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Matérias / Futebol americano

Operação Flagship: Quando agentes deram ingressos de futebol americano para prender fugitivos

Mais de 100 pessoas foram presas pelos U.S Marshal após serem convidadas para assistirem partida histórica em 1985

Fabio Previdelli

por Fabio Previdelli

fprevidelli_colab@caras.com.br

Publicado em 04/06/2023, às 10h22 - Atualizado em 22/06/2023, às 14h47

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Agente Marshal fantasiado tirando foto com fugitivos - U.S. Marshal
Agente Marshal fantasiado tirando foto com fugitivos - U.S. Marshal

No ano de 1985, o Departamento de Polícia Metropolitana decidiu criar um plano para capturar criminosos foragidos que estavam sendo procurados há algum tempo. Para isso, enviaram cartas para os últimos endereços conhecidos de cada um deles.

Dentro dos envelopes, um convite surpresa: cada um havia ganho ingressos para assistir à partida de futebol americano entre Washington Redskins x Cincinnati Bengals. Cerca de 3.000 convites foram entregues aos criminosos. Somando todos os crimes, eles eram procurados por mais de 5.000 mandados pendentes.

Atletas do Washington Redskin em jogo da temporada 1984/ Crédito: Getty Images

A Operação Flagship prendeu mais de 100 pessoas — duas eram procuradas por homicídio, cinco por roubo, 15 por agressão, seis por invasão, uma por estupro e outras por diversos outros crimes. Estima-se que foi gasto cerca 22.100 dólares para a ação; ou seja, menos de 225 dólares por prisão.

O modus operandi

Entre 1981 e 1986, a U.S. Marshals Service — Serviço de Delegados dos Estados Unidos — conduziu uma série de nove operações, denominadas Fugitive Investigative Strike Team (FIST), em busca de capturar milhares de fugitivos procurados nos Estados Unidos.

Para atraí-los, eles usavam uma tática chamada 'obter-algo-por-nada'. Um exemplo disso ocorreu em 1984, quando o U.S. Marshal conduziu o FIST VII em uma operação que durou cerca de dois meses — atuando em oito estados e culminando na prisão de 3.309 fugitivos.

Logo do U.S. Marshal/ Crédito: Domínio Público

Na cidade de Nova York, cada fugitivo recebeu um aviso fictício do Brooklyn Bridge Delivery Service sobre a entrega de um pacote "valioso", informando que eles haviam ganho quantias entre 250 e 10 mil dólares na loteria. Já em Connecticut, os criminosos receberam 'ingressos' para um show de Boy George, incluindo jantar para duas pessoas e transporte de limousine.

Quando o procurado ia retirar o seu prêmio no local indicado, porém, os delegados os prendiam, recorda o The Washington Post. A prática era perfeita, pois os criminosos eram pegos geralmente desarmados ou desprevenidos.

O grande jogo

Em 15 de dezembro de 1985, Washington Redskins e Cincinnati Bengals fariam um dos jogos mais importantes da temporada. Afinal, quem vencesse disputaria os playoffs. Portanto, a procura pelos ingressos era insana e muitas pessoas fariam qualquer coisa para ver o jogo.

Semanas antes, o vice-chefe U.S. Marshal Tobias P. Roche (Distrito de Columbia) recebeu a aprovação do U.S. Marshal Herbert M. Rutherford III (Distrito de Columbia) para enviar convites para os últimos endereços de uma lista de criminosos procurados.

Os convites foram distribuídos pela empresa fictícia Flagship International Sports Television, que compartilha a mesma sigla com Fugitive Investigative Strike Team. Cada destinatário havia sido informado que como parte uma oferta promocional da empresa, receberiam dois ingressos para o jogo, além de convites para um brunch antes do pontapé inicial que aconteceria no Washington Convention Center.

Banner dando as boas-vindas aos fugitivos no centro de convenções/ Crédito: U.S. Marshal

Mas as vantagens não paravam por aí, eles ainda concorreriam a 10 ingressos para a próxima temporada e uma viagem com tudo pago para Nova Orleans onde assistiriam ao Super Bowl XX. Das 3.000 pessoas contatadas, 167 responderam positivamente ao convite.

