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Desventuras / Revolta da Chibata

A falta de reconhecimento para João Cândido, herói da Revolta da Chibata

Ocorrida em 1910 e liderada por João Cândido Felisberto — também chamado de "Almirante Negro" —, a Revolta da Chibata foi uma importante rebelião no Brasil pós-escravidão

Éric Moreira Publicado em 04/02/2024, às 12h00 - Atualizado em 07/02/2024, às 18h07

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João Cândido, líder da Revolta da Chibata - Domínio Público via Wikimedia Commons
João Cândido, líder da Revolta da Chibata - Domínio Público via Wikimedia Commons

A história do Brasil foi marcada por uma série de rebeliões e revoltas que, ao longo dos anos, construíram nossa sociedade como conhecemos. E, entre esses episódios históricos, um que não pode ser ignorado é a Revolta da Chibata.

Ocorrida entre os dias 22 e 27 de novembro de 1910, foi uma rebelião militar no Rio de Janeiro, na época capital do Brasil, pedindo o fim de castigos corporais com o uso de chibatadas por oficiais navais, em sua maioria brancos, ao punir marinheiros afro-brasileiros e mulatos.

Uma figura em especial, que se destacou nesse momento, liderando a revolta, foi o marinheiro João Cândido Felisberto, ou apenas João Cândido, que também ficaria conhecido como o "Almirante Negro".

Antiga fotografia de João Cândido / Crédito: Domínio Público

Conforme relembrado pela Agência Brasil, durante a Revolta da Chibata, os canhões dos navios da marinha foram apontados para a cidade do Rio de Janeiro, mas sem a intenção de bombardeá-la. Em vez disso, os marinheiros pretendiam chamar a atenção para as práticas cruéis de punição que sofriam, que ainda remetiam à recém-extinta escravidão.

Vale mencionar que o que impulsionou definitivamente a eclosão dessa rebelião foi uma punição atribuída ao marinheiro Marcelino Rodrigues Menezes, que sofreria 250 chibatadas (cem a mais que o comum). Foi então que um corpo de mais de 2 mil marinheiros, liderados por João Cândido, tomaram o controle das embarcações na Baía de Guanabara.

A confusão, por sua vez, tomou proporções tão grandes, que João Cândido foi alçado até mesmo a herói e celebridade. Porém, com o passar dos anos, acabou quase que esquecido pelas novas gerações

Vale mencionar que, no fim, mais de duzentos marinheiros envolvidos na Revolta da Chibata ficaram mortos ou feridos, e praticamente todos foram expulsos após isso. Já do lado dos oficiais, cerca de 12 pessoas morreram.

Apesar disso, para não prender repentinamente todas aquelas pessoas, os marinheiros receberam anistia — perdão concedido aos culpados por delitos coletivos, especialmente de caráter político —, mas isso não bastava.

Isso porque o próprio João Cândido, por exemplo, foi perseguido até sua expulsão da Marinha, em 1912, e então permaneceu na pobreza, sem direitos do serviço militar, até sua morte, em 1969, aos 89 anos.

É uma história muito bonita, é uma história de um herói popular. Um país que não tem história não é um país, e meu pai deixou uma parte da história do Brasil", conta o único filho vivo de João Cândido, Adalberto Cândido, o seu Candinho, à Agência Brasil.
João Cândido lendo o manifesto da Revolta da Chibata / Crédito: Domínio Público via Wikimedia Commons

Herói justo

João Cândido nasceu no dia 24 de junho de 1880, no município de Encruzilhada do Sul, no Rio Grande do Sul. Filho de escravizados — lembrando que a escravidão foi abolida em 1888 —, ele entrou para a Marinha em uma época em que a corporação recrutava principalmente jovens excluídos, muitos deles de origem negra.

Apesar dos desafios, João Cândido — também conhecido como "Almirante Negro" — sempre demonstrou grande talento enquanto marinheiro. Candinho conta que ele chegou a dar aulas para oficiais e até mesmo operava navios considerados de alta tecnologia na época, como o próprio Minas Geraes, que foi utilizado na Revolta da Chibata. Além do mais, o filho destaca o grande senso de coletividade e de justiça do pai:

Ele nunca levou um castigo, mas não aceitava que os companheiros dele [passassem por isso], entende? Ele tinha convivência com oficiais e tudo, mas tinha aquele ideal, não era porque tinha convivência com oficial da Marinha que aceitava aquilo."

+ João Cândido, um almirante contra a chibata

Reconhecimento

Apesar de a história protagonizada por João Cândido já ter ocorrido há mais de 100 anos, e sua inegável importância durante a transição para um melhor Brasil pós-escravidão, sua família ainda luta para que ele seja reconhecido. Além de uma reparação financeira do Estado, também querem a inclusão do nome de João Cândido no livro de aço, o livro dos Heróis e Heroínas da Pátria.

Livro de aço, o livro dos Heróis e Heroínas da Pátria / Crédito: Foto por Agência Senado pelo Wikimedia Commons

Vale mencionar que a obra, abrigada no Panteão da Pátria e da Liberdade Tancredo Neves, na Praça dos Três Poderes, em Brasília, registra nomes de pessoas que tiveram uma trajetória importante na formação da história do Brasil. Entre as figuras, estão: Chico Mendes, Tiradentes e o escritor Machado de Assis.

Já sobre a reparação financeira, isso se deve pelo fato de que, após sua anistia e eventual expulsão da Marinha, João Cândido nunca chegou a receber nenhuma compensação. Oficialmente, na carreira como marinheiro, a qual foi privado, ele teria direito a vários benefícios para si e para a família.

Os marinheiros foram anistiados, uns chegaram a capitão de corveta, capitão de fragata, meu pai, não. Ele foi absorvido, mas não teve mais espaço na Marinha, nem indenização, nem nada", conta Candinho. "Minha família vive toda com dificuldade. São trabalhadores. Então, se houver essa reparação para eles... Porque para mim, eu já estou mais para lá, com 85 anos, mas eles não."

Agora, a inclusão do nome de João Cândido no livro dos Heróis e Heroínas da Pátria continua em tramitação no Congresso Nacional, e ainda deve ser aprovada pela Câmara dos Deputados antes de ir, finalmente, para a sanção presidencial.

Panteão da Pátria e da Liberdade Tancredo Neves / Crédito: Foto por Robotmensch pelo Wikimedia Commons

Vale mencionar também que, apesar do reconhecimento do "Almirante Negro" vir tardiamente, uma homenagem importante ocorrerá no Carnaval de 2024 no Rio de Janeiro: a escola de samba Paraíso do Tuiuti fará uma homenagem para o líder da Revolta da Chibata com o samba-enredo 'Glória ao Almirante Negro.'