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Curiosidades / Roma Antiga

Quinto Túlio Cícero, rival de Júlio César, criou um um manual para tapear o eleitorado

O candidato deveria falar a língua do povo e tornar públicos os podres dos adversários

Felipe Van Deursen Publicado em 26/04/2019, às 07h00 - Atualizado em 30/09/2022, às 08h00

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A obra ''Cícero denuncia Catilina'' - Wikimedia Commons Images
A obra ''Cícero denuncia Catilina'' - Wikimedia Commons Images

“Você deve constituir amizades de todos os tipos: nomes ilustres, os quais conferem prestígio ao candidato; magistrados, para garantir a proteção da lei. Isso requer conhecer as pessoas de nome, usar de certa bajulação.” Não é um trecho de um livro de autoajuda. Trata-se de um trecho do "Manual do Candidato às Eleições", escrito em 64 a.C. em Roma, por Quinto Túlio Cícero. 

O autor preparou o Commentariolus Petitionis ("Manual") para seu irmão, Marco Túlio Cícero, ilustre orador e político que naquele ano se candidatava ao posto máximo da República romana: o de cônsul. O manual, embora curto, tinha conselhos valiosos para Cícero conseguir ser eleito.

Fortalecer amizades já existentes e conquistar novas, cobrar favores prestados a quem pudesse ajudar na campanha, decorar o maior número de nomes possível, sorrir para todos, ser generoso, fazer promessas mesmo sabendo que não cumpriria todas, pedir votos na rua, estar sempre cercado de multidões, falar a língua do povo e tornar públicos os podres dos adversários.

“Em Roma, onde havia poder havia corrupção”, afirma Laura Silveira, especialista no assunto e doutoranda em Letras na Universidade Federal do Rio de Janeiro. “E naquela época da República, como era preciso conquistar todos os setores representados no Senado, as dicas eleitoreiras do manual deveriam ser de grande utilidade.” E foram: Marco Túlio Cícero acabou eleito.

A eleição em 64 a.C. e o mandato de Marco Túlio Cícero no consulado foram marcados por desavenças políticas, golpes baixos, acusações e grandes discursos. Embora o manual tenha ajudado, Cícero não precisou de muito esforço para ser eleito. Seus maiores rivais, Antônio e Catilina, eram homens de passados condenáveis. Quinto Túlio sugeriu explorar isso (“Ambos desde a juventude assassinos, ambos libertinos”, escreveu). Por isso, mesmo não sendo aristocrata, Cícero tinha a confiança da elite.

Antônio também foi eleito (eram duas cadeiras de cônsul, com votações anuais) e reconciliou-se com Cícero. Catilina, no entanto, candidatou-se de novo, perdeu e conspirou contra Cícero, sem sucesso. Liderou um exército revolucionário e acabou morto. O cônsul condenou à morte os membros da conjuração, mas foi exilado por abuso de poder. 

Em 60 a.C., Júlio César chamou Cícero para sua aliança informal com Pompeu e Crasso, que seria chamada de Triunvirato. Do partido oposto, ele não topou. Quando, 11 anos depois, César iniciou uma guerra civil, Cícero estava do lado errado, o de Pompeu. Após a morte de César, em 44 a.C., opôs-se ao novo triunvirato de Caio Otávio, Marco Antônio e Lépido. Os irmãos Cícero foram afastados da política. Ambos seriam mortos no ano seguinte. 

Confira alguns trechos do manual. 

  • “Apesar de os dons naturais valerem muito, um perfil bem forjado pode falar mais alto que a natureza.”
  • “Se você promete (o que o eleitor pede), essa raiva é incerta, futura e se instala em bem poucos. Mas se você nega, provoca irritação no ato e em muitos.”
  • “Não quero que você ostente isso (a corrupção dos adversários) diante deles de maneira a parecer que já planeja uma acusação, e sim que, pelo simples medo disso, você consiga com facilidade aquilo que busca.”