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Colunas / Amor

Amor na guerra: O relacionamento mais intrigante da Revolta de Varsóvia

Durante os muitos conflitos derivados da Segunda Guerra Mundial, as coisas que restaram às pessoas foram a esperança, e, claro, o amor

Ricardo Lobato Publicado em 14/01/2024, às 07h00 - Atualizado em 15/01/2024, às 11h55

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Imagem do casamento de Bolesław Biega e Alicja Treutler - Getty Imagens
Imagem do casamento de Bolesław Biega e Alicja Treutler - Getty Imagens

Caso esteja estranhando o assunto e o título acima, não se preocupe. Esta coluna continua sendo sobre Forças Armadas e Assuntos Militares, contudo, o tema escolhido chega às suas mãos para provar que, mesmo na guerra, pode existir amor. E ele não apenas existe como é o grande responsável por manter as pessoas vivas e dar esperança em meio ao desalento. 

Trata se de um “romance” que se passa na reta final da Segunda Guerra Mundial, especificamente na capital da Polônia, em um dos episódios mais dramáticos do conflito: a Revolta de Varsóvia. Para falar do amor nesta história, entretanto, é preciso voltar às origens da guerra e contextua lizar a batalha em específico. A Polônia foi a primeira vítima oficial da sede expansionista nazista.

Antes dela, as tropas de Hitler já haviam marchado sobre a Tchecoslováquia, mas foi somente com a invasão das terras polonesas, em 1º de setembro de 1939, que a Segunda Guerra começou. O que se seguiu foi uma rápida vitória da máquina de guerra alemã — com a inovadora estratégia da Blitzkrieg, a “Guerra Relâmpago” — e um longo assenhoreamento do país. Além de terem sido os primeiros a sofrer uma derrota para os germânicos, a ocupação foi tudo, menos pacífica.

A Polônia era a nação com o maior número de campos de concentração (e também de extermínio) — mais que a própria Alemanha —, incluindo alguns dos mais infames, como Auschwitz Birkenau. Também foi o Estado que mais perdeu população judaica, chegando a mais de 3 milhões de pessoas.

Outros povos

E não para por aí, mesmo os não judeus sofreram muito. Por ser uma nação predominantemente eslava — vista pela ideologia nazista como uma “raça subumana” — o tratamento dos ocupantes ao povo polonês era o pior possível.

Em 1944, fartos de tanta exploração, e percebendo que “o grande Reich” alemão era pressionado dos dois lados, os habitantes de Varsóvia se insurgiram. Os poloneses que pegaram em armas eram, em sua maioria, jovens membros da resistência doméstica (ligada ao governo no exílio) e que, diante do avanço soviético, viram uma oportunidade de revidar contra os ocupantes.

Soldados durante a Revolta de Varsóvia - Crédito: Domínio público

É justamente aqui onde entra o amor. Apesar de estarem pressionados no Oeste pelos Aliados Ocidentais e no Leste pelo Exército Vermelho, a Wermacht ainda era uma força militar notável. Os alemães em Varsóvia não iam renunciar à cidade facilmente. Os jovens poloneses, que já haviam perdido quase tudo naquela altura da guerra, vendo a ferocidade da resistência alemã, se apegaram ao mais forte dos senti mentos, talvez a única coisa que ainda lhes restasse. Em meio aos violentos combates, muitos casais contraíram matrimônio.

Estima se que ao longo dos 63 dias da Revolta de Varsóvia, mais de 500 pessoas tenham se casado. Olhando de fora, pode até parecer estranho que, em meio a batalhas intensas, as pessoas viessem a se casar. Mas, na verdade, era algo bem lógico. Precisamos considerar que os com batentes ali não eram soldados regulares, nem eram pagos para combater o inimigo; lutavam por sua pátria e nada mais tinham.

Luz entre as percas

Já haviam perdido suas famílias, seus amigos, suas casas... Apenas lhes restava o amor. É o caso de Bolesław Biega e Alicja Treutler, que, assim como tantos outros, se casaram em meio ao conflito. Ele era um jovem oficial do famoso batalhão Kilinski, e ela uma enfermeira voluntária. Após se ferir em combate e ser levado à retaguarda, Bolesław foi tratado justamente por Alicja.

Durante uma conversa como padre que ajudava os feridos, o religioso, conhecedor da história dos dois, sugeriu que se casassem. O atônito Bolesław perguntou ao padre: “Aqui?”. E logo recebeu a resposta: “Onde mais? Por que não?”. Alicja estava na linha de frente dando primeiros socorros às tropas, assim sendo, Bolesław lhe enviou um correio onde se lia: “A Senhora Alicja Treutler está convidada para seu casamento com o Senhor Bolesław Biega, favor não se atrasar”.

O oficial e a enfermeira no dia do casamento - Crédito: Domínio público

Horas depois os dois trocavam alianças. A imagem do matrimônio, registrada pelas lentes de Eugeniusz Lokajski Brok, deu ânimo aos combatentes e inspirou mais casais a fazer o mesmo. A Revolta de Varsóvia, apesar de corajosa, não atingiu seus objetivos.

A despeito da tenacidade dos revoltosos, por conta de decisões políticas das grandes potências Aliadas – que nessa fase do conflito já começavam a desenhar as linhas do mundo pós-guerra nos mapas – os esforços foram praticamente em vão.

Fim do coflito

Sem suprimentos e esgotados, os poloneses baixaram as armas em 2 de outubro de 1944. Oque restara de Varsóvia, como represália, foi destruída pelos alemães, tornando se na segunda cidade Aliada mais devastada na guerra – atrás apenas de Manila, capital das Filipinas, arrasada pelos japoneses.

Os soviéticos, que marchavam rumo a Berlim, só conquistariam a capital polonesa em 17 de janeiro de 1945, pondo fim a seis longos anos de ocupação nazista. Mesmo com o fim melancólico da revolta, e com o enorme número de baixas, o fato de casais como Bolesław e Alicja terem sobrevivido para contar a história — ela faleceu em 2019 e ele em2023 — é um marco não apenas para os poloneses, mas para todo o mundo.

Algo aparentemente simples ou inocente, como o amor, possui um poder imenso e pode ser o alimento da esperança em meio ao desalento. Afinal, o amor pode vencer tudo.