Os líderes Benito Mussolini e Adolf Hitler - Getty Images
Fascismo

Fascismo: Afinal, é de direita ou de esquerda?

A ideologia de Mussolini passou a ser acusada de esquerdista na internet. Mas, historicamente, isso tem fundamento?

Jânio de Oliveira Freime Publicado em 16/08/2019, às 11h00 - Atualizado em 09/01/2023, às 16h35

A discussão sobre o espectro político do fascismo nunca foi uma grande questão. Entretanto, nos últimos tempos, essa polêmica vem aflorando, pois muitos internautas por aí vêm defendendo que o fascismo é uma ideologia de extrema-esquerda. Isso vale uma reflexão.

Esquerda e direita?

Em primeiro lugar, é importante destacar que a definição de esquerda e direita é complicada. Muitas vezes contraditórios, os critérios para essas categorias são diversos e dinâmicos, impedindo uma definição fechada e conclusiva. Mesmo relações como estatismo-liberalismo, autoritarismo-democracia ou progressismo-reacionarismo são insuficientes para bater um martelo em relação a essas categorias.

Um importante pensador sobre essa questão é o filósofo italiano Norberto Bobbio, que tentou definir a diferença entre esquerda e direita nos anos 1990, concluindo que a grande diferença entre os espectros é o modo de ação.

Para Bobbio, a esquerda é identificada a partir de uma disposição para a destruição do status quo, com um compromisso final de atingir a igualdade social.

Enquanto isso, a direita seria a aceitação dos fundamentos da realidade política e econômica para a não mudança da ordem em termos estruturais. Assim, na direta as desigualdades sociais poderiam ser diminuídas à medida que favoreça a competitividade geral, potencializando o esforço individual em detrimento da proteção social e pública.

Claro, a definição de Bobbio é também insuficiente e não contempla a realidade atual, mas é uma válida referência. Ao focarmos na visão historiográfica da vida política de Mussolini ou de Franco, é comum que se declare o fascismo como extrema-direita por seu conservadorismo social e por sua temível desavença com o igualitarismo, mesmo que eles fossem, nos anos 1920, antissistêmicos.

Quanto mais a pessoa considerar a igualdade absoluta entre todos os povos para ser uma condição desejável, mais à esquerda vai estar no espectro ideológico. Quanto mais uma pessoa considera a desigualdade como inevitável ou mesmo desejável, o mais para a direita será", declara Roderick Stackleberg, estudioso do tema que enquadra o fascismo como direita.

Entendendo o fascismo

No fascismo, o que é incompatível com a lógica de esquerda, há entes naturalmente superiores e inferiores no funcionamento orgânico da sociedade.

Outra coisa relevante é que o fascismo não vive somente de concepções próprias, mas está constantemente se apropriando de definições dos outros e tomando o lugar de movimentos que se enfraquecem. Em 1919, Mussolini escreveu que o fascismo era contra o “atraso da direita” e a “destrutividade da esquerda”. 

Porém, em 1935, quando o Il Duce publicou o programa A' Doutrina do Fascismo', ele já se declarou como extrema-direita, colocando: "Somos livres para acreditar que este é o século da autoridade, um século tendendo para a 'direita', um século fascista".

Porém, uma questão que é intrínseca do fascismo e que o afasta da esquerda é sua atitude de manutenção do capitalismo, mesmo que contra o liberalismo econômico. Isso porque Mussolini ascendeu politicamente prometendo a facilitação do liberalismo (uma forma de direita menos radical), mas logo que entrou no poder, associou-se à Igreja e ao Exército e criou um Estado forte e totalitário, mas beneficiário do capitalismo empresarial.

Fascismo e comunismo

A ideia de que é “tudo no Estado e nada além do Estado” muitas vezes é confundida com o comunismo, pelo valor estatizante de ambas as vertentes, mas o Estado Fascista nada tem de comunista: tudo deve estar sob o guarda-chuva da ideologia oficial e do seu controle político, mas a propriedade privada, a exploração do trabalho e a manutenção da desigualdade como projeto são essenciais na ideologia fascista.

Ou seja, o que define o espectro politico não é o estatismo em si, mas os compromissos e os ideias do Estado, que se convertem em suas ações. O Estado soviético promoveu a expropriação dos latifúndios; e o italiano, a destruição dos sindicatos autônomos. Mussolini queria um Estado forte, não uma economia planificada. Não à toa, Mussolini era um ferrenho anticomunista que perseguiu e matou diversos militantes de esquerda.

Outra diferença entre o fascismo e o comunismo, no que se refere ao liberalismo, demonstra bem como o estatismo em si não define o espectro político. As duas ideologias são abertamente contrárias ao capitalismo liberal, mas por razões diametralmente opostas: enquanto os comunistas o combatiam por ser um sistema que falha na proposta de atingir a igualdade, o nazifascismo rejeita a igualdade por princípio, negando o liberalismo por permitir que aqueles que deveriam ser inferiores na sociedade ascendam (aproximando o fascismo do reacionarismo).

Ou seja!

Resumidamente, faz-se necessário, para compreender o espectro político do fascismo, uma ponderação do que são essas categorias direita e esquerda. E, em geral, há duas formas de identificação dessas palavras: uma delas é puramente teórica, servindo como referencial utópico e categórico.

Nisso é necessário fechar o que é que definiria o conceito ideal de direita e esquerda, para ver onde o fascismo encaixaria (e dá para discutir e até considerar o fascismo uma forma histórica que transborda esses conceitos). Essa é a proposta apresentada por Bobbio.

A outra forma de compreender essas palavras seria uma visão propriamente histórica, em que direita e esquerda, antes de definições retóricas, são corpos políticos reais, baseados em autoafirmação e alteridades que fundamentam a prática política de pessoas e instituições do passado.

Nessa ideia, fascismo é uma ideologia direitista, pois ele se formou historicamente sob a bandeira, a identidade e o compromisso desse conjunto de pessoas reais chamado “direita”.

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