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Matérias / Personagem

Trono de bronze e Mercedes para os convidados: a escandalosa coroação de Jean Bedel Bokassa, que quebrou o pais

Líder da República Centro-Africana, o militar acreditou que seria uma grande ideia se coroar imperador e gastar um quarto do orçamento do país para o evento

Caio Tortamano Publicado em 25/03/2020, às 17h06

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Bokassa em seu trono de cobre - Divulgação
Bokassa em seu trono de cobre - Divulgação

O plano do ditador Jean-Bédel Bokassa, da República Centro-Africana, era ambicioso: o seu objetivo era tornar o país republicano em uma monarquia. De primeira, a iniciativa foi revelada ao presidente francês, Valéry Giscard d'Estaing, que visitava o país africano e ficou sabendo que Bokassa pretendia torna-se imperador do lugar, através de uma cerimônia oficial e tudo que tinha direito.

Para o militar, a criação de uma identidade real para a República Centro-Africana (RCA) ajudaria o país a elevar o patamar mediante outras nações do continente. Além disso, seria uma chance de aumentar a autoridade Centro-Africana nos assuntos internacionais, era o cenário que Bokassa acreditava ter para criar uma potência na África.

Tudo seria feito através de uma grande coroação, inspirada até mesmo na cerimônia de Napoleão Bonaparte. Para isso, o militar contava com a ajuda do governo francês. Por mais absurdo que pareça, d'Estaing concordou com a ideia por dois motivos que cabiam muito mais aos interesses franceses do que centro-africano.

Jean-Bédel Bokassa em imagem colorida / Crédito: Wikimedia Commons

Primeiramente, uma possível recusa poderia arruinar as relações comerciais que os europeus tinham com o país africano, especialmente na indústria de minérios que extraía, principalmente, urânio e diamantes para os franceses.

Em segundo lugar, apoiar o episódios que poderia ser histórico iria contribuir com a influência da França no país, que, juntamente com Gabão e Zaire eram os países africanos com quem os franceses ainda dominavam as relações comerciais.

Além disso, apoiar a monumental cerimônia serviu como chantagem para que Bokassa cortasse as relações amigáveis que tinha com o líder da Líbia, Muammar Kadhafi, que era extremamente hostil aos franceses.

Começo do Império

Em dezembro de 1976, Bokassa se autoproclamou imperador do, então chamado, Império Centro-Africano. Uma constituição provisória foi assinada, através dela o poder era passado hereditariamente, sendo transferido em uma linha de sucessores masculina. Como parte do acordo, a primeira personalidade internacional a reconhecer a declaração foi o próprio d’Estaing.

O ídolo do imperador era Napoleão, por isso, sua coroação seria exatamente um ano depois de ter proclamado o império, em 4 de dezembro de 1977.  Ao seu lado estaria a esposa, Catherine Denguiadé, seria coroada imperatriz e os filhos, Jean-Bédel Bokassa Junior que seria o príncipe e herdeiro ao trono.

Início dos preparativos

A partir da data estabelecida, a cidade de Bangui, capital do país e local da cerimônia, começou a ser preparada para receber os convidados de honra (grande parte estrangeiros). Apartamentos, casas e hotéis foram desocupados pela população local para dar espaço para os convidados que viriam ao país com a finalidade de acompanhar a coroação.

Os quartos passaram por uma manutenção minuciosa, e a aparência do centro da capital foi alterado, especialmente nas áreas mais próximas da cerimônia. Assim, ruas foram limpas, prédios pintados e pessoas em condição de rua deslocados das áreas centrais da cidade.

Alfaiates do Império Centro-Africano confeccionaram as roupas que seriam utilizadas pelos convidados nativos do país, crianças deveriam usar branco, militares de média patente azul, e ministros e líderes do exército preto.

Além dos esforços nacionais, a equipe de Bokassa procurou europeus para algumas das etapas da coroação, o artista alemão Hans Murnau fez duas pinturas do imperador, uma com e outra sem coroa, para serem utilizadas em momentos distintos. A marcha e a valsa imperial foram compostas na França, assim como a de coroação.

