Busca
Facebook Aventuras na HistóriaTwitter Aventuras na HistóriaInstagram Aventuras na HistóriaYoutube Aventuras na HistóriaTiktok Aventuras na HistóriaSpotify Aventuras na História
Matérias / Holocausto Brasileiro

Filha tirada de mãe e mulher abandonada: As histórias do Hospital Colônia de Barbacena

Holocausto Brasileiro, lançado pela Netflix, exibe relatos emocionantes de pessoas que tiveram suas famílias afetadas pelo Hospital Colônia de Barbacena

Isabelly de Lima Publicado em 26/02/2024, às 18h00

WhatsAppFacebookTwitterFlipboardGmail
Leonora Correa de Almeida e o Hospital Colônia de Barbacena - Divulgação / Netflix e Luiz Alfredo
Leonora Correa de Almeida e o Hospital Colônia de Barbacena - Divulgação / Netflix e Luiz Alfredo

Na pacata cidade mineira de Barbacena, ergue-se um monumento à memória e ao horror: o Hospital Colônia. Entre 1903 e 1980, o que outrora prometia ser um refúgio para os enfermos da mente se transmutou em um palco de sofrimento e abominação, inspirando a obra "Holocausto Brasileiro", da jornalista Daniela Arbex.

O livro revela a crueldade que marcou a vida de inúmeros pacientes. Segregados do mundo, enfrentavam a superlotação, a fome, a falta de higiene e a violência brutal. Lobotomia, eletrochoques, contenções e medicações abusivas eram instrumentos de "tratamento", enquanto a morte os rondava.

Internas do Colônia de Barbacena - Luiz Alfredo

No último domingo, 25, chegou à Netflix o documentário ‘Holocausto Brasileiro’, baseado no livro da jornalista, que escancara as tragédias que ocorreram no local através das décadas.

O documentário conta com relatos chocantes e também exibe cenas tocantes. A produção se aprofunda em dois casos que abalaram toda a estrutura familiar e um deles envolve uma revelação feita durante as gravações. Confira os relatos de famílias abaladas pelo Hospital Colônia:

Débora e Sueli

Um dos casos apresentados em 'Holocausto Brasileiro' é o de Débora Soares, que descobriu ser filha de Sueli Rezende, uma das ex-internas do Colônia. Sueli, segundo relatos de enfermeiros que falaram ao documentário, era uma interna 'difícil', principalmente por escapar do hospital.

Débora Soares, que descobriu ser filha de ex-interna - Divulgação / Netflix

Portadora de uma doença psiquiátrica, Sueli, em uma de suas escapas, acabou se relacionando sexualmente com um homem e engravidou, dando à luz uma menina, que foi tirada de seus braços e levada para casa por uma das funcionárias do hospital.

Após alguns anos, Sueli faleceu. No entanto, sua filha ainda estava viva, ainda que não soubesse que a mãe que a criava não era biológica. Quando Débora descobriu ser filha de Sueli, a ex-interna já havia falecido há um ano.

Eu descobri por acaso, por uma contradição da minha mãe, né? [...] Questionando sobre a gravidez, como que eu tinha nascido? Ela disse que foi parto normal e eu lembrei que, anos atrás, ela havia falado que era uma cesária. Que mãe que se engana sobre isso?”.
Sueli Rezende, a interna mãe de Débora - Divulgação / Netflix

Sueli foi uma das internas gravadas dando depoimento no filme de Helvécio Ratton, de 1979, intitulado ‘Em Nome da Razão’. Na produção em questão, ela cantarolava sobre o cotidiano no Colônia.

A mãe “indigente”

Outro caso que chama atenção no documentário é o de José Carlos Almeida, já aposentado, que acompanhado do filho, André Almeida, faz uma descoberta devastadora sobre sua mãe, graças a alguns registros.

André de Almeida e o pai, José de Almeida - Divulgação / Netflix

Segundo ele, a mãe foi internada no Colônia, pois, estava “doida”, como afirmou que seu pai a definia. José não sabia, até então, confirmar se o próprio pai mandou sua mãe para a instituição, entretanto, tinha a informação que ela fora interna do Colônia, já que na época ele era muito pequeno. A mãe de José, inclusive, foi uma das internas retratadas no livro de Arbex.

A equipe do documentário proporcionou uma descoberta para José, que, ao visitar o pavilhão Antônio Carlos, pôde conferir alguns registros de mortos do hospital. Em uma pasta com nomes de pessoas enterradas como indigentes (sem identificação parental, miserável, ou sem condições de suprir suas próprias necessidades, segundo dicionários), ele encontrou o nome de sua mãe, Leonora Correa de Almeida.

José de Almeida ao descobrir paradeiro da mãe, Leonora - Divulgação / Netflix

Aos prantos, José descobre que, além de ter sido enterrada como indigente, o próprio pai a internou no local, abandonando-a até sua morte. Ela também teve o nome alterado, para não ser identificada como casada. No livro, está escrito: “À vista, pedido verbal do esposo à paciente, Jorge Severino de Almeida”. Seu nome se tornou Leonora Correa de Castro.

Foi cruel, não foi? Ele escondeu isso de mim. Eu não sabia que tinha mãe, tá vendo. [...] E eu dormindo na rua e não sabia que tinha mãe. Com 9 anos”, diz José embargado em lágrimas.

O documentário

‘Holocausto Brasileiro’ é um documentário disponível na Netflix que tem a produção de Alessandro e Daniela Arbex, Roberto Rios e Maria Angela de Jesus. Entre 1903 e 1980, o hospital se tornou palco de um "Holocausto Brasileiro", como descrito no livro de Daniela. Mais de 60 mil almas perderam suas vidas em meio à negligência, violência e atrocidades.

O documentário reúne especialistas e ex-pacientes para falar com propriedade sobre essa época sombria. Através de relatos e análises, o objetivo é desvendar os horrores que se escondiam nos muros do Colônia. Veja o trailer:

Pessoas que viveram a rotina na instituição quebram o silêncio e compartilham suas experiências. Os relatos revelam a superlotação, a fome, a falta de higiene, a violência e os métodos "terapêuticos" cruéis que marcaram a vida de milhares. O projeto busca não apenas documentar o passado, mas também promover a reflexão sobre a saúde mental no Brasil.