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Matérias / Nazismo

A jovem que arriscou tudo ao salvar crianças dos nazistas e inspirou livro

Aventuras na História entrevistou Elle van Rijn, autora de 'Órfãos de Amsterdã', romance inspirado em história real

Eduardo Lima, sob supervisão de Thiago Lincolins // Tradução: Isabelly Lima Publicado em 15/03/2023, às 18h00 - Atualizado em 04/04/2023, às 18h03

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Capa do livro "Órfãos de Amsterdã", de Elle van Rijn - Divulgação/Editora Melhoramentos
Capa do livro "Órfãos de Amsterdã", de Elle van Rijn - Divulgação/Editora Melhoramentos

O site Aventuras na História entrevistou com exclusividade a escritora holandesa Elle van Rijn, que veio a São Paulo divulgar o lançamento de"Órfãos de Amsterdã", pela Editora Melhoramentos no evento 'Palavras: Lentes da Cidade', realizado pela produtora cultural Asterismo.

O livro compreende uma história de ficção inspirada na história de Betty Goudsmit-Oudkerk, uma jovem que arriscou sua vida para salvar crianças judias dos nazistas durante a Segunda Guerra Mundial.

Quase nove décadas depois da Segunda Guerra, o contexto em que o livro de van Rijn está sendo lançado é um de aumento de casos de antissemitismo no mundo todo, acompanhado da presença de negacionistas do Holocausto, que foi a perseguição e o assassinato sistemáticos de 6 milhões de judeus europeus em territórios ocupados pela Alemanha.

O Relatório Mundial sobre Antissemitismo de 2022, da Universidade de Tel Aviv, mostrou um aumento drástico no número de casos contra judeus entre 2020 e 2021 em praticamente todos os países com grandes populações judaicas. No Reino Unido, por exemplo, houve um aumento de 78% no número de ataques físicos antissemitas durante o tempo analisado.

Capa do livro 'Órfãos de Amsterdã' /Divulgação/Editora Melhoramentos

Quando perguntada sobre a importância de continuar falando de antissemitismo, van Rijn disse que "nós falamos disso porque não queremos que isso aconteça novamente". 

[Os] traumas [do Holocausto]  — que nós não vemos diretamente — da segunda e da terceira geração, eles ainda estão aqui", explicou a autora, justificando a literatura sobre o tema como forma de lidar com traumas pessoais.

O livro escrito por van Rijn, movida pela vontade de "aprendermos melhor as nossas lições do passado" pode ser uma ficção, mas ele se baseia na história muito real de Betty Goudsmit-Oudkerk.

A jovem Betty

No dia 2 de abril de 1924, nascia em Amsterdã Betty Goudsmit-Oudkerk. Quando a Segunda Guerra Mundial começou, Betty era uma adolescente judia de 15 anos. A pouca idade não a impediu de, dois anos depois, se tornar parte da resistência holandesa contra os nazistas.

Em 1941, Betty recebeu uma oferta de emprego da Crèche, instituição onde se cuidava de crianças e que, naquele mesmo ano, foi segregada para entender só a judeus, com cuidadoras judias. Oudkerk cantava e brincava com as crianças até que, em outubro de 1942, o local se afiliou ao Teatro Holandês, passando a fazer parte do aparato de deportação do governo ocupado dos Países Baixos.

Segundo o Jewish Cultural Quarter, as crianças viviam ansiosas e assustadas, separadas de seus pais. Em uma ocasião, — citada no livro de van RijnBetty prometeu às crianças que, se ficassem quietas por dez minutos, ela desceria do topo do edifício com uma corda, e ela realmente cumpriu sua promessa depois que as crianças se tranquilizaram.

"Ao escrever uma obra de ficção, você escreve baseado na vida de alguém ou em eventos reais. Colocando-as no presente, como fiz nesse livro, você pode aproximar os enredos. Dessa forma, não podemos dizer que é absolutamente não-ficcional. Às vezes, é necessário preencher alguns buracos e na minha pesquisa histórica eu acabei encontrando outras histórias", explicou a escritora ao site Aventuras na História.

Betty com uma foto sua da época em que trabalhava na Crèche - Reprodução/Vídeo/Libelle TV

Salvando crianças

Colocando sua própria vida em risco, Betty ajudou a tirar inúmeras crianças clandestinamente da Crèche, salvando-as da deportação, que possivelmente levaria a um campo de concentração. Apesar de todos os esforços da equipe da resistência na Crèche, a maioria das crianças levadas para a instituição foi assassinada pelos nazistas.

"Eu só não entendo, como as pessoas conseguem fazer algo com uma criança? No livro, na minha história, tem essa criança, bom, na verdade, tem várias delas, mas essa em específico, foi encontrada na porta de uma casa. As pessoas estavam desesperadas para colocarem seus filhos recém-nascidos nas portas das pessoas, porque essas crianças, no começo, eram registradas como não-judias. Essas crianças roubaram o coração de, literalmente, todo mundo, todas as enfermeiras", destacou a escritora.

Após setembro de 1943, quando a Crèche foi evacuada, Betty precisou se esconder. Seu irmão, sua mãe, sua avó: todos foram capturados e assassinados pelos nazistas. Ela conseguiu se isolar até o fim do conflito, e depois casou, teve cinco filhos e viveu uma longa vida, morrendo aos 94 anos, em 2020.

Betty Goudsmit-Oudkerk em entrevista à Libelle TV, publicada em 9 de abril de 2020, dois meses antes de sua morte - Reprodução/Vídeo/Libelle TV

Antissemitismo hoje

Explicando porque escolheu transformar a história de Betty Goudsmit-Oudkerk em um livro de ficção, Elle van Rijn explicou que, em um contexto onde ideias violentas como o antissemitismo insistem em aparecer, ela entende seu dever como "pregar a humanidade [e o] amor".

A autora de "Órfãos de Amsterdã" ainda diz que a mídia "dá muita atenção" às pessoas que tem levantado bandeiras de ódio e preconceito nos últimos anos. 

Isso também é um dos motivos para o jornalismo em si estar enfrentando problemas com isso, porque esse dilema social é amplificado por estes algoritmos que empurram a gente para as opiniões mais extremas, que chamam mais atenção. Devemos ser cuidadosos", diz van Rijn sobre os perigos de dar publicidade para extremistas.

A autora holandesa contou a Aventuras na História que já está trabalhando em seu novo romance, mas ainda não pode revelar muitos detalhes sobre a trama. Ela diz que o livro também trata de um tema importante como o antissemitismo.

Elle van Rijn divulga 'Órfãos de Amsterdã' no Brasil /Crédito: Paulo César Lima

Ao lidar com assuntos complexos, o conselho da escritora é buscar um indivíduo com quem as pessoas se identifiquem, uma pessoa fascinante e interessante como Betty Goudsmit-Oudkerk.