Representante da Espanha na categoria de Melhor Filme Internacional no Oscar 2024, 'A Sociedade da Neve' retrata um dos acidentes aéreos mais chocantes da América do Sul: a Tragédia dos Andes
Éric Moreira Publicado em 10/01/2024, às 16h31 - Atualizado em 19/01/2024, às 17h55
Em 13 de outubro de 1972, a América do Sul voltou sua atenção para um evento que ficaria marcado como um dos mais brutais acidentes aéreos da história do continente: a Tragédia dos Andes. Na ocasião, o Voo Força Aérea Uruguaia 571 caiu na região conhecida como Vale das Lágrimas, nos Andes.
No interior da aeronave, 45 pessoas — grande parte se conhecia há bastante tempo; eram a equipe de rugby uruguaia Old Christians Club e mais alguns amigos e familiares dos jogadores — viajavam do Uruguai ao Chile para uma partida de rugby.
O pesadelo não acabaria aí: inicialmente, 33 pessoas sobreviveram à queda, mas permaneceram isoladas em um dos ambientes mais inóspitos do mundo. Feridos, enfrentando intempéries da natureza — incluindo uma avalanche — e com cada vez menos alimentos, precisaram recorrer ao extremo para que sobrevivessem, incluindo alimentarem-se da carne dos amigos e familiares que faleciam ao longo do tempo. Tudo isso, durante mais de 70 dias.
Uma história tão dramática e tensa como essa — vale mencionar que, dos 45, apenas 16 pessoas sobreviveram no final — inevitavelmente renderia filmes com o tempo. E isso já aconteceu em 1993, com o filme 'Alive', dirigido por Frank Marshall e estrelado por Ethan Hawke. Porém, em outubro de 2023 um novo longa-metragem espanhol foi lançado, prometendo ser ainda mais fiel: 'A Sociedade da Neve', de Juan Antonio Bayona.
+ A Sociedade da Neve: Veja o que aconteceu com sobreviventes da tragédia
Dessa vez, além de prometer ser mais fiel aos fatos, praticamente todo o elenco do filme é argentino ou uruguaio. E tal reconhecimento realmente veio, sendo esse um dos candidatos ao Oscar de Melhor Filme Internacional em 2024, sendo seu diretor, Bayona, espanhol.
Embora 'A Sociedade da Neve' prometa ser um retrato bastante fiel e brutal dos eventos ocorridos naquele outubro de 1972, alguns detalhes no longa diferem do que realmente aconteceu. Confira a seguir 5 coisas que o novo filme de Bayona difere dos verdadeiros eventos da Tragédia dos Andes:
'A Sociedade da Neve' tem a pretensão de ser mais um filme do subgênero de tragédias, mas inspirado em um acontecimento real. Por isso, a pretensão de Juan Antonio Bayona sempre foi contar a história com enfoque nos aspectos de sobrevivência e dramáticos dos personagens. O que explica o fato de não mostrar nenhum aspecto da verdadeira trajetória do voo, antes de o avião cair nos Andes.
No voo para Santiago, Chile, eles pararam em Mendoza devido às condições climáticas e passaram uma noite na cidade", conta Bayona ao USA Today.
Provavelmente, esse detalhe por trás da tragédia foi removido do filme, pois, além de não ser tão relevante para os eventos que se seguiriam, também seria um considerável aumento do tempo de duração da produção (que já é consideravelmente extensa, diga-se de passagem, com 2 horas e 24 minutos).
Da mesma forma como Bayona poupou tempo antes do acidente aéreo, dando maior enfoque da obra justamente na sobrevivência, o diretor também fez uma mudança com relação aos fatos no final do filme, quando os sobreviventes foram resgatados de helicóptero.
Houve duas operações de resgate para retirar os sobreviventes de helicóptero", disse ao USA Today. "A primeira viagem levou apenas metade deles, e um grupo de resgate ficou com os sobreviventes e passou uma noite com eles. Depois, outro helicóptero os retirou no dia seguinte".
Logo, enquanto no filme vemos todos os sobreviventes resgatados juntos, de uma só vez, por um único helicóptero, na verdade, toda a operação de resgate foi mais longa. Provavelmente, a alteração ocorreu para aumentar o efeito dramático e comemorativo do resgate no cinema, de acordo com o Screen Rant.
Pouco após a queda do avião, os sobreviventes da queda do Força Aérea Uruguaia 571 já começaram a enfrentar seus primeiros desafios de sobrevivência. Soterrados na neve e presos em destroços de um avião, eles sofreriam eventualmente sem ar. Até que, furioso, um dos homens ali presentes, Numa (interpretado por Enzo Vogrincic Roldán), chuta uma janela da fuselagem — o que lhe causa um corte na perna — e, mais tarde, utilizaria um pedaço de metal para achar a superfície, para que todos pudessem sair.
Na vida real, porém, quem realmente utilizou um objeto para escavar até a superfície e salvar o grupo foi Nando Parrado — um dos grandes heróis do acidente —, em vez de Numa.
Quando dito que Nando Parrado foi um dos grandes heróis por trás do que também seria conhecido como Milagre dos Andes, não é à toa. Isso porque foi ele e Roberto Canessa, estudante de medicina na época com 19 anos, que encontram agricultores chilenos que finalmente os ajudam a resgatar todo o grupo.
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A princípio, quem partiu para a viagem foram os dois e outro companheiro, Antonio "Tintin" Vizintín. Porém, quando percebem que vão mudar a trajetória do percurso, mandam Tintin de volta para o grupo, assim poderiam alertá-los sobre o que fariam, e também pensando em preservar a comida — o que eles realmente precisariam: a dupla passou 10 dias vagando na neve antes de encontrar ajuda.
No filme, quando Tintin retorna ao acampamento, ele avisa o grupo que Parrado e Canessa tinham comida suficiente para seguirem a caminhada por mais dez dias. Porém, na vida real, eles não puderam se dar tanto luxo: só tinham alimento para supri-los por três dias de caminhada.
Hoje, um dos detalhes mais lembrados sobre a Tragédia dos Andes, e que mais deixa as pessoas chocadas e até enojadas, é pensar que os sobreviventes, sem exceção, precisaram se alimentar de carne humana para suportar.
O filme não se prolonga muito sobre a repercussão da mídia após o resgate, focando mais no período de sobrevivência, no entanto, um detalhe relevante omitido no longa é a hesitação dos personagens em revelar o que precisaram fazer para sobreviver por tanto tempo — mais de 70 dias — nos Andes.
Na vida real, foi somente depois de alguns dias hostilizados que os sobreviventes realizaram uma conferência de imprensa, na qual explicaram o canibalismo que precisaram cometer. Inicialmente, eles diziam apenas que sobreviveram com alimentos embalados e queijo.
