'O Terminal' é um filme de Steven Spielberg inspirado na inusitada história do iraniano Mehran Karimi Nasseri, que viveu em um aeroporto por 18 anos
Éric Moreira Publicado em 09/03/2024, às 10h54 - Atualizado em 14/03/2024, às 18h25
Dirigido por Steven Spielberg e protagonizado por Tom Hanks — dupla que trabalhou em conjunto em, por exemplo, 'O Resgate do Soldado Ryan' —, "O Terminal" acompanha um homem que se vê envolvido em uma trama internacional e acaba, inusitadamente, vivendo em um aeroporto por meses.
"Viktor Navorski é um cidadão da Europa Oriental que viaja rumo a Nova York justamente quando seu país sofre um golpe de estado, o que faz com que seu passaporte seja invalidado. Ao chegar no aeroporto, Viktor não consegue entrar nos Estados Unidos. Sem poder retornar à sua terra natal, já que as fronteiras foram fechadas, ele passa dias no aeroporto. Com a situação se arrastando por meses, Viktor descobre o complexo mundo do terminal onde está preso e se apaixona por uma comissária de bordo", destaca a sinopse.
Na prática, 'O Terminal' é um filme bastante agradável e simpático de se assistir, sem algum conflito muito sério em sua trama, embora ambientado em um controverso contexto político. Isso porque Viktor Navorski, protagonista vivido por Tom Hanks, se mostra uma pessoa extremamente simpática e amigável, disposto a ajudar os funcionários do aeroporto John F. Kennedy, nos Estados Unidos.
E embora toda a situação vivida por Viktor Navorski seja uma série de coincidências desagradáveis, se torna ainda mais interessante saber que ela é inspirada em uma história real, embora existam algumas diferenças. Confira!
A inspiração para a história de 'O Terminal' foi o iraniano Mehran Karimi Nasseri, que viveu, em vez de nos Estados Unidos, por um longo tempo no Terminal 1 do Aeroporto Charles de Gaulle, em Paris. A primeira grande diferença entre ele e Viktor Navorski está no fato de ele ter permanecido por lá, em vez de apenas alguns meses, impressionantes 18 anos.
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Em 2004 — mesmo ano que 'O Terminal', de Spielberg, foi lançado —, já após 16 anos vivendo no local, Nasseri lançou sua autobiografia 'The Terminal Man' ('O Homem do Terminal', em tradução livre), co-escrita pelo britânico Andrew Donkin. Na obra, temos maiores contextos sobre sua própria história, além das razões para ele ter permanecido por tanto tempo no aeroporto parisiense.
No filme, Viktor Navorski é vindo de um país fictício chamado Krakozhia, sendo uma referência aos estados do Bloco Oriental da União Soviética, que vivia um golpe militar. Mehran Karimi Nasseri, no entanto, é de outra parte do mundo: ele nasceu no Irã, mas mudou-se para o Reino Unido em 1973, aos 28 anos, para estudar na Universidade de Bradford.
Porém, ao longo da década de 1970, ocorreu uma série de protestos contra o Xá — título de monarquia comum naquela região — do Irã e, em meio a esse cenário político conturbado, Nasseri foi expulso de seu país natal em 1977, acusado de se envolver em "atividades anti-estatais".
Segundo o Screen Rant, ele teria sido torturado pela agência de inteligência iraniana, a Savak, e eventualmente foi considerado refugiado pelo Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados na Bélgica. Com isso, ele foi capaz de obter refúgio não só na Bélgica, como também em outros países europeus.
Porém, ele conta que durante uma viagem entre a França e o Reino Unido, ocorrida em 1988, a pasta que continha seus documentos foi roubada. Assim, se viu incapaz de chegar a seu destino, e passou dias — que viraram semanas, meses e anos — vivendo no terminal. Ao contrário de Viktor Navorski no filme, que em vez de perder seus papéis, simplesmente teve seu passaporte considerado inválido.
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Em 'O Terminal', o personagem de Tom Hanksdeixa o aeroporto depois de nove meses, quando a guerra em Krazokhia chega ao fim. Enquanto vivia no aeroporto americano, explorava curiosamente cada canto do local, além de ter consumido bastante fast food no período — o que, por sua vez, é um detalhe que condiz com a realidade.
Nasseri residiu por 18 anos no Terminal 1 do Charles de Gaulle, entre 1988 e 2006. Diariamente ele costumava fumar em seu cachimbo, se alimentava no McDonald's (muitas vezes oferecido por estranhos), escrevia em seu diário e ouvia rádio. Ele tinha inclusive um lugar preferido onde ficava descansando, um banco vermelho no primeiro andar do terminal.
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Outro fator relevante na história de Mehran Karimi Nasseri é a do advogado francês de direitos humanos, Christian Bourget, com quem teve um relacionamento profissional no mínimo conturbado e instável. Por isso, inclusive, Nasseri nunca deixou o aeroporto, mesmo com a insistência do advogado para conseguir refúgio para ele.
Ao longo dos processos, Nasseri conseguiu com que a Bélgica concordasse em conceder-lhe refúgio sob supervisão de um assistente social em 1995. No entanto, Nasseri rejeitou a oferta, estando decidido de que queria retornar apenas para o Reino Unido — o que, conforme recorda a própria biografia do iraniano, frustrou bastante Christian Bourget.
Após 18 anos vivendo no Terminal 1 do aeroporto francês, Mehran Karimi Nasseri precisou ser transferido em julho de 2006 a um hospital, por razões que nunca foram especificadas. Após um ano depois, ele foi convidado a viver em um abrigo para moradores de rua, e foi se hospedando de abrigo em abrigo, até 2022, quando decidiu voltar ao Charles de Gaulle.
No entanto, somente algumas semanas após retornar ao aeroporto, Nasseri faleceu no local terminal 2F do local no dia 12 de novembro de 2022, com cerca de 76 ou 77 anos, vitimado por um ataque cardíaco.
