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Matérias / Machado de Assis

Como Machado de Assis previu um transtorno psicótico em conto?

Maior escritor da literatura brasileira, Machado de Assis relatou em conto, anos antes de publicação científica, um transtorno psicótico

Fabio Previdelli

por Fabio Previdelli

fprevidelli_colab@caras.com.br

Publicado em 16/06/2024, às 08h00 - Atualizado em 18/06/2024, às 18h34

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Retrato colorizado de Machado de Assis - Divulgação/Faculdade Zumbi dos Palmares
Retrato colorizado de Machado de Assis - Divulgação/Faculdade Zumbi dos Palmares

Maior escritor da literatura brasileira, Machado de Assis vem chamando atenção internacionalmente nos últimos tempos, após os comentários da influencer norte-americana Courtney Henning Novak, que se mostrou fascinada pelo universo machadiano em suas redes sociais. 

Após se deleitar com 'Memórias Póstumas de Brás Cubas', que considerou a melhor leitura de sua vida, a influenciadora, que iniciou um projeto para ler um livro de cada um dos países do globo, agora ficou fascinada por 'Dom Casmurro'

+ Capitu traiu? Influencer dos EUA termina Dom Casmurro e comenta polêmica

'Dom Casmurro' talvez seja meu novo livro favorito, talvez esteja tomando a posição de 'Memórias póstumas de Brás Cubas'. Se você não está familiarizado com Machado de Assis, ele é um autor brasileiro que deveria ser mais conhecido em todo mundo. Ele tinha que estar do lado de Shakespeare", afirmou a influencer.

113 anos de sua morte, Machado de Assis continua encantando por seus livros realistas, e também românticos, característicos pela ironia, objetividade e crítica social. 

Mas Machado não foi considerado a frente de seu tempo apenas pela discussão de temas que são cada vez mais atuais. O que poucos sabem é que o escritor brasileiro também foi responsável por 'prever' um transtorno psicótico em um de seus livros. Entenda!

Loucura compartilhada

Em um estudo publicado em 1887, Charles Lasègue e Jules Falret descreveram a psicose induzida, também conhecida como 'folie à deux' (ou 'loucura a dois', segundo a tradução literal do francês)

A 'folie à deux' seria uma espécie de contágio mental. A transmissão de crenças delirantes de indivíduo psicótico para um indivíduo saudável. Uma loucura praticamente contagiosa entre as pessoas. 

O artigo original descreveu o transtorno como uma síndrome que ocorre predominantemente em mulheres que moram em ambientes isolados — vivendo geralmente com suas famílias. 

Mas a 'folie à deux' pode afetar também dois indivíduos muito próximos ou até mesmo mais de uma pessoa saudável. Elas, não necessariamente, precisam ter laços familiares para isso acontecer. 

No entanto, anos antes da publicação do estudo, Machado de Assis lançou o conto 'O Anjo Rafael', que apresenta a descrição perfeita do que ficou conhecido como 'folie à deux'

A narrativa conta a história de um homem que acreditava ser o próprio anjo Rafael. Ele vivia isolado em uma fazenda com sua filha, que não teve contato com o mundo exterior até os 15 anos.

Pouco antes da morte, seu pai encontra um pretendente para ela. O sujeito, porém, logo percebe que a possível futura esposa havia sido tomada pelos delírios do pai. 

A 'previsão' de Machado foi constatada em 2011 pelos pesquisadores Daniel Martins de Barros e Geraldo Busatto Filho, então psiquiatras da USP, em artigo publicado na revista médica britânica 'British Journal of Psychiatry'.

A narrativa de Assis apresenta um quadro que combina todos os elementos subsequentemente descritos por Lasegue & Falret: uma mulher vivendo isolada e intimamente relacionada a um membro psicótico da família que manifestava sintomas psicóticos idênticos e era a influência e a causa primária de sua ilusão", dizem os pesquisadores no artigo. 

Mas não só isso, Machado de Assis também relata a cura para a 'folie à deux': afastar a pessoa saudável de quem tem o problema mental.

"Esta história ilustra que, acima de tudo, a literatura pode contribuir para a psiquiatria, oferecendo descrições de condições com detalhes notáveis. Como observa Sigmund Freud em Escritos sobre Arte e Literatura, 'o tratamento poético de um tema psiquiátrico pode revelar-se correto sem qualquer sacrifício de sua beleza', o que pode ser verificado neste 'primeiro relato de caso' de folie à deux", finalizam os brasileiros.