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Matérias / Cultura

O filme que chamou a atenção de feministas, cujo protesto despertou a ira de evangélicos

Documentário sobre aborto resultou até mesmo na agressão de mulheres em frente às clínicas

Thomas Pappon, da BBC Publicado em 11/12/2022, às 12h51

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Imagem ilustrativa de bandeira feminista - Foto de b0red no Pixabay
Imagem ilustrativa de bandeira feminista - Foto de b0red no Pixabay

O que muitos não sabem é que o aborto – hoje central na pauta das guerras culturais nos Estados Unidos e no Brasil –, por muitos anos, foi um assunto completamente ignorado por evangélicos. Isso só mudou nos anos 1970, graças a um documentário cristão, apresentado e escrito por um carismático teólogo americano chamado Francis Schaeffer.

A história começa quando um produtor de filmes evangélicos convence Francis a adaptar um de seus livros e este impõe a condição de que a direção ficasse a cargo de seu filho, Frank Schaeffer, que sonhava em ser cineasta.

Essa colaboração resultou na ambiciosa série de documentários, em dez episódios, How Should We Then Live (Como Devemos Viver Então), que tinha a mensagem de que, sem Deus, a humanidade estaria moralmente perdida.

A série foi um sucesso estrondoso nos EUA; na turnê de lançamento por 16 cidades americanas, era exibida em arenas lotadas com capacidade para 20 mil pessoas. Em seguida, Frank convenceu seu pai a fazer um novo filme, dessa vez, focado no aborto.

“Eu dizia:‘ Se você não fizer uma série sobre aborto, é como se você fosse pró-aborto’”, contou Frank ao podcast As Estranhas Origens das Guerras Culturais, da BBCNews Brasil.

E assim surgiu, em 1979, o documentário Whatever Happened to the Human Race?(O que aconteceu com a raça humana?), com imagens extravagantes e avant-garded e crianças fantasmagóricas vagando pelo mundo e centenas de bonecas espalhadas pelo Mar Morto.

Entretanto, o público não deu bola dessa vez. A turnê de lançamento foi um fracasso, e obrigou Franke Francis a buscarem apoio de instituições evangélicas – sem sucesso, pois ninguém estava interessado em pregar contra o aborto.

Tudo isso mudou depois que uma resenha sobre o filme no New York Post chamou a atenção das feministas, que ficaram revoltadas com a obra. Grupos feministas começaram a protestar em frente a cinemas que exibiam o filme, o que, por sua vez, atraiu a grande imprensa.

“Cada vez que isso aparecia na imprensa, multidões de evangélicos iam para as ruas nos apoiar contra as feministas raivosas, que eles viam como inimigas”, lembra Frank. “Eles não iam protestar por causa do aborto em si, mas por causa de todo o resto da agenda delas, de queimar sutiãs e defender que mulheres tenham carreiras profissionais.”

Porém, o que começou como manifestações pacíficas, aos poucos, foi ganhando contornos violentos– e a violência virou a tônica do embate sobre aborto nas décadas seguintes. Mulheres passaram a ser agredidas em entradas de clínicas de aborto.

Consequências

Em 1998, Barnett Slepian, um ginecologista que fazia abortos, foi morto a tiros por James Charles Kopp, que havia escrito uma carta aos Schaeffer elogiando os documentários. A essa altura, Frank, já estabelecido como diretor em Hollywood, sentia um remorso pelas consequências do filme.

“Não tenho palavras para expressar a profundidade do meu arrependi-mento por minha estupidez e insensível descaso pela decência e valor pela vida humana”, disse à BBC


THOMAS PAPPON É JORNALISTA DA BBC NEWS BRASIL. O TEXTO É ADAPTADO DO PODCAST AS ESTRANHAS ORIGENS DAS GUERRAS CULTURAIS.