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Matérias / Bomba atômica

Os cientistas que se opuseram ao uso da bomba atômica

Após ajudarem a criar a arma de destruição em massa, 70 cientistas assinaram uma petição para que ela não fosse usada

Ingredi Brunato Publicado em 12/08/2023, às 21h00

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O efeito da bomba em Nagasaki - George R. Caron via Wikimedia Commons / Domínio Público
O efeito da bomba em Nagasaki - George R. Caron via Wikimedia Commons / Domínio Público

Quando o exército dos Estados Unidos jogou uma bomba atômica sobre a cidade Hiroshima em 6 de agosto de 1945, e depois outra em Nagasaki no dia 9, a única grande potência do Eixo (coalizão de nações formada por Alemanha, Itália e Japão) a prosseguir resistindo aos Aliados era o país asiático. 

Adolf Hitler, o principal rosto da Segunda Guerra Mundial, havia cometido suicídio mais de três meses antes, assim colocando um fim à ameaça oferecida pelos nazistas ao restante do mundo. 

É verdade que o uso das devastadoras armas de destruição em massa pelos norte-americanos no Japão finalizou o conflito internacional de forma definitiva, porém até hoje muitos se perguntam se não existia outra maneira de ter chegado ao mesmo ponto sem matar mais de 200 mil civis japoneses de uma vez só. 

Nos dias atuais, já não temos como responder a essa pergunta, mas em julho de 1945 ainda existia uma possibilidade da História não seguir por esse caminho. É com esse dilema em mente que um grupo formado por 70 cientistas escreveu uma petição pedindo para que o então presidente dos Estados Unidos, Harry S. Truman, não jogasse a bomba sobre a nação asiática. 

O documento foi finalizado três semanas antes de Hiroshima, tendo sido assinado por ninguém menos que os especialistas do Projeto Manhattan, o programa de pesquisa que desenvolveu a tecnologia nuclear. Infelizmente, acabou nunca chegando às mãos do chefe de Estado. 

Cientistas preocupados 

Conforme repercutido pela Insider, o principal elaborador da petição era Leo Szilárd. Já J. Robert Oppenheimer, o físico considerado como "o pai da bomba atômica", não apenas se absteve de assinar o documento como também convenceu um colega de trabalho, Edward Teller, a não mostrar a petição para as pessoas do laboratório onde eles trabalhavam, localizado em Los Alamos:

"Oppenheimer me dissuadiu disso, dizendo que nós, como cientistas, não devemos nos intrometer em pressões políticas desse tipo", relatou o homem mais tarde a fim de explicar porque ninguém daquele laboratório em particular havia assinado o papel. 

Fotografia de Oppenheimer / Crédito: Divulgação/ Domínio Público

Na carta que Szilárd encaminhou para os membros do Projeto Manhattan quando coletava assinaturas, ele fala da preocupação com as implicações morais do uso da arma de destruição em massa: 

Por menor que seja a chance de que nossa petição influencie o curso dos eventos, pessoalmente sinto que seria importante se um grande número de cientistas que trabalharam neste campo declarasse clara e inequivocamente sua oposição a fundamentos morais para o uso dessas bombas na atual fase da guerra", disse o cientista. 
Fotografia de Leo Szilárd / Crédito: Domínio Público

Já dentro da apresentação do documento em si, que tem como destinatário o presidente Truman, é citada a maneira como, após a Alemanha ter sido dominada, a visão dos especialista em relação à tecnologia nuclear ter mudado.

Sem o fator do "perigo iminente" de que os próprios Estados Unidos fossem alvos de um ataque nuclear, os membros do Projeto Manhattan queriam que seu chefe de Estado reconsiderasse a realização dos bombardeios.

Eles pediram, por exemplo, que as autoridades do Japão fossem informadas a respeito da existência das bombas atômicas e de seu imenso poder destrutivo, assim tendo a chance de se render antes do país ser bombardeado. Esse aviso, no entanto, nunca chegou a acontecer. 

A petição 

Confira abaixo o documento na íntegra: 

"Descobertas das quais o povo dos Estados Unidos não está ciente podem afetar o bem-estar desta nação em um futuro próximo. A liberação do poder atômico que foi alcançada coloca as bombas atômicas nas mãos do Exército. Coloca em suas mãos, como Comandante-em-Chefe, a fatídica decisão de sancionar ou não o uso de tais bombas na atual fase da guerra contra o Japão.

Nós, os cientistas abaixo assinados, trabalhamos no campo da energia atômica. Até recentemente tivemos que temer que os Estados Unidos pudessem ser atacados por bombas atômicas durante esta guerra e que sua única defesa pudesse residir em um contra-ataque pelos mesmos meios. Hoje, com a derrota da Alemanha, esse perigo foi afastado e nos sentimos impelidos a dizer o seguinte:

A guerra deve ser levada rapidamente a uma conclusão bem-sucedida e os ataques com bombas atômicas podem muito bem ser um método eficaz de guerra. Sentimos, no entanto, que tais ataques ao Japão não poderiam ser justificados, pelo menos não até que os termos que serão impostos após a guerra no Japão fossem tornados públicos em detalhes e o Japão tivesse a oportunidade de se render.

Se tal anúncio público desse garantia aos japoneses de que eles poderiam esperar uma vida dedicada à busca pacífica em sua terra natal e se o Japão ainda se recusasse a se render, nossa nação poderia então, em certas circunstâncias, se ver forçada a recorrer ao uso de bombas atômicas. Tal passo, no entanto, não deve ser dado em nenhum momento sem considerar seriamente as responsabilidades morais que estão envolvidas.

O desenvolvimento da energia atômica fornecerá às nações novos meios de destruição. As bombas atômicas à nossa disposição representam apenas o primeiro passo nessa direção, e quase não há limite para o poder destrutivo que se tornará disponível no curso de seu desenvolvimento futuro. Assim, uma nação que estabelece o precedente de usar essas forças recém-liberadas da natureza para fins de destruição pode ter que arcar com a responsabilidade de abrir a porta para uma era de devastação em escala inimaginável.

Se depois da guerra se permitir que se desenvolva uma situação no mundo que permita que potências rivais tenham posse descontrolada desses novos meios de destruição, as cidades dos Estados Unidos, assim como as cidades de outras nações, estarão em contínuo perigo de ataque súbito. Aniquilação. Todos os recursos dos Estados Unidos, morais e materiais, podem ter que ser mobilizados para prevenir o advento de tal situação mundial. Sua prevenção é, no momento, responsabilidade solene dos Estados Unidos - destacada em virtude de sua liderança no campo da energia atômica.

A força material adicional que essa liderança dá aos Estados Unidos traz consigo a obrigação de contenção e, se violarmos essa obrigação, nossa posição moral ficará enfraquecida aos olhos do mundo e aos nossos próprios olhos. Seria então mais difícil para nós cumprir nossa responsabilidade de controlar as forças de destruição ainda não liberadas.

Em vista do exposto, nós, abaixo assinados, respeitosamente pedimos: primeiro, que você exerça seu poder como Comandante-em-Chefe, para determinar que os Estados Unidos não recorrerão ao uso de bombas atômicas nesta guerra, a menos que os termos que serão impostas ao Japão foram tornadas públicas em detalhes e o Japão, sabendo desses termos, recusou-se a se render; em segundo lugar, que em tal caso a questão de usar ou não bombas atômicas seja decidida por você à luz da consideração apresentada nesta petição, bem como de todas as outras responsabilidades morais que estão envolvidas".