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Matérias / RMS Titanic

"Querido papai": A comovente carta nunca entregue à vítima do Titanic

Filha de 10 anos escreveu uma comovente carta para um funcionário do RMS Titanic

Fabio Previdelli

por Fabio Previdelli

fprevidelli_colab@caras.com.br

Publicado em 07/03/2023, às 21h00 - Atualizado em 30/10/2023, às 16h59

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William McMurray morreu no naufrágio do Titanic sem receber carta da filha - Wikimedia Commons e Museu Nacional de Liverpool
William McMurray morreu no naufrágio do Titanic sem receber carta da filha - Wikimedia Commons e Museu Nacional de Liverpool

Filho de pai irlandês e mãe escocesa, William McMurray nasceu durante os meses de verão de 1868, na cidade inglesa de Birkenhead, em Cheshire — sendo o quarto entre sete irmãos do casal Henry McMurray e Isabella Oswald.

A experiência marítima começou logo aos 15 anos, em novembro de 1883, quando apareceu nos registros de tripulação do Britannia, quando ganhava 1 euro por mês para cuidar do convés, aponta o Encyclopedia Titanica. 

Em novembro do ano do ano 1890, William McMurray voltou a aparecer na lista do Britannia, porém, como comissário. Nos anos seguintes, passou a trabalhar em outras embarcações, até que foi contratado pela White Star em 1903. 

William McMurray/ Crédito: Museu Nacional de Liverpool

Um ano antes, ele se casou como Clara Jones em West Derby, bairro de Liverpool. O casal teve três filhos: Mary ‘May’ Louise McMurray, Ivy Isabella e William Ernest. Considerado um funcionário estimado, William McMurray estava entre a tripulação do último teste marítimo do RMS Titanic, que partiu de Belfast (Irlanda do Norte) até Southampton (Inglaterra). 

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No dia 4 de abril de 1912, William assinou o documento de tripulação — como camareiro de primeira classe — para a viagem inicial do transatlântico ‘inafundável’ que tinha como destino a cidade de Nova York. Ele não sobreviveu, mas sua história ficou marcada pelo amor de seus filhos. 

Pôster anunciando a viagem inaugural do Titanic/ Crédito: Domínio Público

“Querido pai”

Como a vida nos mares era sempre agitada, como perdão do trocadilho, William McMurray pouco parava em casa, sempre a bordo de um navio para trabalhar. Portanto, era normal que seus filhos sentissem falta da figura paterna no lar. 

Sendo assim, no dia 13 de abril de 1912, três dias após o Titanic deixar Southampton e poucas horas antes do trágico acidente, May Louise resolveu escrever uma carta para o pai. O tom da história ganha ares ainda mais dramático, visto que aquela seria a primeira mensagem escrita pela filha mais velha do casal — à época com cerca de 10 anos. 

Carta escrita por May Louise/ Crédito: Museu Nacional de Liverpool

May McMurray acomodou-se em sua elegante sala e se esforçou para fazer a melhor caligrafia possível (apesar de alguns erros ortografia). “Querido pai”, começou a jovem, segundo registrado pelo Museu Nacional de Liverpool. 

Parece que faz muito tempo desde a última vez que te vi. Eu gostaria que estivéssemos em Southampton com você, é muito solitário sem você aqui. Querido pai, não tenho estado muito bem, tenho tido um problema na garganta, espero melhorar em breve, pois Mana [erro ortográfico para ‘Mama’, ou mamãe em tradução livre] se preocupa tanto, o pequeno Ernie não tem passado muito bem, mas agora ele melhorou, espero que você esteja bem…Então, com muito amor, de Ivy e Ernie, obrigado papai pelos presentes. Com o carinho de todos, pai, espero vê-lo em breve com amor, Ivy e May e Ernie xxxxxxxxxx beijos para papai. Esta é minha primeira carta”, encerra o bilhete. 

Destino não encontrado

Quatro dias após o início da viagem, o Titanic colidiu contra um iceberg enquanto cruzava o Atlântico. Entre os dias 14 e 15 de abril de 1912, o navio naufragou. Das 2.223 pessoas a bordo, 1.517 delas morreram, entre passageiros e tripulantes. WilliamMcMurray era uma dessas vítimas. Seu corpo, se recuperado, jamais foi identificado. 

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Por razões óbvias, o camareiro jamais recebeu a primeira carta escrita por sua filha. Sua família ficou sabendo sobre a devastadora notícia de sua morte em 17 de abril, data de seu aniversário de casamento. Segundo o Museu Nacional de Liverpool, os vizinhos solidários dos McMurray tiveram que consolar a viúva Clara Jones

A família de William continuou vivendo em Liverpool. No segundo aniversário da tragédia, Clara lhe dedicou um memorial no Liverpool Echo de 15 de abril de 1914. “Em memória triste, mas amorosa, de meu querido marido, Will, que perdeu a vida no desastre do Titanic, em 15 de abril de 1912. Por mais que minha vida dure, por mais que eu veja as terras. Seja qual for a minha alegria ou tristeza, até a morte eu pensarei em você”. 

No ano seguinte, mais uma dedicatória, agora no Liverpool Daily Post. “Em memória de meu querido marido William McMurray, que perdeu a vida em 15 de abril de 1912 no desastre do Titanic.”

Clara jamais se casou novamente, morrendo de leucemia aos 37 anos, durante a primavera de 1915. As duas filhas do casal permaneceram em Liverpool: May morreu em 10 de agosto de 1985 (aos 83 anos) e Ivy em abril de 1987 (aos 82). 

Ernie seguiu a vida marítima do pai, estando a bordo do navio RMS Laconia, que foi bombardeado pelo submarino alemão U-156 em 12 de setembro de 1942, durante a Segunda Guerra Mundial. Sobrevivente da tragédia, faleceu perto de Liverpool em 1976, quando tinha 67 anos. 

Sobre a carta escrita por May, a mensagem acabou sendo devolvida à família dias depois do naufrágio. Os McMurray guardam a missiva por anos, até que ela foi doada ao Maritime Archives & Library, do Museu Nacional de Liverpool, em 1989, pela própria May Louise McMurray. O bilhete até hoje faz parte do acervo do local. 

Um fato curioso sobre William McMurray, aponta o Museu Nacional de Liverpool, é que apenas três anos antes do naufrágio do RMS Titanic, o camareiro havia recebido uma medalha de bravura por ajudar a resgatar 1.700 pessoas do navio a vapor Republic, em 24 de janeiro de 1909.