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Matérias / Curiosidades

Ötzi e Exército de Terracota: Os sapatos milenares recriados por um especialista

Desvendando composição de sapatos desde Ötzi até do Exército de Terracota, especialista criou réplicas e testou esses diferentes calçados

Éric Moreira, sob supervisão de Thiago Lincolins Publicado em 29/03/2023, às 16h53 - Atualizado em 06/04/2023, às 10h21

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Réplica do calçado utilizado por Ötzi, o Homem de Gelo, considerada a múmia mais famosa da história da Europa - Foto por Josef Chlachula pelo Wikimedia Commons
Réplica do calçado utilizado por Ötzi, o Homem de Gelo, considerada a múmia mais famosa da história da Europa - Foto por Josef Chlachula pelo Wikimedia Commons

Ao longo da História, em diversos lugares do mundo, já foram noticiados os mais variados achados arqueológicos, referentes às incontáveis nações e sociedades que já viveram em nosso planeta.

Entre os achados recorrentes, por exemplo, pode-se apontar as múmias que, embora mais frequentemente relacionadas ao Egito Antigo, também já foram encontradas em muitos outros continentes, por vezes até mesmo sendo mumificadas naturalmente — devido a condições climáticas como o frio.

Um ótimo exemplo a se apontar desse caso é de Ötzi, o Homem de Gelo. Considerado a múmia mais famosa de toda a Europa, ele foi descoberto congelado na fronteira entre a Áustria e a Itália em 1991 por um casal de montanhistas alemães, tendo ele vivido em por volta de 3.200 a.C.

Ou então, outro achado que intrigou muito o mundo quando foi feito é o do impressionante Exército de Terracota, um numeroso conjunto de mais de 8 mil estátuas de guerreiros chineses, que representariam o exército que o então imperador, Qin Shihuangdi — primeiro da Dinastia Qin —, levaria consigo para a vida pós-morte, enterrando-os consigo.

E o que essas descobertas têm em comum entre si? Não foram feitas no mesmo país, sequer no mesmo continente; não datam de uma mesma época (a Dinastia Qin durou de 1644 a 1912), e nem mesmo são parecidas: uma é um grande exército de guerreiros de terracota, outra mostra uma múmia congelada. Mas o astuto tcheco Petr Hlaváček notou uma semelhança entre eles: ambos os achados mostram calçados.

E o homem, não à toa um dos maiores especialistas em calçados do mundo, logo que fez essa constatação começou a desenvolver projetos de réplicas de sapatos usados ao longo da história, desde os homens pré-históricos.

O especialista Petr Hlaváček
O especialista Petr Hlaváček / Crédito: Foto por Josef Chlachula pelo Wikimedia Commons

Petr Hlaváček

Nascido na comuna de Boršice, na República Tcheca, Petr Hlaváček se formou na Escola Técnica Secundária para Indústrias de Processamento de Couro em Zlin e, então, começou a trabalhar como capataz de produção em uma fábrica de calçados. Foi só a partir de 1979 que ele trabalhou na Faculdade de Tecnologia como professor e, de 2007 a 2011, foi o reitor.

Durante o tempo em que trabalhou na instituição de ensino, Petr teve contato com muitos alunos, dando-lhes incontáveis palestras sobre a ciência da fabricação de sapatos e sua história, de acordo com o site The Vintage News. Ele foi inclusive vice-presidente da Associação Tcheca de Calçados e Couro e representou seu país em muitas organizações internacionais, como a Organização das Nações Unidas para o Desenvolvimento Industrial (UNIDO), onde foi membro ativo na indústria do couro.

Sapatos de gelo

Enquanto cientista, foi em 2003 que o nome de Petr Hlaváček foi incluído na lista das cem descobertas mais importantes da história, depois de seu projeto envolvendo os sapatos de Ötzi, o Homem de Gelo. A partir de uma análise da composição daqueles calçados, os materiais utilizados e compreensão das técnicas que os homens daquele período dominavam, ele reconstruiu uma réplica de uma peça semelhante à de Ötzi.

Réplica do calçado de Ötzi, o Homem de Gelo
Réplica do calçado de Ötzi, o Homem de Gelo / Crédito: Foto por Josef Chlachula pelo Wikimedia Commons

No entanto, quando foi colocar à prova os calçados utilizados pelo Homem de Gelo, Petr descreveu-os, a princípio, como "desconfortáveis". Porém, conforme as próprias palavras do pesquisador, se eles eram bons o suficiente para este homem pré-histórico usar, também seriam para o pé atual.

Ele descreve que os sapatos de Ötzi tinham boa aderência e não resultavam em bolhas, o que era um bom indicativo inicial. Em entrevista ao The Seattle Times, caracterizou como um misto entre liberdade e flexibilidade. E, claro, ele não faria modelos só para si: junto de sua equipe, fez três réplicas desse sapato, além de outros cinco pares que se ajustasse a uma pessoa em especial, o alpinista tcheco Vaclav Patek, para testá-los.

Juntos, escalaram nos Alpes locais, sendo surpreendidos, mais uma vez, positivamente: quando entraram na água gelada com os sapatos de Ötzi, sentiram apenas um calafrio momentâneo. Após a experiência, Patek afirmou que esses sapatos eram mais confortáveis ​​do que qualquer outro que ele tivesse usado.

Isso porque dentro dos sapatos havia uma camada de feno que proporcionava conforto e calor aos pés de quem o utilizava. Além disso, a equipe obteve meticulosamente o couro de veado, urso e bezerro que foram usados ​​para as solas dos sapatos e conseguiu rastrear um pedaço de pele que pertenceu a um urso. Por fim, curtiram o couro com fígado de porco cozido e cérebro de porco, método também muito utilizado no passado. 

Outras pesquisas

Embora as pesquisas com os calçados de Ötzi sejam as mais significativas no portfólio de Petr Hlaváček, ele também estudou outros tipos de sapatos muito relevantes e diferentes. Entre eles, há as sandálias da Caverna Fort Rock em Oregon, o calçado do Exército de Terracota, as botas de Albrecht von Wallenstein e até sandálias bizantinas da Turquia.

Réplicas dos calçados utilizados pelo Exército de Terracota
Réplicas dos calçados utilizados pelo Exército de Terracota / Crédito: Crédito: Foto por Josef Chlachula pelo Wikimedia Commons

Com suas pesquisas, Petr tentava completar o capítulo que faltava sobre o simbolismo das sandálias que podem ser vistas nos ícones bizantinos no Manual de Forro de Dionysus, documentando os inúmeros tipos de sapatos vistos nas muitas estátuas existentes na Grécia. 

Ainda, outros projetos de pesquisa notáveis ​​que ele realizou envolviam fragmentos de sapatos das cavernas de Qumran e a sandália de Masada em Israel. Graças a todos esses trabalhos, em 2005 Petr Hlaváček foi premiado por sua contribuição para o desenvolvimento da indústria de calçados pela International Union of Shoe Industry (União Internacional da Indústria de Calçados), além de que suas pesquisas possibilitaram, também, uma nova compreensão sobre os calçados ao longo da história.