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Matérias / História

O conturbado casamento entre o rei 'instável' George III e a rainha Charlotte

Retratado em spin-off de Bridgerton, relação entre George III e Charlotte foi cheia de altos e baixos

Éric Moreira Publicado em 05/05/2023, às 11h52 - Atualizado em 01/06/2023, às 17h01

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Retrato do rei George III ao lado da rainha Charlotte - Domínio Público via Wikimedia Commons
Retrato do rei George III ao lado da rainha Charlotte - Domínio Público via Wikimedia Commons

Foi lançado na Netflix um spin-off de 'Bridgerton' que acompanha a ascensão da rainha Charlotte, chamado 'Rainha Charlotte: Uma História Bridgerton'. Criada por Shonda Rhimes, a produção conta com Corey Mylchreest, India Amarteifio e Golda Rosheuvel no elenco.

De acordo com a sinopse, "ao chegar em Londres, Charlotte acaba descobrindo que ela não era exatamente o que a realeza esperava e precisa quebrar os padrões e mudar de vez a sociedade antes segregada".

Da mesma forma como na nova série, a protagonista, a rainha Charlotte, enfrenta dificuldades logo após sua chegada na capital inglesa, para conhecer o rei britânico George III, a vida real não se distancia tanto assim disso. Confira a seguir a verdadeira história entre os dois monarcas.

Casamento às pressas

O rei George III, filho de Frederico, Príncipe de Gales, e Augusta de Saxe-Gota, foi o governante do Reino Unido entre 1760 e 1820, ao lado de sua esposa, a instigante Charlotte. Porém, é sempre importante lembrar que, nessa época, havia uma série de especificidades entre as relações monárquicas, o que já seria o primeiro empecilho na relação dos dois.

Quando George ascendeu ao trono em 1760, com apenas 22 anos de idade, encontrar uma esposa se tornou uma de suas maiores prioridades, não tanto por um interesse próprio, mas mais pensando em garantir a linhagem real.

Entretanto, encontrar a esposa ideal não era uma tarefa fácil: além de a pretendente ser necessariamente de uma realeza, era necessário um argumento político para a escolha — o que tornava inelegíveis as mulheres da coroa da Dinamarca ou da Holanda, visto que seus irmãos já se casaram com mulheres dessas regiões.

Outro fator dificultante, por fim, era a própria personalidade de George: sendo uma pessoa reservada, embora intelectualmente curioso, o rei não queria uma esposa que demandasse muito de seu tempo e nem que tivesse uma agenda própria ocupada, como era sua mãe.

George tinha uma ideia muito clara do tipo de mulher que procurava: esperava encontrar uma ajudante e companheira que compartilharia sua visão de uma monarquia moralmente regenerada e que ficaria feliz em desempenhar o papel que lhe foi atribuído em seu grande projeto doméstico", escreve Janice Hadlow em 'A Royal Experiment: The Private Life of King George III'.

Porém, apesar da grande seletividade, eventualmente George encontrou aquela que seria seu par perfeito: a princesa Charlotte de Mecklenburg-Strelitz, de 17 anos, proveniente de uma região rural da Alemanha. "Jovem, inexperiente e sem instrução nos caminhos dos tribunais ou da política, sua ingenuidade emergiu… como sua qualidade mais atraente, uma página em branco sedutora para um homem escrever", descreve Hadlow.

Depois de escolhida, então, Charlotte partiu da Alemanha para a Inglaterra em 17 de agosto de 1761, tendo chegado na presença do rei do Reino Unido em 8 de setembro. E somente seis horas depois de sua chegada, os dois se casaram, como repercutido pelo site da monarquia.

Retrato da rainha Charlotte
Retrato da rainha Charlotte / Crédito: Domínio Público via Wikimedia Commons

Rolou química

Como já era tradicional nas realezas, não somente britânicas, ao longo da história, esperava-se que o casamento entre George III e Charlotte fosse frio e sem muito afeto, com a única finalidade de perpetuar a linhagem. Porém, para a surpresa de ambos, o casamento mostrou-se bastante adequado.

