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Matérias / Donzela de Ferro

'Donzela de Ferro': O mito por trás do temido dispositivo de tortura

A invenção de aparência macabra possui uma história que revela mais sobre a modernidade do que sobre os tempos medievais

Ingredi Brunato Publicado em 14/05/2023, às 17h00 - Atualizado em 14/09/2023, às 16h23

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Montagem mostrando ilustração de Dama de Ferro e uma réplica da famosa Dama de Ferro de Nuremberg - Divulgação/ Domínio Público
Montagem mostrando ilustração de Dama de Ferro e uma réplica da famosa Dama de Ferro de Nuremberg - Divulgação/ Domínio Público

Mesmo entre aqueles que não sabem seu nome, é difícil encontrar alguém que nunca tenha sido exposto à imagem de uma Donzela de Ferro. Se trata de um caixão em formato humano repleto de pinos afiados em seu interior que promete um fim lento e agonizante para os indivíduos azarados o suficiente para serem trancados. 

O dispositivo de tortura da Idade Média, que parece saído diretamente de pesadelos, supostamente faz com que a pessoa perfurada sangre até a morte dentro da claustrofóbica cápsula metálica. 

Sem dúvidas, a proposta por trás da Donzela de Ferro é capaz de causar arrepios em qualquer um, porém o que nem todos sabem é que esse é, na verdade, o único objetivo: assustar quem a observa.

Isso, pois, não existem registros do instrumento de ferro que fora usado para torturar pessoas durante a Idade Média. Suas primeiras aparições remontam ao século 18, quando ele começou a ser exibido em museus na Europa e nos Estados Unidos para plateias. 

Na presença daquele horrível objeto, os cidadãos da Idade Moderna (período histórico que durou entre os séculos 15 e 18) podiam simultaneamente condenar a crueldade dos tempos passados e se reconfortarem com a ideia de que sua sociedade teria avançado muito desde então — o que era uma tendência comum desta época, conforme apontado por Peter Konieczny, um historiador medievalista. 

Você tem a ideia de que as pessoas eram muito mais selvagens na Idade Média, porque elas [da Idade Moderna] querem se ver como menos selvagens. É muito mais fácil pegar no pé de pessoas que estão mortas há 500 anos", observou o especialista em uma entrevista de 2016, repercutida pelo Live Science.
Fotografias mostrando Donzelas de Ferro / Crédito: Arquivo Pessoal/ Jan Mehlich e Divulgação/ Domínio Público 

Mitos modernos 

Um ponto importante é que, de acordo com Konieczny, a tortura de fato era presente nos tempos medievais, sendo frequentemente usada pela Inquisição para extrair confissões de prisioneiros previstos para serem executados. A prática era então conectada à ideia cristã de remissão dos pecados, um conceito particularmente forte naquele período devido ao poder da Igreja Católica. 

Os verdadeiros métodos de tortura medieval, no entanto, não seriam nem de longe tão elaborados quanto sugere sua reputação. "A tortura mais comum era apenas amarrar as pessoas com uma corda", apontou Peter Konieczny.

Além da Donzela de Ferro, diversos outros instrumentos de funcionamento macabro atribuídos à Idade Média seriam, na realidade, invenções modernas, como a Pera da Angústia (que era inserido nos orifícios da vítima) e a Aranha (que seria supostamente usado para arrancar os seios de mulheres que eram interrogadas). 

Fotografia mostrando réplicas de supostos dispositivos de tortura da Idade Média / Crédito: Wikimedia Commons/ epbechthold 

Referências históricas

A mais famosa Donzela de Ferro é a da cidade alemã de Nuremberg, que foi construída no início de 1800. Ficou famosa pelo historiador Johann Siebenkees, que divulgou o relato de um suposto falsificador de moedas que teria sido morto dentro do caixão de pregos em 1515. O item foi destruído durante um bombardeio da Segunda Guerra Mundial em 1944. 

Antes dele, no entanto, existe pelo menos outras duas menções a instrumentos semelhantes — em ambos, porém, ele é usado na Antiguidade, e não na Idade Média.

Uma delas ocorre no livro De Cevitate Dei, escrito por Santo Agostinho no século 5. O filósofo cristão descreve, em uma das passagens, a morte de um general romano numa caixa afiada. No caso, porém, o que matou o oficial militar foi a privação de sono.

O outro registro é mais antigo, tendo sido feito por Políbio, um historiador grego, em 100 a.C (primeiro ano do século 1 a.C.). Ele se refere ao rei Nábis, que governou Esparta no início do século 2 a.C, e supostamente usaria um objeto semelhante à Donzela de Ferro para torturar e matar aqueles que lhe deviam dinheiro. 

Dado que não existe documentação a respeito de Donzelas de Ferro sendo desenterradas durante escavações arqueológicas, ou uma datação desses dispositivos que os conecte à Idade Média ou mesmo à Antiguidade, podemos apenas supor que caixões com pregos em seu interior, embora constituam uma ideia antiga no imaginário ocidental, nunca teriam sido realmente colocados em uso.