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Matérias / Curiosidades

Do Bozo ao Pennywise: Por que os palhaços são tão assustadores?

Conheça os responsáveis por transformar uma doce memória de infância em um grande pesadelo

Fábio Marton Publicado em 05/09/2019, às 06h00

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Palhaço assustador - Reprodução
Palhaço assustador - Reprodução

Quem foi criança até os fim dos anos 1990 vai lembrar de uma época em que a palavra macabro não acompanhava necessariamente o termo palhaço. Seria um desafio ver a adorável Vovó Mafalda na TV e pensar em massacre e mutilação.

Mas Valentino Guzzo foi da última geração de artistas a ter o privilégio de não ser comparado a criaturas de filme de terror. Quem era criança podia não saber disso, mas os palhaços sempre tiveram algo de sombrio.

Comediantes físicos estão aí desde que Thugg bateu com a clava na testa de Ugg e todo mundo na caverna, riu e pediu para repetirem. O termo palhaço vem do italiano pagliaccio, um personagem vestido em sacos de palha da commedia dell'arte, o teatro popular da Renascença. Mas o legítimo palhaço só foi surgir em 1801, por um britânico chamado Joseph Grimaldi.

Ele vinha de uma carreira nas chamadas arlequinadas, a versão britânica da commedia. Os pagliacci italianos haviam dado origem ao clown. Grimaldi transformou o clown em personagem principal e, para chamar a atenção para si, pintou seu rosto com cores de branco e vermelho, com um moicano azul.

Grimaldi / Crédito: Reprodução

Foi um estrondoso sucesso de público – e crítica: diziam ser a coisa mais engraçada já vista por um ser humano. Com sua extraordinária fama, o artista inglês daria origem a todos os palhaços modernos, inclusive os da Itália - a commedia dell'arte havia sido proibida em 1797 por Napoleão, irritado com as críticas a seu domínio nas peças, e só voltaria em 1979.

Lado perturbador 

O palhaço moderno nasceu com um lado perturbador. Começa pela maquiagem criada por Grimaldi. Psicólogos que estudaram a questão, falam no Uncanny Valley (vale do perturbador), uma sensação de repulsa visceral a coisas que parecem quase humanas, mas não totalmente, como robôs humanoides – e gente com cara pintada. Em 2008, descobriu-se que as crianças de então tinham horror a palhaços. E mencionam o medo do desconhecido, de alguém esconder algo por trás da maquiagem.

A cara vermelha de Grimaldi escondia um bocado de amargura. Sofria de depressão profunda e alcoolismo, além de dores atrozes causadas por sua atuação física. Ele não conseguia lidar com a pressão de ter perdido sua primeira mulher e o filho, um palhaço que morreu aos 31 anos por alcoolismo. Acabou morrendo na miséria.

A maquiagem pode esconder mais que uma vida dura. O primeiro palhaço sinistro da ficção foi Hop-Frog, de Edgar Allan Poe, criado em 1849. Um bobo da corte que, abusado pelo rei e seus ministros, convence-os a usar fantasias de orangotango inflamáveis.

Em 1874, a ópera Pagliacci, de Ruggero Leoncavallo, é centrada em um palhaço assassino. E mais exemplos continuaram a pipocar vez por outra. O ator de filme britânico Lon Chaney Sr, uma vez afirmou: "Um palhaço é divertido no circo. Mas qual seria a reação normal ao abrir a porta à meia-noite e encontrar o mesmo palhaço ali, à luz da lua?". O Coringa do Batman nasceu nos anos 1940 – e já era assassino.

Lon Chaney Sr. no filme "He Who Gets Slapped" / Crédito: Reprodução

Mas nada disso criou uma crise com a reputação dos palhaços. Em parte porque eles não tinham uma associação óbvia com crianças. Eram diversão para adultos que, por acaso, podia cativar os pequenos. Isso mudou com a televisão. Um dos primeiros programas a entrar no ar, em 1949, é o infantil do palhaço Bozo, na rede americana KKTV. Tornaria-se uma franquia que teria 200 atores diferentes pelo mundo.

Reputação manchada

E Bozo – que teve alguns intérpretes bem problemáticos, para dizer o mínimo – inspiraria o criminoso que, ao enterrar adolescentes em seu porão, afundou junto a boa reputação dos palhaços. Em dezembro de 1978, policiais de Chicago receberam um mandato para escavar a casa de John Wayne Gacy.

A suspeita era que o empresário, prometendo um emprego ao jovem Robert Piest, desaparecido desde o início do mês, havia dado cabo a ele. Logo acharam um braço em decomposição. E mais. Ao fim de um trabalho grotesco, seriam tirados da lama 33 corpos.

Gacy era um monstro que vinha a ser conhecido também como Pogo, um palhaço que se apresentava em festas de crianças.

Pogo / Crédito: Reprodução

Fazia isso por hobby, sem cobrar nada e isso aumentava sua reputação de cidadão exemplar, que até mesmo teve um encontro com a primeira-dama Rosalynn Carter, meros meses antes.

Pogo abriu a garrafa do gênio. Gacy daria origem a um novo tipo em Hollywood. Em 1982, um palhaço de brinquedo é possuído em Poltergeist. Em 1986, Stephen King lança It,com o palhaço Pennywise, que iria para a TV e o cinema quatro anos depois.

No hilário Killer Klowns from Outer Space, eles vieram de outro mundo para nos enrolar em algodão doce e beber nossas entranhas de canudinho. E, em 1989, surge a banda de rap rock Insane Clown Posse,que daria origem ao movimento juggalo, um estilo de vida cuja marca registrada é se vestir de palhaço macabro.

Pennywise na versão moderna de It / Crédito: Reprodução

Com excesso de Pennywise e falta de vovó Mafalda, os palhaços andam por baixo. A Associação Mundial de Palhaços chegou a lançar um comunicado instruindo os seus membros a como lidar com o impacto negativo do reboot de It, lançado no ano passado.

Randy Christensen, presidente da associação e Palhaço do Ano em 2013, explica sua posição: "Joseph Grimaldi é o pai de todos os palhaços modernos. Ninguém tinha medo dele. Eles o amavam e riam de suas palhaçadas. Nós aqui na Associação Mundial dos Palhaços queremos continuar com a sua tradição - uma de ser engraçados, engraçadinhos e divertidos provocadores de risadas".

"Isso é o oposto ao que os produtores de filmes de terror estão tentando", continua. "O gênero horror tenta fazer as pessoas se sentirem nervosas, perturbadas, apavoradas e paranoicas. Eles frequentemente fazem isso pegando uma imagem inocente, brincalhona e saudável da infância e pervertendo-a para algo maligno e vil".