Bokassa, em sua insanidade por grandeza, encomendou um anel com um diamante para o empresário americano Albert Jolis, que não tinha o dinheiro suficiente para o pedido estratosférico do imperador. Assim, Jolis conseguiu uma pedra escura que teria a aparência de um diamante, juntamente com um adorno - que, de fato, era composto por um diamante verdadeiro.

A peça não valia muito mais do que 500 dólares, mas foi apresentada ao ditador como uma relíquia de 500 mil dólares. Pesando duas toneladas, o trono era de bronze, e tinha o formato de uma águia com as asas abertas, custando aproximadamente 2,5 milhões de dólares. A carruagem real veio da cidade de Nice, e foi restaurada e ornada com emblemas em ouro, sendo puxada por oito cavalos brancos.

De todo o dinheiro estava sendo retirado dos fundos do país, apenas a roupa que Bokassa iria utilizar para a cerimônia custou 145 mil dólares, sem contar os mais de 70 mil utilizados para arcar com os custos do vestido da imperatriz.

Já a coroa — feita de ouro, com uma esfera azul com o contorno da África em dourado —, o cetro, a espada e diversos outros itens feitos em joalherias resultaram no montante de 5 milhões de dólares. 240 toneladas de comida, 40 mil garrafas de vinhos e 24 mil garrafas de Moët & Chandon foram encomendadas para o evento.

Para levar e acomodar dignamente os convidados estrangeiros, 60 Mercedes foram alugadas, completando o massivo valor total de 22 milhões de dólares utilizados para todas as despesas do evento. O dinheiro representou um quarto de todo o orçamento que o país tinha em um ano, e, apesar da França ter contribuído financeiramente em parte com os gastos, a maior parte coube ao governo imperial arcar.

Convidados

Para Bokassa, a presença do papa Paulo VI era fundamental, poque legitimaria sua coroação ao mundo católico —alguns dizem que ele queria fazer o mesmo que Napoleão, e retirar a coroa das mãos do Santo Padre e coroar a si mesmo. Pela idade avançada, o papa não pode comparecer ao evento, mas enviou o arcebispo Domenico Enrici, que já havia representado o Vaticano na coroação do rei Juan Carlos da Espanha.

Papa Paulo VI (centro) não compareceu devido sua frágil saúde / Crédito: Wikimedia Commons

Outras figuras políticas recusaram o convite, tais como o imperador Hirohito do Japão, o Xá Reza Pahlev, do Irã, e o primeiro ministro das Ilhas Maurício e o presidente da Mauritânia enviaram suas esposas como representantes. O único a comparecer foi Emmanuel de Liechtenstein. O próprio presidente francês, d’Estaing, não compareceu ao evento, mas enviou uma espada napoleônica como presente ao agora imperador.

A coroação

A cerimônia aconteceu perfeitamente como o esperado —apesar de algumas ausências — e às 10h15 o evento foi iniciado no ginásio de basquete da cidade, com a marinha tocando a marcha imperial composta especialmente para Bokassa, além das roupas finas e elegantes que foram confeccionadas para o acontecimento. Depois do episódio, uma missa foi celebrada na Catedral de Notre Dame, em Bangui — clara alusão (ou cópia) do ocorrido com Napoelão.

A repercussão pelo continente e na Europa foi, como se imagina, extremamente negativa. Algumas das críticas mais ácidas foram em relação aos ridículos excessos que um país essencialmente pobre cometeu para uma cerimônia que não tinha finalidade alguma sem ser louvar a imagem de um homem que tomou o poder.

Resultado

Em 1979, seu império viria a cair depois de Bokassa ter, supostamente, participado de um massacre de estudantes do ensino médio que se opuseram a comprar os caros uniformes estudantis obrigatórios estampados com o rosto do imperador.

Além disso, as irresponsabilidades com os gastos pessoais causaram grande ultraje aos centro-africanos, que viam o seu dinheiro ir para o ralo somente para sustentar os luxos de um imperador desnecessário. Apoiados pela França, opositores do governo imperial tomaram o poder e exilaram o então imperador.


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