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Matérias / Dom Pedro I

Domitila foi dama de Leopoldina e teve cinco filhos com Dom Pedro I

A Marquesa de Santos conquistou títulos nobiliárquicos e cargos importantes sendo amante de Dom Pedro I

Rodrigo Trespach, historiador e escritor* Publicado em 29/08/2022, às 14h25 - Atualizado em 15/10/2022, às 12h20

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Marquesa de Santos e Dom Pedro I em pinturas - Domínio Público
Marquesa de Santos e Dom Pedro I em pinturas - Domínio Público

São Paulo tinha fama de ser a terra das mulheres mais formosas do Brasil. Spix e Martius escreveram que as paulistas eram “esbeltas, de constituição forte, porém graciosas nos gestos, e nos traços fisionômicos”, com rostos redondos que demonstravam alegria e franqueza.

Na capital, seguindo o censo de 1822, viviam 4.004 mulheres e pouco mais de 2.900 homens. Uma cidade cheia de mulheres aos pés de um homem com fama de mulherengo e conquistador.

Segundo uma tradição oral, antes da chegada do príncipe, o coronel e engenheiro militar Daniel Pedro Müller teria dito às filhas que a primeira delas que ousasse sair à rua ou chegasse próximo da janela enquanto d. Pedro estivesse em São Paulo haveria de se ver com ele.

Na verdade, a filha mais velha de Müller tinha apenas dez anos na época e ele estava entre os líderes bernardistas, de quem o príncipe fez questão de manter distância. Embora sem fundamento, a história ilustra bem o quanto a reputação de d. Pedro o precedia e deu margem a todo tipo de falatório.

Uma paulista, porém, chamou a atenção de d. Pedro mais do que qualquer outra: Domitila de Castro Canto e Melo, filha do coronel reformado João de Castro Canto e Melo e irmã do alferes Canto e Melo. Natural dos Açores, o velho militar era conhecido por “Quebra-vinténs”, segundo alguns, devido a força e a facilidade com que quebrava uma moeda de cobre entre os dedos da mão; para outros, “vinténs” seria uma gíria da época que significava “virgindade” — o que indica que o coronel, assim como d. Pedro, era um conhecido deflorador de donzelas.

Seja como for, o pai de Domitila tinha uma longa história de serviços prestados ao Exército português, servira no Sul do Brasil, fora monteiro-mor do reino e próximo de d. João VI, o que, em 1820, lhe valeu a nomeação para os serviços de viação pública em São Paulo. Dois anos depois, como inspetor de reparação de estradas, foi incumbido por Daniel Pedro Müller de reparar a estrada para Santos, a ponte sobre o Tamanduateí e a ladeira do Carmo, por onde d. Pedro deveria entrar pela capital paulista.

O irmão de Domitila, seguia os passos do pai. Havia sentado praça no corpo de Cavalaria de Caçadores da Legião, prestou serviço em Montevideo e, aos 23 anos de idade, estava servindo no Rio de Janeiro desde janeiro de 1822. Francisco de Castro Canto e Melo fez toda a viagem ao lado de d. Pedro.

Português sofrível

Mais tarde, em dezembro de 1864, já como visconde de Castro, ele escreveu um relato da jornada, que seria publicado no Rio de Janeiro, pelo Correio Mercantil, em janeiro do ano seguinte. Nascida em São Paulo, em 1797, Domitila tinha então 24 anos. Embora proveniente de uma família com alguma influência e importância, não tinha boa formação — e assim como d. Pedro, escrevia cartas em um português sofrível. Mas, a julgar pelos relatos, era bonita, o que para o príncipe regente bastava.

