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Matérias / Personagem

Expoente da fotografia francesa: A esplendida trajetória de Gilles Caron

Responsável por cobrir as manifestações de Maio de 1968, em Paris, Gilles tem trabalhos marcantes registrando os horrores de grandes guerras e conflitos

Fabio Previdelli Publicado em 28/04/2021, às 14h28

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Imagem meramente ilustrativa - Imagem de Free-Photos por Pixabay
Imagem meramente ilustrativa - Imagem de Free-Photos por Pixabay

Em maio de 1968, em Paris, mais do que em qualquer outro lugar do mundo, viveu um período marcado pela audácia, pelo desafio, pelo confronto e, principalmente, pela ruptura de um padrão social, dos pensamentos individuais e do censo de coletividade.  

Nas ruas, um espírito revolucionário tomava conta dos parisienses, que através de gritos e protestos mostravam toda sua indignação não só contra o sistema burocrático da França, mas também com todos os padrões normativos e comportamentais tradicionais do país. O que certamente serviu de inspiração para outros movimentos ao redor do mundo.  

Neste momento, o mundo se depara com uma peça fundamental para o registro deste período histórico: o fotógrafo Gilles Caron. Antes mesmo dos trinta anos de idade, o fotojornalista já tinha viajado o mundo retratando dos acontecimentos mais sombrios que a humanidade é capaz de causar, até o glamour do show business como enfoque principal de suas lentes.  

“Este jovem, que proclama perante o mundo a sua intenção de reinventar a vida, prende sua atenção quando ela se revolta em Paris. Decidindo abraçar o seu cotidiano, ele imortaliza seus atores, contribuindo assim para a produção de tais ícones: moradores de rua anônimos ou arengas de multidões, todos animados pela perspectiva de fazer História, e não mais apenas ser parte dela”, assim descreve o material de divulgação de uma exposição organizada pela ilustre Fundação Gilles Caron, que aconteceu em 2018, em Paris.  

Apesar de toda sua ilustre e brilhante trajetória, a genialidade de seus cliques teve um destino devastador em 1970, quando ele morreu repentinamente no Camboja, aos trinta anos.  

O resgate de um legado 

Com o intuito de conservar toda a herança de Caron, a cineasta Mariana Otero investigou todos os arquivos do fotógrafo francês — um disco rígido com 100 mil fotos, confiado a ela pela família de Gilles — para produzir o documentário “Histoire d'un Regard: À la recherche de Gilles Garon”, que foi lançado em 2020.  

Ao longo de seis meses, Otero mergulhou de cabeça em todo material deixado pelo fotógrafo, começando por um período que ela conhece muito bem, o de maio de 1968. Dentre todas as fotos, um registro lhe chama a atenção: o do jovem Daniel Cohn-Bendit sorrindo ironicamente para um policial.  

Estudante da Universidade de Paris, em Nanterre, Cohn foi um dos líderes da revolta. De cabelo ruivo, comportamento incendiário e com ideais simpatizantes a esquerda, ele ganhou a alcunha de Dany Le Rouge (ou “Daniel, o Vermelho”). 

Porém, a carreira de Caron começa um pouco antes do marcante episódio. Sua primeira grande história fotográfica foi feita em Jerusalém, durante a Guerra dos Seis Dias, em 1967. Em meio ao caos, o fotógrafo foi um dos poucos a capturar soldados israelenses beijando o Muro das Lamentações, explica matéria publicada pela Blind Magazine. Este seria seu primeiro furo, ou como ele mesmo descrevia: “Um golpe de sorte”. 

Além das Guerras, ela também se destacava por cobrir a linha de frente da vida política e cultural de Paris. "Não há muita diferença entre cobrir a guerra em Israel e uma estreia no Olympia. É tudo igual para mim", confessou, como relembra a reportagem.

Do Vietnã até a Irlanda e o fim no Camboja 

De volta ao campo de batalhas, Gilles registrou momentos da batalha de Dak To, uma das mais sangrentas de toda a Guerra do Vietnã. No meio das florestas incineradas por conta das bombas de napalm e da desolação e medo que viviam os vietnamitas, ele tirou cerca de 3 mil fotos de toda a carnificina.  

No centro do conflito, imortalizou os rostos assustados dos soldados feridos. Sua personalidade serena e tranquila pouco parecia combinar com os eventos que ele cobria. Embora, sempre tenha lutado para falar sobre os horrores que viu em Biafra, em 1968 falou sobre a fome que pairava as crianças ou os homens trajados e com fortes armamentos nas mãos. Ele queria ver tudo mostrar ao mundo tudo o que via.  

Ainda em 1969 cobriu outro momento turbulento, desta vez na Europa: os conflitos na Irlanda do Norte, onde registrou crianças empunhando coquetéis molotov e pedras de pavimentação, que eram atiradas contra veículos blindados da polícia. 

Depois de uma missão fracassada em Chade, no ano seguinte, redescobriu o quão prazeroso poderia ser seu trabalho registrando pequenos gestos do nosso cotidiano. Ao lado de seu pai, estendido no gramado, fotografava crianças brincando e outras cenas contrastantes com tudo o que havia apresentado em seus trabalhos.  

Quando foi chamado para ir até o Camboja, foi relutante, dizendo que estava focado em sua família e que talvez já fosse à hora da agência encontrar um novo substituto para seu lugar. Porém acabou aceitando. Mas de lá nunca mais foi visto com vida. Em 5 de Abril, Gilles Caron desapareceu na Rota 1, a estrada entre Camboja e Vietnã controlado por Pol Pot's Khmer Rouge.

Memória jamais esquecida 

Em 2018, data que os protestos de Paris completaram 50 anos, uma incrível parceria entre a Fundação Gilles Caron e a Cidade-Luz trouxe uma exposição gratuita sobre os registros do fotógrafo para o Hotel de Ville.  

Em 7 seções, o público pôde descobrir a Paris de 1968 através da apresentação de cerca de 300 fotografias, incluindo fotografias de época e impressões modernas dos negativos originais mantidos nos arquivos inéditos da Fundação Gilles Caron.