última aeronave decolar do teto da embaixada, as colunas do Exército Popular do Vietnã entraram na capital. Eles esperaram o fim da evacuação, e não tinham a intenção de matar ninguém. Em meio às pessoas que não conseguiram escapar da cidade, havia alguns jovens vestidos apenas de cueca. Eram os soldados do ERV, que haviam se livrado de seus uniformes para não serem identificados.

Tanques soviéticos T-54 avançavam em direção ao Palácio Presidencial, mas os mapas impressos às pressas em Hanói não eram muito precisos. Perdidos nas ruas desertas da cidade, não tiveram outra opção a não ser perguntar a uma transeunte solitária onde ficava o tal prédio. Resolvido o problema de inteligência, os tanques atravessaram o portão do palácio, onde Minh esperava, ávido para aceitar a rendição. O último presidente do Vietnã do Sul ficou apenas 42 horas no poder.

Apesar de sua predisposição em se entregar, o processo teve alguns contratempos. Minh foi levado à estação de rádio para ler a nota de rendição, mas não conseguiu decifrar a caligrafia do coronel que redigiu o documento. A solução foi ditar o texto. E, assim, antes do cair da noite, o Exército do Vietnã do Norte transmitiu a mensagem de que Saigon fora conquistada e rebatizada. Dali em diante a cidade seria chamada de Ho Chi Minh, em homenagem ao homem que iniciara a revolução comunista em 1946, quando o país ainda era uma colônia francesa. A guerra que nunca foi declarada estava oficial e definitivamente encerrada.