O tenente Carl Schlichthorst, que a conheceu no Rio de Janeiro, afirmou que Domitila se distinguia pelo “rosto regular e formoso, e pela desusada alvura da tez”. A despeito de já não ser mais tão jovem, os olhos não haviam perdido o fulgor, e, além de não lhe faltar gordura, o que correspondia ao gosto geral da época, uma porção de cachos escuros emolduravam uma linda face. “É uma mulher verdadeiramente bela, de acordo com a fama de que gozam as paulistas”, escreveu o alemão. O conde de Gestas, agente diplomático francês na corte brasileira, tinha opinião semelhante. Domitila teria “um exterior agradável, que pode passar por beleza num país onde ela é rara”. Mas havia opiniões em contrário. O visconde de Barbacena, achava que ela era “mediocremente bonita”.

A Marquesa de Santos / Crédito: Domínio Público

Já Carl Seidler, conterrâneo de Schlichthorst, afirma que a paulista “absolutamente não era bonita e era de uma corpulência fora do comum”. Domitila estava envolvida em um complicado caso de divórcio quando o príncipe regente chegou a São Paulo. Casada aos quinze anos de idade com o alferes mineiro Felício Pinto Coelho Mendonça, nove anos mais velho do que ela, a filha do coronel Canto e Melo tinha dois filhos (um terceiro morrera ainda criança) e um histórico de maus tratos e violência doméstica. Em 1819, a situação passara dos limites.

Segundo os autos do processo, Felício a encontrou “resvalada aos pés de um fauno”, o coronel Francisco de Assis Lorena, junto à bica de Santa Luzia, e por isso a esfaqueou duas vezes, na barriga e na coxa. O marido foi preso, Domitila sobreviveu; e assim teve início a disputa pela guarda dos filhos. Foi nessa situação que d. Pedro a encontrou em agosto de 1822.

Primeiro contato

Alguns historiadores afirmam que o primeiro contato foi feito nas terras alugadas pelo coronel Canto e Melo, próximo ao cemitério dos Aflitos. Para outros, aconteceu em uma propriedade, localizada a uns trezentos metros do riacho Ipiranga, próximo de onde hoje se encontra o Museu da Independência, no lugar chamado então de Moinhos. Essa chácara era utilizada pelo militar como lugar de pouso para tropas de mula que faziam a ligação entre Santos e São Paulo.

Há quem afirme que o encontro aconteceu na véspera da entrada triunfal na cidade. Ainda em Penha de França, à noite, o príncipe teria sido sorrateiramente levado por Chalaça e o alferes Canto e Melo ao encontro de Domitila — no largo de São Francisco ou na várzea do Carmo, na chácara do Ferrão, nas imediações da cidade. Segundo o próprio d. Pedro, em carta à Domitila, escrita em 1825, o encontro aconteceu em 29 de agosto de 1822, dia em que “comecei ter amizade com mecê”, revelou.

Em outra missiva, lembra da data como o dia em que “nos ajuntamos pela primeira vez”. Domitila foi mais detalhista. Em carta a uma amiga, a marquesa de Cantagalo, confidenciou que vira o príncipe regente pela primeira vez às 9h e os recebeu reservadamente às 22h, “numa noite chuvosa, cortada de relâmpagos”, em seus aposentos na rua do Ouvidor.

Domínio Público

Além disso, nada mais se sabe com certeza. Conforme o relato de um familiar e ajudante de ordens do príncipe, o contato inicial teria ocorrido quando Domitila passeava por São Paulo numa liteira, carregada por dois escravos, e cruzou com d. Pedro, acompanhado da guarda de honra.

A julgar pela data, dia em que ocorreram as eleições para o governo paulista, a cidade deveria estar movimentada. Encantado com a jovem, o príncipe apeou do cavalo, cumprimentou-a e elogiando-lhe a beleza entabulou um diálogo, o que fez com que os negros baixassem a cadeira. A certa altura da conversa, d. Pedro tomou uma das pontas da liteira e a levantou, ordenando que um oficial erguesse a outra. “Como Vossa Alteza é forte”, teria dito Domitila.

