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Matérias / Caso von Richthofen

Veja como o interrogatório de Andreas von Richthofen foi importante para a investigação

Andreas von Richthofen, que perdeu os pais após o assassinato orquestrado pela irmã, acabou norteando as investigações iniciais

Fabio Previdelli

por Fabio Previdelli

fprevidelli_colab@caras.com.br

Publicado em 25/10/2023, às 21h00 - Atualizado em 08/11/2023, às 10h19

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Andreas von Richthofen e sua família - Arquivo pessoal
Andreas von Richthofen e sua família - Arquivo pessoal

"Até então, para nós, aquele era mais um caso de homicídio", foi assim que o chefe da equipe H-Sul do Departamento Estadual de Homicídios e de Proteção à Pessoa (DHPP), Robson Feitosa, descreveu à equipe do site do Aventuras, em 2021, o chamado que recebeu naquela madrugada de 31 de outubro de 2002.

O caso, que foi encaminhado pela 27ª Delegacia de Polícia, do Campo Belo, dava conta de um duplo assassinato ocorrido na rua Zacarias de Góes, no Brooklin, bairro nobre da Zona Sul de São Paulo.

Entretanto, a morte de Marísia e Manfred von Richthofen jamais sairá da memória de Robson e do então delegado titular Dr. Ricardo Guanaes. A dupla acabou responsável por se dirigir até o endereço e averiguar o que havia acontecido.

+ Exclusivo: Investigador relembra o brutal caso von Richthofen

O desfecho da história todos já sabem: a filha do casal, Suzane Louise Von Richthofen foi condenada a 39 anos e 6 meses de prisão por orquestrar o crime — executado por Daniel e Cristian Cravinhos; seu namorado e o irmão dele, respectivamente. Pelo homicídio triplamente qualificado, Daniel pegou a mesma pena de Suzane; já Cristian foi condenado 38 anos e seis meses.

Marísia e Manfred juntos de Suzane e Andreas, mais novos/ Crédito: Arquivo pessoal

Na época, Feitosa — já aposentado, após mais de 34 anos de carreira — também participou do interrogatório de Andreas Albert von Richthofen à equipe H-Sul.

Um irmão mais velho

A história de um dos crimes que mais chocou a sociedade brasileira começou cerca de três anos antes do brutal episódio. Suzane e Daniel se conheceram no Parque do Ibirapuera, durante uma feira de aeromodelismo, recorda a criminóloga Ilana Casoy em 'O Quinto Mandamento'. Os detalhes sórdidos do caso Richthofen estão disponíveis na obra 'Casos de Família', também de Ilana Casoy.

"A família Von Richthofen tinha ido à exposição por causa de Andreas, que começava a se interessar pelo assunto. Não precisou de muito tempo para que Suzane e Daniel se apaixonassem perdidamente um pelo outro", detalha ela na obra.

Suzane durante o funeral dos pais, em 2002/ Crédito: Reprodução/Video/YouTube

Logo, Andreas passou a nutrir uma admiração por Daniel — quinto colocado no ranking mundial da modalidade. O relacionamento de Cravinhos com Suzane foi bem aceito por ambas as famílias durante bom tempo. Mas após dois anos, a rigidez dos Von Richthofen ameaçou o futuro da união.

Depois de mais de dois anos de relacionamento, Manfred e Marísia começaram a achar que o namoro de Daniel e Suzane estava indo longe demais. Segundo eles, as diferenças culturais e sociais entre o casal eram inaceitáveis", escreve Casoy.

Os desentendimentos dentro da família fizeram Manfred estapear a filha, aponta a criminóloga. Por conta da pressão, Suzane anunciou o fim da relação aos pais — mas, às escondidas, a paixão continuava ardendo. Andreas era o único cúmplice; inclusive de quando seus pais passaram um mês na Europa. Na ocasião, Daniel se 'mudou' para a mansão dos Richthofen.

No dia do crime

Horas após o boletim de ocorrência ser lavrado no 27º DP, Suzane, Daniel e Andreas foram levados aos DHPP para serem ouvidos. O caçula da família Von Richthofen foi interrogado por Robson e Guanaes. Aos investigadores, o menino, com 15 anos à época, deu detalhes de como foi sua rotina naquele 31 de outubro.

Embora nunca tivesse pisado em uma delegacia de Homicídios, Andreas "Comportou-se como adulto, depondo de forma controlada, com a cabeça concentrada em tudo o que acontecia ao seu redor", aponta Ilana no livro.

No depoimento, contou como foi o seu dia, deixando as respostas surgirem de forma natural. Andreas relembrou que acordou por volta das 6h40 da manhã e 15 minutos depois já saiu de casa, junto de seu pai, para ir à escola.

Às 12h45, Suzane o buscou no Colégio Vértice, como sempre fazia. Quinze minutos depois, ambos já estavam em casa para almoçar com Marísia. Pouco antes das duas da tarde, a irmã o levou para a aula de inglês, que terminou às 15h.