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Mas a estratégia tinha algumas 'pistas' deixadas por Roche. O The Washington Post conta que as cartas eram assinadas por Michael DetnawDetnaw que ao contrário é Wanted (ou ‘procurado’ em tradução livre).

Além disso, quando ligavam para o número indicado para reivindicar o prêmio, eram transferidos para falar com o gerente de negócios Markus CranCran que é 'Narc', de narcóticos, ao contrário. Tudo isso enquanto a música I Fought the Law ('Lutei Contra a Lei') tocava ao fundo.

O plano deu tão certo que na manhã de 15 de dezembro, um advogado que representava a emissora local do jogo dos Redskins foi até o posto de comando da polícia para emitir uma reclamação contra a Flagship International, por eles não terem a licença apropriada para operar no distrito.

Os delegados e os oficiais passaram seis semanas treinando para a operação, o que incluiu três ensaios gerais. Agentes também foram trazidos de fora de Washington, pois temia-se que alguns dos fugitivos pudessem reconhecer os Marshal locais que os guardavam nos tribunais ou os levavam para a prisão.

Operação em prática

Para dar tudo certo no dia, os agentes chegaram no local por volta das 5h30 da manhã para montar a operação. Para minimizar os risco, duas áreas foram separadas dentro do centro de convenções do estádio.

Uma para os "convidados" e outra onde os fugitivos ficariam em menor número, o que facilitaria as prisões. Um artigo do Southwest Times Record relatou que os criminosos estavam tão ansiosos com o prêmio que muitos deles chegaram ao endereço às 8h, quando o convite claramente dizia às 9h.

Para deixar tudo mais realista possível, policiais se disfarçaram de vendedores de balões, atendentes do brunch e puxavam coro de Viva os Redskins. Até mesmo um agente estava fantasiado como o mascote San Diego Chicken. Mas todos estavam armados por baixo de seus disfarces.

Agentes Marshal disfarçados/ Crédito: U.S Marshal

Quando os fugitivos chegaram, delegados de polícia, se passando por funcionários da Flagship International, verificaram suas identidades e lhe deram crachás codificados por cores.

Segundo o The Washington Post, haviam palavras usadas como códigos também, como o termo "double winner" ('vencedor duplo'), usado quando um fugitivo específico era considerado perigoso.

Policiais disfarçadas se passando por líderes de torcida foram encarregadas de revistar discretamente os fugitivos em busca de armas escondidas. Assim, elas ofereciam abraços ou colocavam os braços em volta da cintura dos criminosos toda vez que iam os conduzir para outra área.

Chefe de operações de fiscalização do U.S. Marshals, Louie McKinney, serviu como mestre de cerimônias. Usando uma cartola, quando ele dissesse "para os vencedores" era a hora dos delegados entrarem em ação.

Cada grupo de fugitivos, aproximadamente entre 10 e 20 por espaço, foi instruído a se sentar em um auditório para ouvir algumas observações de McKinney, após as quais receberiam seus prêmios.

Quando o código foi dito, a cena que se seguiu parecia mais um elaborado filme policial: 25 membros do Grupo de Operações Especiais comandado pelo então vice-Marshal dos Estados Unidos, William F. Degan Jr., vestindo equipamentos táticos, invadiriam o auditório e cercaram rapidamente os fugitivos. Eles foram então algemados e escoltados do lado de fora para aguardar os ônibus. Ao final da operação, 101 criminosos foram presos.

Os Marshal rendendo os fugitivos/ Crédito: U.S Marshal

Repórteres da CBS e do Los Angeles Times foram especificamente convidados para documentar e divulgar toda a operação. Diretor do U.S. Marshals Service na época, Stanley Morris, disse que a cobertura midiática foi fundamental para aumentar o prestígio do grupo com a população.

Dois dias depois o ocorrido, o The Washington Post publicou um editorial enumerando os antecedentes criminais dos fugitivos presos: "15 mandados de prisão por agressão, cinco por roubo, seis por invasão, quatro por fuga, 19 por inadimplência ou violação de fiança, 18 por violações de narcóticos, 59 por liberdade condicional ou violação da liberdade condicional e 41 por uma variedade de acusações, que iam desde estupro até incêndio criminoso e falsificação".