Os dois compartilhavam grande paixão por música — tendo sido, inclusive, Charlotte a responsável pela descoberta de um talentoso Mozart aos oito anos de idade —, pelo campo, sendo George entusiasta da agricultura, e Charlotte da botânica, além de que ambos tinham interesse pela vida doméstica privada.

"Neste instante, fiquei muito feliz com sua carta muito afetuosa [sic] e gentil, para a qual quero palavras para expressar minha alegria e felicidade, mas posso dizer com grande verdade que, embora meu Pen não pode expressar meu sentimento que meu coração sente mais profundamente", escreveu Charlotte à George em uma carta em 1797, depois de três décadas de casados. Juntos, tiveram 15 filhos, mas a agradável união sofreu com um empecilho posterior: a 'instabilidade' do rei George.

Retrato do rei George III
Retrato do rei George III / Crédito: Domínio Público via Wikimedia Commons

George, o rei 'louco'

Hoje em dia, é de conhecimento geral a existência das mais diversas condições de saúde mental, além de inúmeros distúrbios psiquiátricos que, até um passado não muito distante, era tudo simplesmente chamado de "loucura". E, com certeza, no fim do século de 1700 não havia conhecimento sobre as condições das quais George sofreria.

De acordo com a Vogue, historiadores atuais acreditam que George provavelmente sofria com transtorno de bipolaridade e algum tipo de mania crônica, possivelmente agravada, ainda por cima, devido ao seu tratamento médico com arsênico. Além disso, o artigo “A loucura do Rei George III: uma reavaliação psiquiátrica”, publicado por Timothy J Peters publicado no National Library of Medicine, em 2010, pontua que, aos 27 anos, o rei já possuía indícios consistentes de depressão leve.

Foi uma época difícil para o rei, que admitiu não ter dormido mais do que duas horas por noite durante esse período e claramente estava tendo dificuldades em tomando decisões sobre as nomeações de seus primeiros-ministros e governos", escreve Timothy J. Peters, autor do estudo.

Então, em outubro de 1788, surgiu uma mania aguda no rei, esta desencadeada por um forte ataque de icterícia. Seu médico pessoal, na época, registrou que ele sofria de "agitação de espírito beirando o delírio... para outro".

Somente cerca de um mês depois também foi prescrito um estranho incidente em que George teria corrido completamente nu até o quarto da rainha. 

Outra compulsão que ele apresentava, era de brincar com lenços, ao ponto de que "seu estado de nervos parecia obrigá-lo a enrolar os lenços assim que lhe eram dados: dos quais, acredito que em alguns dias, ele tinha não menos de 40 ou 50".

E vivendo dentro do palácio o tempo todo, tratando de sua condição, logo começou a correr pelo reino o boato de que havia morrido. Durante esse tempo, conforme escreve Hadlow, Charlotte se encontrava extremamente assustada e ansiosa, sendo assim responsável por administrar o posto, mantendo, ainda assim, a compostura.

Depois de 1810, sua condição apresentou considerável piora e apresentou até mesmo indícios de demência, até que, em 1811, foi considerado permanentemente 'louco'. Robert Willis, um dos médicos do rei, inclusive escreveu em setembro daquele ano: "Vimos Sua Majestade às vezes em estado de delírio, às vezes fortemente impressionado por imagens falsas, nenhum dos quais caracterizou este dia tanto quanto um grau de irritabilidade, que só poderia ser enfrentado por coerção, e que era apenas variado por exclamações ocasionais e ruídos sem sentido."

Então, nesta condição, o monarca tornou-se oficialmente regente naquele reinado, posição essa que ocupou até sua morte, em 1820, aos 81 anos, sendo então substituído por seu filho, George IV. Charlotte, por sua vez, se tornou guardiã do marido até sua própria morte, em 1818, permanecendo leal até o fim.

George IV, filho de George III e Charlotte
George IV, filho de George III e Charlotte / Crédito: Domínio Público via Wikimedia Commons