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Matérias / Enterros ‘camas’ medievais

‘Sono eterno’? O que está por trás dos enterros com ‘camas’ medievais

Na Inglaterra, curiosamente, apenas mulheres eram sepultadas em camas

Redação Publicado em 06/08/2022, às 08h00

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Um enterro de cama medieval - Divulgação/Historic England
Um enterro de cama medieval - Divulgação/Historic England

Uma forma peculiar de enterro na Europa continental medieval sempre chamou a atenção de pesquisadores. Apelidadas de “enterros de cama”, as sepulturas colocavam a nata dos mais ricos e nobres daquele período para dormir em seu “sono eterno”.

Essa prática não era tão comum naquele período, mas ainda era encontrada por arqueólogos do continente, e intrigou ainda mais quando passou a se espalhar pela Inglaterra, ganhando força no século 7 d.C.

Um novo estudo, publicado em 13 de junho na revista científica Medieval Archaeology lançou luz a essa questão, revelando que os ingleses passaram a usar mais os enterros cama ao mesmo tempo em que o cristianismo começou a se disseminar na região.

Além disso, depois de analisar 72 sepulturas em toda a Europa, indo da Eslováquia até a Inglaterra, o estudo concluiu que os ingleses enterravam apenas restos mortais de mulheres dessa forma — uma particularidade de extrema importância.

Mas por que?

Exemplos de enterros de cama analisados / Crédito: Divulgação/Historic England

Segundo a autora do artigo, Emma Brownlee, pesquisadora em arqueologia na Universidade de Cambridge, na Inglaterra, isso acontecia porque as mulheres estavam se deslocando mais naquela época como missionárias do cristianismo, casando-se com homens não cristãos para disseminar a fé.

"Os enterros na cama eram algo que foi especificamente importado por mulheres que estavam se deslocando naquele momento muito específico [pela Europa]", explicou Brownlee ao LiveScience.

"Como parte desse movimento de conversão, os homens estavam se deslocando, mas não na mesma medida que as mulheres, que traziam esses ritos funerários com eles enquanto migravam [como missionárias], fazendo com que assumissem essas associações de feminilidade e cristianismo na Inglaterra”.

Como destacou a especialista, o cristianismo havia “desaparecido como religião” após a queda do Império Romano do Ocidente em 476 d.C., diminuindo na Europa e depois prosperando novamente.

"Mas no século 7, há esse impulso da Igreja no continente para começar a alcançar e converter lugares que não são cristãos. O Papa Gregório I promove essa ideia de conversão e missionários, tentou converter as pessoas e foi encorajando casamentos entre mulheres cristãs e homens não-cristãos", ressaltou.

Ela completou: “Então, você tem essa política específica de famílias cristãs tentando casar suas filhas com a elite inglesa, que não era cristã na época. As mulheres tiveram esse papel realmente importante a desempenhar nesses casamentos".

Um enterro de cama

A pesquisadora relatou também como um túmulo específico foi usado como ponto de referência para a tese. Em 2011, arqueólogos escavaram o enterro de cama conhecido como “Trumpington Bed Burial”, que leva o nome da vila onde está situado, no leste inglês.

Datando do século 7 assim como as outras sepulturas analisadas, a descoberta representa os restos mortais de uma jovem enterrada em uma cama de madeira afixada com suportes e ferro, além de bens funerários como uma faca, contas de vidro e uma cruz de ouro ornamentada com granadas cravejadas, sugerindo que ela era cristã.

Cruz desenterrada no túmulo de cama ao leste da Inglaterra / Crédito: Divulgação/Ethan Doyle White

Após uma análise de isótopos revelar que as mulheres enterradas não haviam nascido na Grã-Bretanha, somada ao fato de que existiam apenas sepulturas femininas no tipo na região, Brownlee concluiu que o enterro cama pode ter sido “importado por um grupo específico de mulheres, provavelmente ligado aos esforços de conversão no século VII".

"O enterro na cama, portanto, adquiriu características femininas e cristãs na Inglaterra que não tinha em nenhum outro lugar”, acrescentou.

Sobre a característica única do enterro de ser nada mais nada menos que uma cama, a pesquisadora sugere que isso pode estar ligado ao status de uma pessoa, assim como a metáfora poética sobre a morte ao se falar sobre “um sono eterno”.

“Poucas pessoas teriam seus próprios estrados de cama naquela época. A capacidade de construir esta estrutura de cama de madeira exigiu muito trabalho, então não é algo que todos pudessem pagar”, explicou. “A maioria das pessoas teria dormido em colchões de palha, mas se você fosse importante o suficiente para ter sua própria estrutura de cama, isso foi uma coisa muito especial."

Ela completou: "Também pode haver conotações de sono junto com isso. Então está nos contando um pouco sobre como as pessoas estavam se relacionando com a morte, e eles viram isso como se fossem dormir, em vez de ser um fim ‘final’”.