De lá, Daniel e Suzane o levaram ao Shopping Ibirapuera — como a menina faria aniversário no dia 3 de novembro, o namorado queria comprar seu presente. Os irmãos chegaram em casa pouco antes das 17 horas.

Suzane deixou Andreas e logo saiu para participar de monitoria na faculdade — uma forma que ela encontrou de despistar os pais para ir se encontrar com Daniel. Marísia chegou em casa às 18h, cerca de 40 minutos antes de Manfred. O casal jantou às 20 horas. Andreas pulou a refeição por comer um lanche.

Andreas von Richthofen ao lado de Suzane/ Crédito: Reprodução/Video

Uma hora depois, o pai passou em seu quarto para dar boa-noite; a mãe fez o mesmo ás 22 horas — Andreas aponta que essa foi a última vez que os viu com vida. Meia hora depois, quando os dois já dormiam, ligou para Suzane do escritório da casa — ela havia prometido levar o menino, escondido, para um cybercafé. Ele ficaria no local até às 3 horas da manhã, enquanto ela e o Daniel iriam a um motel.

Dez minutos antes do combinado, ele ligou para a irmã, que já estava a caminho. Após um passeio pela cidade, eles chegaram em casa entre 3h55 e 4 horas da manhã. "Segundo o menino, ao chegarem, viram luzes acesas e tudo muito bagunçado, além da porta da frente destrancada e a janela da biblioteca aberta", descreve Ilana.

Suzane o impediu de subir as escadas, por um suposto medo de que os invasores ainda pudessem estar no imóvel. Do lado de fora da casa, ligaram para Daniel. A polícia só foi acionada quando o namorado chegou ao endereço.

Robson e Guanaes perceberam que a história tinha lacunas. Assim, resolveram mudar de estratégia na abordagem do jovem, que a todo momento esteve acompanhado de sua advogada.

Teu pai levou muita pancada para morrer. Ele e sua mãe estavam vivos quando foram atacados e sofreram muito. Presta atenção, Andreas, eles devem ter implorado pela vida deles. Já pensou sobre isso? Tudo o que você contar pode ajudar a descobrir quem fez isso!", disse Feitosa ao jovem, relata o livro.

Após mais algumas horas de interrogatório, Andreas deu mais detalhes sobre a conturbada relação de Daniel e Suzane com seus pais. Como resultado, um caminho se abriu nas investigações.

O relato de Andreas

Com exclusividade à equipe do site Aventuras na História, o investigador Robson Feitosa recordou o interrogatório com Andreas.

"Nós conversamos com o Andreas, conversamos com a irmã. Mas tudo foi feito em separado: a irmã foi questionada numa equipe e o Andreas em outra, exatamente para que um não soubesse. A princípio, a irmã e o Andreas estavam na nossa equipe. Nós conversamos com os dois e percebemos que tinha incoerências, tinha pontos que não estavam [encaixando]. Depois, existiu opção de separá-los realmente, de ouvi-los em equipes diferentes", contextualiza.

O investigador Robson Feitosa/ Crédito: Arquivo pessoal

Coube a Robson contar ao menino o ataque brutal que matou os seus pais. "Eu contei para ele. Ele foi muito frio. O Andreas não demonstrou tanta emoção naquele momento".

"Existe um detalhe que ficou marcado para o resto da minha vida: após narrarmos toda aquela questão do que tinha acontecido com os pais (a forma que morreu e a agressividade utilizada contra os pais), nós paramos durante a noite para poder fazer um lanche, uma alimentação, para continuar", continua Feitosa.

Robson aponta que como eles passariam a noite acordados, era normal fazer uma pausa para os membros da equipe se alimentarem. "Aí eu pergunto, perto de alguns membros da equipe que iriam busca comida, para o Andreas: 'O que você quer? Come alguma coisa?'."

A resposta do garoto para Robson foi: "Não quero nada", disse. "Mas um lanche? Alguma coisa, pelo menos, para você não ficar sem, você precisa comer algo", insistiu o investigador.

"Aí ele falou: 'Ah, então traz para mim um sorvete!'. E eu falei: 'Como? Como assim? Você tá de brincadeira com minha cara? Seu pai e sua mãe morrem, da forma que te contamos, e você vem agora querer tomar um sorvete?'. Isso ficou muito marcado em mim", revelou.

Segundo Ilana Casoy aponta em 'O Quinto Mandamento', Andreas acabou aceitando as fritas com esforço, mas não quis nenhum lanche. Foi o jovem que acabou norteando grande parte das investigações do DHPP.

E, embora considerasse Daniel um irmão mais velho e nutrisse um carinho enorme por Suzane, jamais se esquivou de responder com a verdade. Além disso, é importante ressaltar que ele não teve envolvimento no crime que matou os pais. 

"Nunca houve nenhuma prova de seu envolvimento no assassinato de seus pais. Alguns policiais têm dúvidas se ele sabia de alguma coisa, mesmo que parcialmente, mas nada nem ninguém jamais confirmou essa hipótese. Não houve prova concreta de sua participação no homicídio de Manfred e Marísia von Richthofen", enfatiza a criminóloga no livro.