O passeio seguiu, com a guarda carregando a cadeira e d. Pedro em gracejos com a dama paulista. “Nunca mais Vossa Excelência terá negrinhos como estes”, teria prometido o jovem regente. Até que ponto o encontro foi mesmo fortuito é hoje impossível saber. Como dito anteriormente, o irmão de Domitila acompanhava d. Pedro desde o Rio de Janeiro e o pai já estivera com o príncipe antes da chegada a São Paulo.

Romance tórrido

Não é difícil imaginar que o primeiro contato dos dois tenha ocorrido por iniciativa do alferes Canto e Melo ou da própria Domitila, empenhada em conseguir resolver a pendência do divórcio e da guarda dos filhos. De qualquer modo, iniciava ali um dos romances mais tórridos e escandalosos da história política brasileira. Em poucos meses, d. Pedro instalaria Domitila e quase toda a família Canto e Melo na corte, cobrindo-a de títulos nobiliárquicos e cargos importantes.

Nos sete anos seguintes, ela receberia o título de marquesa de Santos, seria nomeada dama camarista da imperatriz e teria cinco filhos do imperador, entre eles a duquesa de Goiás e a condessa de Iguaçu — enquanto mantinham um caso, o incorrigível d. Pedro ainda teria um filho com a irmã de Domitila, Maria Benedita, baronesa de Sorocaba. Diplomatas estrangeiros deixaram registrado os poderes da “favorita”, que na opinião do barão de Mareschal era o “canal de promoções” de quem pretendia favores junto ao Bragança.

O agente sueco afirmou que a paixão de d. Pedro por Domitila era “tão extrema que ele parece fechar os olhos sobre tudo o que exigem a moral e os bons costumes”. Em cartas íntimas, d. Pedro assinava como “Demonão”, “amante luxurioso” ou “Fogo Foguinho”, chamava a amante de “Titília” e fazia menções à “tua coisa”. “Hoje estou muito pachola”, registrou ele em 1825, “sinto não lhe poder ir aos cofres; mas amanhã será”. “Estou munido bastante”, escreveu quase à mesma época.

Em outra oportunidade, já em 1827, disparou essa: “Filha, manda-me dizer como passaste e se já há novidade; eu passei bem de saúde pois tua coisa apenas deitou lagrimazinha de água branca”. Em certa ocasião, enviou como lembrança à amante um punhado de pelos pubianos; em outra, agradeceu os leques que recebeu de presente, mas exigiu “um leque mais ordinário que é mais próprio para homem”.

Em 1822, porém, os dias de glória de Domitila e dos Canto e Melo estavam longe. Na primeira semana de setembro, tendo resolvido os problemas políticos em São Paulo, d. Pedro partiu para Santos, cidade natal de José Bonifácio, seu mais influente conselheiro e poderoso ministro. No Rio, as últimas notícias de Lisboa causavam agitação e uma reunião entre a princesa regente, ministros e conselheiros de Estado estava por decidir o destino do Brasil.

Ás Margens do Ipiranga

O trecho que você acabou de ler foi extraido do livro 'Ás Margens do Ipiranga', de autoria do historiador e escritor Rodrigo Trespach. Com o objetivo de fornecer detalhes dos bastidores da viagem de 1.400 quilômetros que consagrou o episódio histórico, Rodrigo Trespach lança o livro com o selo da Aventuras na História e Citadel.

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Capa de 'Às Margens do Ipiranga'

A obra retrata a viagem que a comitiva do futuro imperador realizou no período, contando até mesmo com retratos dos locais, costumes da população e a situação sócio-política que o país se encontrava naquele momento.

"A ideia era ter um objetivo novo, um olhar sobre o processo da Independência, contada de outra forma, através da viagem que Dom Pedro I fez em si, não algo que seja subjetivo, mas algo concreto”, explicou Rodrigo ao site Aventuras na História.

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Às margens do Ipiranga: A viagem da Independência ― a jornada de d. Pedro, do Rio de Janeiro a São Paulo, em agosto e setembro de 1822 - Rodrigo Trespach, 2022 https://amzn.to/3R09WYi

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